segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

A Boneca de Hans Bellmer



Ela é uma estranha íntima.
Me causa admiração e repulsa.
Mas não consigo tirar os meus olhos dela,
pois tento desvendar todos os contornos do seu corpo e as nuances da sua face.
Ela me parece ser de algum lugar, ao mesmo tempo, de lugar nenhum.
Canevacci denominou um ser límitrofe em estado orgânico e inorgânico.
Uma bio-coisa. Que tem vida, que pulsa.
No entanto, é oca de capilares sanguíneos.
Mas, ela consegue aprisionar os meus olhos, puxar os meus sentidos,
numa sensação de estupor capaz de canalizar todos os estímulos ao meu redor.

A minha retina impõe um único olhar.
Ver apenas o que ela tem para me mostrar: a sua exposição é tão absurda,
fere tanto a pulsão dos meus olhos, que o meu desejo

apenas deseja vê-la
e nada mais.





* Hans Bellmer (13 de março de 1902 - 23 de fevereiro de 1975) foi um artista alemão, mais conhecido por a vida nas bonecas femininas em meados de 1930. Os historiadores da arte e da fotografia também considera- o um fotógrafo surrealista. Site: http://en.wikipedia.org/wiki/Hans_Bellmer
* Massimo Canevacci é antropólogo italiano, autor de: "Fetichismos Visuais. Corpos Erópticos e Metrópole Comunicacional" , São Paulo, ateliê ditatorial, 2008.



* Fonte: ml.virose.pt
* Tamanho:390 × 623; Tipo:31KB JPG

15 comentários:

  1. A sua analise sobre a obra de Bellmer é muito instigante. É a essência do torto extraída da obra. Essa idéia do oco e das sensações como condutores de uma admiração que se preenche é a metáfora para as nossas ações impulsivas e pouco explicativas.

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  2. Olá Alysson,

    é isso mesmo. Boa pontuação meu caro!
    Vejo nesta Boneca o símbolo de nós e, de um modo geral, do nosso comportamento na contemporaneidade. Tentei aliar dois tipos de linguagem: a simbólica, a linguistíca. Não q o meu texto faça algum tipo de explicação à imagem, até pq é impossível, mas uma breve interpretação a uma mensagem tão aberta qnto ao que Hans Bellmer expressou nas suas bonecas.
    O seu dadaísmo está longe, como a intenção dessa corrente nas artes, de ser uma expressão artística banal. Ele revela impressionantemente o indivíduo imerso nas redes hiper-modernas metropolitanas onde ele mesmo não sabe o seu limite. O seu corpo penetra na porosidade das grandes cidades e vice- versa através de marcas, expressões o que o torna um cartaz publicitário ambulante. Quem bem potencializou esse artista foi o italiano Canevacci. Ele enreda várias de nossas manifestações que denunciam o fetichismo tão presente nas metrópoles. Associando a boneca, nós seríamos um pouco dela. Se olharmos bem, o seu olhar é vivo, intimidador e humano. O seu corpo apresenta ruínas, rachaduras muito espaçadas contratando com as lindas modelos dentro dos mais belos vestidos acetinados. Daí não se sabe de fato o q ela é, o que ela representa. Talvez um alguém, um modelo ou outra coisa qualquer. Se tentarmos definir, não conseguimos, pois ela é escorregadia, não cabe é definição nenhuma. Uma das poucas certezas que ela nos dá é o estranhamento, o desconforto. Creio que é a partir daí que Bellmer denuncia um pouco o q ela tem de humano, o seu erotismo indefinido, descontínuo e violento. Muito distante das nossas concepções pré- fabricadas sobre o que seja esse tal erotismo.

    Um beijo!

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  3. Mai
    O desconfronto e o estranhamento que as bonecas provocam, conseguinte ao "erotismo indefinido, descontinuo e violento." Oposto as concepções pré- fabricadas das normas comerciais, instiga uma reflexão a cerca dos ritos de passagem de comunidades tribais. É possível e existe um sentido em fazer uma analogia da obra de arte contemporânea, no caso, as bonecas de Hans bellmer, uma arte criada em detrimento do seu conceito desdobrado em sua consequências percepcitivas e sensorial, jah explicitado acima pela Maira. Entretando, minha observaçao se remete a passagens tribais e carentes de conceito e desdobramentos, porém constituido de um carater mitico, lúdico que causavam e ainda causam em seu povo o mesmo estranhamento ocasionado pela arte contemporânea. Pode-se argumentar que a finalidade é outra, contudo a especificaçao de em ambos, a interação do povo com a arte é exigida. Tal interação, é elemento engendrador de elementos enriquecedores ao caminho de um esclarecimento tanto imagético nas sociedades tribais, quanto as racionalizações conceituais da arte contemporânea, e a interaçao por sua vez movimenta-se pelo estranhamento, pelo desconforto, pelo desconhecido, pelo não óbvio.
    Beijo Mai
    rafael

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  4. Mai,

    O que eu acho é que a boneca reflete um dos maiores mistérios que nós humanos insistimos em guardar para nós próprios que é o nosso lado não-humano.

    Vivemos corriqueiramente sempre "a favor" dos padrões de coerências ocidentais que nos instigam a caminhar sempre de forma infalível, ou seja, com nossas caras de patéticos iluministas iluminados pela escuridão ignorante do excesso de razão.

    A boneca revela o nosso lado escondido, o nosso lado esquisito, o lado que provoca desconforto para nós mesmos e que a sociedade com a sua natureza insistentemente careta, coesa, dotada de inumeros instrumentos de controles sociais e de padrões, obriga-nos a negá-los. É o lado instigante e por isso mesmo repudiado de nós mesmos, é aquele lado que temos, sabemos que podemos nos adentrar mas muitas vezes insistimos em deixá-lo mofando no depósito de nossa alma. É o esconderijo secreto no qual sabemos parte do seu caminho, é a nossa proibição desejada, é a nosso amor calejado de sofrimentos, é o nosso grito contido, o nosso silêncio manifestado. É um dos pedações que compõe uma das tantas partes que nos cabem e que não cabem a nenhum de´vários de nós mesmos.

    bjs

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  5. muito interesante este texto e os topicos .
    apesar de temos este lado obscuro e estranho.
    temos que na maioria do nosso dia a dia conviver , com padroes .e respitar .
    mas e claro eu dou muito valor ao lado obscuro do serhumano ,msm que de uma forma escondida geralmente da sociedade . pq estamos no cotidiano e quem vive no padrao do cotidiano .
    bom enfim censura da sociedade .

    Alan

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  6. nesse mundo em que vivemos nao se pode dar muita importancia para o que os outros pensam
    Alan

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  7. "...O seu corpo penetra na porosidade das grandes cidades e vice- versa através de marcas, expressões o que o torna um cartaz publicitário ambulante..."

    Essa metáfora é bem interessante para elucidar a característica fetichista que a sociedade ocidental carrega. A publicidade potencializa esse aspecto e contribui para aumentar o consumo de produtos e comportamentos. Será que a boneca em pedaços não fala desse ser fetichizado. Um ser social repartido, que não consegue a ser uno?

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  8. Maira,
    Acho que daria para vc comentar o Oscar com certeza. Sua pena desliza muito bem no papel e vc coloca suas idéias com muita clareza. A mistura das artes faz uma arte bem melhor. Gostei muito. Escolhi seu texto para dizer que devido a saída de reuel eu fiquei um tanto tonto com relação ao meu ficar no torto. Sou paisão, minha torcida são meus filhos, e eu num sei se eu continuo por aqui, veremos. Beijos. Sim, meus contos serão publicados em livro de antologia com outra autora no Rio de Janeiro e na Argentina. Beijos.

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  9. olá rafael

    seu comentário caiu muito bem. Vc viu a obra, a intenção do Hans Bellmer sob outra ótica: qnto o nosso estranhamento, o nosso olhar etnocêntrico referente a cultura alheia, destoante da tradição ocidental. Vemos no outro pertencente a uma tribo, ou algo parecido, como um estranho, uma minoria exclusa a nossa cultura imperialista.
    achei muito interessante vc colocar esse tipo de estranhamento que destoa com a proposta q eu intencionei. A boneca nos causa um horror, pois vemos nela o q não estamos acostumados, pq a indústria fantástica do espetáculo nos propõem o belo acima de todas as medidas. No entanto, o autor vê o belo a partir disso, do descontínuo, do violento, do fragmentado do nosso ego inserido nessa dita pós- modernidade. Como Vina coloca "O que eu acho é que a boneca reflete um dos maiores mistérios que nós humanos insistimos em guardar para nós próprios que é o nosso lado não-humano."

    o mais interessante é estranharmos a diferença e não percebemos q somos cada vez mais estranho a nós mesmo. O q nos resta é o desconforto cotidiano de q algo q está presente em nós nos alegra, porém nos incomoda. Enfim, um incômodo que não sabemos o nome, ou talvez, ele nem tenha nome.

    um beijão!

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  10. Vina!

    é isso aí. é uma estranha tão próxima a nós... o seu olhar revela a nudez dos nossos instintos q são envernizados pela civilização.

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  11. Olá alan!

    Não podemos dá importância ao que nos confronta diariamente? a nossa ordem social mexe com o nosso ego constantemente. perturba a nossa incontrolável vontade de realizar os nossos mais absurdos prazeres.

    um beijo

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  12. Olá alysson,

    creio q sim. E acredito q o autor tb explora isso. Mas que deixa claro e Cavenacci qnto a leitura q ele faz ao Bellmer. Temos feitichizações por todo o corpo- fragmentado e desconhecido por nós mesmos- que a cultura visual reitera a todo instante. Carregamos um pouco da petropóle em nós e a metrópole conduz aos nossos olhos parte dos nossos corpos que estão nela.

    Beijo!

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  13. Oi roosevelt,
    que frase bacana:
    "A mistura das artes faz uma arte bem melhor." Fico muito contente em saber q vc gosta dos meus textos e da minha proposta em juntar duas linguagens: a textual e a icônica. Fico mais feliz ainda em saber q vc vai continuar no torto!

    bjao meu querido

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  14. Vejo um pouco de fetiche por parte do artista, a admiração da mulher com aspecto de "boneca", inerte, porém sensual, mesmo com seu corpo desfigurado, bem como de material inorgânico. Há uma expressividade melancólica sobre o uso do corpo.
    E parabéns pelo texto, tua análise foi precisa, porém, acredito que, cada pessoa verá um pouco de si nessa obra.
    Abraços.

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