sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

PROCURANDO UM ETHOS I

Vibrações positivas, já dizia um apresentador/empresário do Pré-Caju. Pois é, com essa história de turismo em Sergipe a população está em alerta, afinal de contas isso pode ser o sinal para um caminho futuro de Aracaju para cidade grande. Tudo bem posso estar exagerando na minha afirmação, pois a relação turismo e desenvolvimento nem sempre fazem os locais crescerem todos os meses do ano. É só por um tempo, durante o verão e nas festividades juninas. É preciso compreender que isso é bom para o Estado, mais geração de renda, empregos diretos e indiretos, gente “bonita” na cidade, enfim falou na melhoria de renda e as pessoas ficam tocadas.

Nesse discurso todo, esqueci de mencionar que existe a premissa da valorização da cultura local, daí na programação não pode faltar visitas a cidade histórica de São Cristóvão e ao fragmentado encontro cultural de Laranjeiras, além da guerra de cabacinhas de Japaratuba. Mas nosso foco é o Pré-caju e como a cidade fica movimentada, os ares provincianos de Aracaju ficam aflorados e ao mesmo tempo se sentem ameaçados. Aflorados, pois a mais de vinte anos sempre sugamos estilos e modos de vida provenientes de outros lugares. Como a bola da vez é o formato de carnaval baiano realizado em diversas cidades, municípios e “buracos” do Brasil, com bandas baianas ou que reproduzem esse modelo, trios elétricos, abadas, cordinhas e “pipocas” assistidas por camarotes luxuosos e pessoas nas arquibancadas.

Durante esses dias estive lendo sobre civilização e cultura, em que o autor, Norbert Elias, relata a empreitada expansionista de ingleses e franceses desde o século XVII, em contraposição, a postura alemã de afirmação de uma identidade localizada. As duas concepções são vistas como comportamentos de sociedades com perspectivas diferenciadas quanto a sua visão de mundo. De certo modo, esse comportamento pode ser visto nessa fase de intensa interação das nações motivada pela tecnologia da informação, informática e redes de comunicação também denominadas de Globalização ou mundialização. Quero dizer que todo esse processo macro se reproduz de forma localizada nos países e em suas regiões. Mesmo acreditando na intersecção entre culturas não se pode desconsiderar que nesses contatos as trocas podem vir a ter um peso maior de uma sociedade em relação à outra, principalmente, por que nesses contatos a relação de poder se estabelece por meio de trocas econômicas, políticas e culturais. No nosso caso o expansionismo do carnaval baiano para terras sergipanas foi denominado por mim de exercitando a baianidade. Não se trata de opressão de outras culturas, critica a perda de características da cultura sergipana, mas da característica provinciana do sergipano e a busca de uma identidade legitimamente sergipana. A sergipanidade passou a ser promovida pelos meios de comunicação, intelectuais, folcloristas, poder público e artistas como pratica genuína do povo sergipano, no entanto, fica a minha pergunta, até onde o sergipano médio se identifica com esse discurso da preservação da tradição, do patrimônio material e imaterial, enfim de uma cultura sergipana que seja uma em sua diversidade?

13 comentários:

  1. Aly Soul,

    Sou bastante direto quando o assunto se trata dessa coisa chamada sergipanidade. O Sergipano não se identifica com as suas coisas, e por não se identificar, obviamente que ele não conhece a sua história. Ai é onde entra o grande problema: uma cidade só se torna turistica e geradora de rendas não apenas em eventos festivos isolados como um pré-caju, quando seus habitantes conhecerem o seu lugar.

    Também não podemos nos esquecer da midia "local" submissa as informações "nacionais". Uma midia na qual se prepondera o cotidiano do Rio de Janeiro e de São Paulo e que não abre espaços para os seus pensadores e artistas exporem seus trabalhos! Claro que existem emissoras que tentam abrir esse tipo de programação, no entanto, sabemos que a nivel de consumo e de sinal, as midias privadas plim plim dominam os lares. Além disso tudo, devemos lembrar que em qualquer buraco encontramos casebres caindo aos pedaços mas expondo ao alto uma parabolica que por sinal, só expoe o cotidiano de lugares territorialmente não tão próximos ao cotidiano de todos os brasileiros.
    Resultado: conhecemos o de fora só superficialmente por não vivermos cotidianamente o de fora, e desconhecemos o de dentro por vivermos aqui cotidianamente assistindo e obtendo informações sobre os contextos de fora. Existe algo mais desorbitante?

    Portanto, o sergipano não está disponivel em conhecer sua história, seja pela sua própria formação histórica, seja pelos meios midiaticos que terminam possibilitando essa clivagem entre os anseios locais com a recepção apenas de informações externas. Enquanto isso nossos escritores veem seus livros mofarem nas bibliotecas publicas ineficazes mantidas ainda a base de fichas digitadas por máquinas de datilografias enquanto nas curvas das ruas onde se sente o vento do rio assanhando nossos cabelos, ouvimos em meio aos pontos de onibus e das praças, os velhos e impraticáveis discursos acerca da sergipanidade.

    Um ótimo texto

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  2. Creio que a intelectualidade sergipana é escalada para dar depoimentos na TV e no rádio a partir do discurso nacional que visa legitimar e valorizar a cultura popular local. Essa busca por elementos que "identifiquem" cada local passa pela necessidade de inserir-se no mercado turístico. E, por outro lado, existe uma necessidade dessa referência local, ou seja, o orgulho de ser pernambucano, baiano, entre outros, e Sergipe entra nessa.

    O não reconhecimento por parte da população de símbolos proferidos por meios de comunicação e intelectuais, faz com que essa sergipanidade seja uma entidade ainda abstrata para o sergipano.

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  3. Caro Alysson, creio que seu ótimo texto tenha ficado um pouco resumido pra o que se pretendeu abordar.

    Mas esta grande indagação me deixou bem inculcado:

    "enfim de uma cultura sergipana que seja uma em sua diversidade?"

    Aqui eu deixaria uma outra pergunta: será que já não seria tarde se buscar uma essência nesta dimensão? Creio que a Bahia tenha conseguido consolidar seus esteriótipos (positivos e negativos) no compasso da grande mídia. Posso estar errado, mas isto já seria um bom ponto de partida para outras observações.

    Parabéns pelo texto!

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  4. Fato é que as empresas desse ramo da construção estão se importando pouquíssimo com a cultura local. Tampouco os turistas.

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  5. Concordo com você Josua, o texto precisa de mais discussão e já estou preparando a continuidade para essa semana. Me serviu como inspiração o Pré-caju.

    Quanto a sua pergunta não trataria como uma condição imutável essa perspectiva, tendo em vista que a cultura é dinâmica. Não podemos prever as modificações que podem vir a ocorrer em anos vindouros, mas o cenário atual, sim. E o que se apresenta é o reconhecimento daquilo que "vem de fora". Talvez seja pela nossa forte característica provinciana.

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  6. Meu caro mestre alyssonr,
    Havíamos a tempo discutido esse tema com o nosso colega brucutu. Seu texto tráz o estranhamento necessário para dizermos que é isso mesmo. O sergipano é o que afinal? Quanto ao carnaval, não vejo problemas, pois os baianos já levaram 70% do espaço territorial de Sergipe, o carnaval é uma fichinha, só discordo num ponto: Geração de renda. Essa renda é concentrada nas mãos dos empresários que fazem a política do circo e pão com o governo, o povão fica com a venda da latinha de cerveja. Bom texto.

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  7. Sim! E boa parte acaba voltando pro lugar de origem: SSA/BA

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  8. Roosevelt,

    Tudo bem, há certos traços que de certa forma demarcam caracteristicas regulares a ponto de visualizarmos mesmo que de forma não tão perfeita, uma identidade de sergipe. Por exemplo: costuma-se dizer que as pessoas aqui são mais reservadas, mais fechadas em seus grupos. Isso de certa forma é uma identidade sergipana. No entanto, eu acho que essa pergunta em tentar compreender o que é o sergipano é algo impraticável em um mundo global marcado pela natureza hibrida de suas culturas.

    Eu acho que antes de ficarmos levantando bandeiras como se isso fosse a saida para encontrarmos uma relação de pertencimento acerca de determinada realidade cultural, nós deveriamos era simplesmente reconhecer que o acesso às nossas produções são importantes para nós não por que temos que ser sergipanos, mas sim por que o conhecimento de nossas produções nos faz ter um conhecimento mais claro sobre os problemas mais próximos a nós, afinal, estaremos ouvindo os anseios daqueles que vivem situações mais aproximadas da nossa.

    Para mim isso é a construção de uma identidade: algo que se reconhece por que se enxerga, e não por que simplesmente demarca fronteiras forçosamente esteriotipadas para construir uma relação identitária do indivíduo em relação ao seu meio.

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  9. "Algo que se reconhece por que se enxerga, e não por que simplesmente demarca fronteiras forçosamente estereotipadas para construir uma relação identitária do indivíduo em relação ao seu meio."

    Subscrevo.

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  10. Caro Vina,

    Aproveitando seu interessante comentário, será que de fato achamos situações mais aproximadas à nossa nas músicas em Sergipe?

    Porque, dando um exemplo muito por alto, eu já estive em crise por não conseguir encontrar uma das maiores marcas do nosso sotaque nas músicas; os fonemas /t/ e /d/ pronunciados de forma dura e não como os cariocas "txitxio e dxinheiro". OS artistas sergipanos naquela época ou forçavam, criando um esteriótipo ridículo (no caso de uma banda popular daqui de Sergipe, que todos sabem qual é) ou, como na maioria esmagadora das vezes pronunciavam como os cariocas.

    Resultado: onde fui achar estes fonemas pronunciados como pronuncio de forma natural?

    - Em artistas de Pernambuco, como no caso da banda Mombojó.

    Enfim, é um mero exemplo, apenas para instigar a discussão neste sentido.

    Abraço!

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  11. Josua,

    Sim, sim, muito bem colocada a sua observação. Acredito que o que acontece aqui é a natureza ainda muito provinciana. Em nosso caso ainda há uma insegurança muito grande em nos admitirmos sergipanos. Somos educados a entender o nosso sotaque como feio.

    E quando eu falei de aproximação, eu quis dizer da seguinte forma: é interessante se conhecer um trabalho de um Paulo Lobo por exemplo, pelo fato de Paulo Lobo viver em uma mesma realidade que a gente, e a opinião dele será uma opinião que estará mais próxima da gente.

    Veja: só o fato de você mostrar de forma muito bem colocada os sotaques de alguns artistas, ja possibilita com que você comece a entender uma caracteristica identitária do sergipano que pode ser a não identidade sergipana. É isso que eu digo: pensar em uma identidade não é pôr um chapéu de couro, adornos esteriotipados. Pensar uma identidade já é pensar a condição de uma dada identidade, e para conhecermos essas condições, temos que curiosar e garimpar nossas produções ao invés de apenas sairmos andando com trapos coloridos dizendo representar a nossa mais verdadeira identidade.

    Como eu disse: identidade é algo que se reconhece por que se enxerga, e não por que simplesmente demarca fronteiras forçosamente estereotipadas. Só enxergaremos essa identidade se termos curiosidade como a sua de conhecer nossa coisa, vale lembrar que sem a intolerância de barrismos.

    abração

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  12. Em relação ao comentário de Roosevelt o de Lou.

    "O sergipano é o que afinal?" O Sergipano possui a sua identidade, sim. Lembro que a construção desse fenômeno social é abstrata e mutável. É preciso ter o cuidado com as interpretações deterministas, afinal, a cultura é bem mais complexa e essa é apenas a leitura do provincianismo que nos constitui devido a outras influências culturais provenientes das migrações de dentro e de fora do estado. A influência baiana faz parte desse aspecto e talvez seja a mais evidente devido a nossa conturbada e diria amistosa relação histórica com a Bahia.

    "Essa renda é concentrada nas mãos dos empresários que fazem a política do circo e pão com o governo, o povão fica com a venda da latinha de cerveja." Quanto ao aspecto econômico. Procurei analisar elementos da configuração da estrutura econômica atual galgada no turismo e no entretenimento. Claro que esse não foi o meu principal foco, como disse me preocupei com a nossa característica provinciana e como conduzimos isso com a nossa prática cultural. Insisto em dizer que a interpretação acerca do contraste entre os que são beneficiados e os que são menos beneficiados nesse tipo de evento, principalmente, em se tratando da sua condição social e econômica é legitimo, porém não é meu foco nesse texto.

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  13. complemento o comentário de Vina, ressaltando que esse discursos de identidade nacional e local são construções abstratas, são inventadas e podem servir para fins políticos, econômicos e para a relação de pertencimento a um grupo.

    Somos seres simbólicos e essa condição nos faz buscar referências para explicar e conduzir a nossa condição de seres finitos. Portanto, a identidade, seja ela nacional, universal ou local, é (re)construída.

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