segunda-feira, 2 de fevereiro de 2015

Ondinas

"Solidão, solidão, tudo é solidão". Disse o homem do quarto escuro.
O moço abriu a janela de seu aposento para ver o mundo.
E este estava vazio.
Tão solitário quanto seu leito; um leito sem mácula de um pecador arrependido.
Há solidão nessa esfera que gira; em cada giro seu se esvai meu sonho e o teu.
Eles são nuvens, são fumaças; vapores que sobem da terra e não voltam mais.
O moço franzino, de lençol na mão, suplicou ao mundo um amigo.
- Quem tem amigo, tem inimigo; o homem é como o camaleão.
- Sim, mas o nada de nada é igual a nada!
- Quem tem o nada tem alguma coisa!
"Solidão, solidão, tudo é solidão. Disse o mago do quarto escuro.
O homem foi ao centro, fez um seguro; garantiu sua vida.
A morte não tem garantia; se paga à vista e não há devolução.
Viver é da escada apenas uma subida; uma alma sempre sofrida, contudo, sem medo de ser.
O rapaz, de vela na mão ascendeu sua luz mais uma vez e fez um pedido: "Companhia".
- Amiga caridade, faça-me uma bondade! Será que tem alguém no mundo?
- Não se pode confiar na sombra dos outros!
- Mas, essa sorte? Que desgraça ser um ser!
- Precisas ser forte!
- Sou um fraco, que mora no quarto, tão escuro como o mundo.
"Solidão, solidão, tudo é solidão. Diz o poeta.
Amei cedo uma moça garrida.
Sua pele era seda pura.
Seus seios duas peras maduras.
Suas coxas eram como o mármore polido.
Fui flechado pelo cupido. "Má sorte minha".
A moça virou retrato, de um quarto escuro, de um morador da rua sinistra onde ninguém passa.
- Desgraça!
- Não diga isso.
- Quem?
Uma ondina me disse um dia: "No mundo tem companhia; inclina o peito, abre os olhos para ver direito..."