sexta-feira, 30 de novembro de 2012

A relação entre o grêmio estudantil e os alunos do IFAL

Recentemente eu tive a experiência de trabalhar com as turmas do primeiro ano dos cursos técnicos do IFAL Campus Piranhas, o conteúdo referente às instituições educacionais. Aproveitando o assunto, abordamos muitas questões referentes ao IFAL, discutimos as regras, a importância delas e a necessidade de os alunos questionarem-nas. Além disso, abordamos temas referentes ao funcionamento da instituição, questionando os papéis dos alunos, grêmio estudantil e servidores em geral.

O que pude constatar nos debates é que os alunos exigiam direitos e participação do grêmio estudantil para atender aos seus interesses, mas que deixavam clara a falta de informação acerca do papel do grêmio, assim como eram incapazes de se mobilizarem para exigirem seus interesses. Essa falta de mobilização trazia como conseqüência uma relação hierárquica nem um pouco dialógica. Ou seja, as regras eram impostas de cima para baixo sem o consentimento da classe estudantil.

Para que não ficássemos apenas limitados às teorizações e conceitos, fiz questão de trazer para as minhas aulas o grêmio estudantil “Velho Chico” e posteriormente Valdomiro, o diretor de ensino. A necessidade de levá-los para as minhas aulas também se deveu ao fato de eu ter ouvido muitas críticas do alunado acerca da representatividade do grêmio e das imposições das regras da atual gestão, além de conhecer as razões e as dificuldades dessas outras esferas que compõem o instituto.

Com o grêmio estudantil nas salas de aula, o que pude constatar foi que os alunos reclamaram em geral acerca dos problemas referentes à comunicação. Disseram que as informações quando eram publicadas já haviam muitas vezes passado do tempo e eles só ficavam sabendo depois das questões que haviam sido decididas pelo grêmio. O grêmio mostrou que utilizava os murais para divulgar seus projetos, mas que os alunos ou não liam ou até mesmo tiravam os informes do mural.

Quando Valdomiro, o diretor de ensino entrou nas salas de aula, ouviu muitas dúvidas dos alunos sobre algumas questões que andavam sendo tramitadas pela gestão. Perguntaram acerca de muitos pontos de interesses para eles como a questão do uso da quadra, a ideia insensível de se utilizar a biblioteca como um espaço punitivo para os alunos que não poderiam frequentar certas aulas por questões de atraso, por circunstâncias particulares, dentre outras.

Com relação ao grêmio estudantil, foi exposto um slider mostrando a história do grêmio, quais os papéis e limitações do grêmio, as funções de cada integrante da chapa, etc. Na hora do debate o que foi detectado é que a maioria dos alunos sequer sabia dos integrantes do grêmio, além de muitos confessarem não saber da existência do grêmio no IFAL. O que percebi é que os alunos esperavam ações do grêmio, mas se mostravam pouco dispostos a dialogarem acerca de seus interesses com o grêmio.

Apesar do pouco tempo na aula de sociologia, eu achei que a relação dos alunos com Valdomiro deixou a desejar. Ao invés de travarem questionamentos sobre o porquê da não participação deles na elaboração das regras; perguntas sobre as possíveis dificuldades da gestão estabelecer diálogo com os alunos e os alunos com a gestão, os discentes simplesmente se contentaram em buscar informações e curiosidades acerca das decisões que estavam sendo tomadas pela gestão.

Com isso, passei a formular algumas questões. Quais causas faziam com que os alunos não soubessem da existência, nem da função do grêmio? Por que os alunos exigiam tantas ações do grêmio, mas não participavam dele? O que levou os alunos no debate com Valdomiro se preocuparem muito mais com as informações acerca do que andava sendo decidido entre a gestão do que em questionar a não participação dos alunos na formulação das regras que são impostas para eles?

A falta de conhecimento se deve à falta de comunicação entre o grêmio e o alunado e vice e versa. No entanto, essa falta de diálogo decorre do fato do IFAL organizar seus horários de aula que dificultam a relação de diálogo entre essas duas esferas. Pela manhã os alunos têm aula das 07:00 às 12:20, tendo apenas um intervalo de 20 minutos entre 09:30 até 09:50. No turno vespertino os alunos têm aula de 13:00 às 18:20, tendo um intervalo de apenas 20 minutos entre 15:30 até 15:50.

Outro ponto diz respeito à falta de consciência política dos professores. Muitos chegam a “bater a porta na cara” dos integrantes do grêmio quando eles vão passar algum informe acerca do grêmio nas salas. Sem contar uma falta de hábito com a leitura que faz com que os informes nos murais passem despercebidos pelos alunos, além da própria falta de formação política que não os faz enxergar a importância do que se anda sendo exposto inclusive no grupo do grêmio no facebook.

Por que os alunos cobram do grêmio e não participam? A nossa cultura política é caracterizada pelo paternalismo. Os alunos ficam à espera que o grêmio faça tudo ao invés de construírem uma participação conjunta que atendam aos seus interesses. Por não terem exercício político de participação, os alunos, muitas vezes como forma de eximirem da culpa por não buscarem se manter informados, jogam todos os problemas para o grêmio, buscando com isso, livrarem-se das suas responsabilidades.

Por que os alunos se preocupam muito mais com as informações acerca do que anda sendo decidido entre a gestão do que em questionar a não participação deles na formulação das regras que são impostas para eles? Um ponto se refere à escassez de espaço que eles têm em dialogar com a gestão. No pouco momento que lhe resta, eles buscam se atualizar acerca das questões que andam sendo decididas. Outro ponto diz novamente a falta de formação política. Muitas vezes eles na sabem questionar o poder.

Outra coisa: o aluno por viver em meio a uma organização política autoritária, muitas vezes tem medo de questionar. Esse temor em produzir indagações acerca das imposições das regras termina trazendo um resultado muito nefasto que é a naturalização da hierarquia. Ao invés de questionarem o porquê deles não terem o direito a participar das decisões que implicam o lugar deles no instituto, eles optam em aceitar o papel das decisões com a gestão naturalizando a relação opressor x oprimido.

Cabe a nós tentarmos produzir algumas indagações para que possamos encontrar caminhos que façam com que essas hipóteses sejam alteradas. Como o grêmio pode encontrar algum caminho para se comunicar com os alunos que possa conciliar o excesso de aulas, a não-aceitação de alguns professores com a sua entrada em sala de aula? Quais outros caminhos são possíveis para motivar o diálogo dos alunos com o grêmio que não apenas os murais e redes sociais?

Quais estratégias são possíveis para que os alunos deixem de enxergar a política de forma paternalista e infantilizada e passem a perceber a sua importância na participação política conjuntamente com o grêmio estudantil? Quais são os caminhos capazes de fazer com que os alunos deixem de temer sua participação e seu exercício reivindicativo? Como se quebrar essa relação hierárquica caracterizada por fortes doses de autoritarismo que pelo temor, os alunos terminam por naturalizar?

Devemos também construir indagações que, apesar de nefastas, podem não fugir de um plano real. Será que os alunos ficam apenas a cobrar por questões de comodismo? Será que os alunos cobram, mas eles não possuem interesse em mudar? O aluno se encontra interessado em resolver questões coletivas ou questões individuais que atendam aos seus interesses egoístas? Será que não é devido a isso que encontramos uma dificuldade de mobilização por parte da classe estudantil?

Apesar de essas questões soarem pessimistas, por via da reflexão e de estratégias, podemos alterar essa realidade. Cabe a nós tecermos outras perguntas. Como fazer o aluno sair do seu lugar de acomodação para se tornar um sujeito atuante? Como mostrar aos alunos à importância de se mudar a realidade das coisas? Como fazer com que eles busquem seus interesses particulares sem perder o senso de coletividade? Quais caminhos seriam possíveis para se motivar a mobilização entre eles?

Eu gostaria apenas de complementar com algumas observações. O grêmio como um espaço de representatividade dos alunos é de grande importância. Não podemos pensar em uma educação que tem como interesse promover a formação do aluno enquanto um sujeito crítico e ético, sem pensarmos no papel do grêmio para essa formação. De uma vez por todas nossos discentes precisam exercitar seu papel político para com isso saber reivindicar e exigir o seu lugar no mundo.

quinta-feira, 29 de novembro de 2012

REFLEXÕES SOBRE PEDAGOGIA DA AUTONOMIA

O significado comum de autonomia, o que é usado pelos falantes atuais da língua portuguesa é: “Faculdade de se governar por suas próprias leis, dirigir-se por sua própria vontade”. Pelo menos, esse é o significado que, no momento, é necessário a compreensão para nós. Urge a pergunta ontológica sobre o termo autonomia: “Pode o homo sapiens ser um ser auto – nomos?” Essa espécie conseguiu uma façanha que nenhuma outra se quer pensou nela. O homo sapiens desenvolveu além de instintos, desejos e sobretudo, a vontade. O desejo e a vontade se completam, pois, não existe o segundo sem o primeiro. Não posso querer o que não desejo, e não desejo o que não quero. Isso é muito diferente do comportamento instintual. O instinto tem base visceral; a vontade e o desejo, além das vísceras, precisam do componente simbólico para existir. Assim, o desejo e a vontade não são expressões mecânicas de um animal que se arrasta sobre a terra. O homem conseguiu se ver no mundo, e dizer que o mundo é palco de sua existência. O homem, portanto, psiquificou a realidade, tornando-a uma terceira pessoa – ela, a realidade. Alguém um dia disse que a vontade era a maior potência da terra. E que a vontade e seu império construíam a história dos homens. Não há dúvida de que a vontade é uma força que faz o homem se mover sobre esse orbe, contudo, a vontade como tantas outras variáveis explicativas de nosso caminhar foi desmistificada pela certeza de que o que desejamos ou queremos, portanto, temos vontade de possuir, ou que aconteça, ou que exista, é determinada pela força imperiosa das ideologias. Assim, nossa autonomia que precisa de nossa vontade se reduz a poucas expressões de nossa individualidade. Freire ver um ser autônomo no homo sapiens. Ver que ele pode exercer sua vontade com criticidade, eis o conceito freireano de autonomia – a capacidade de julgar e tomar decisões racionais no mundo das ideologias. Para isso, o homo sapiens necessita de uma ação pedagógica que o possibilite despertar suas faculdades cognitivas e amadurecer seu psiquismo – eis a missão do educador. Se o homo sapiens não sofrer essa ação na idade infante quando suas funções mentais precisam de maturação e despertamento, o homo sapiens sofrerá déficit cognitivo e muita dificuldade terá para discernir qual é a sua vontade ou a vontade exógena coercitiva. A autonomia do ser é proporcional a sua capacidade de julgar as coisas com racionalidade. Sem o discernimento de nossa vontade, não podemos nos considerar seres auto – nomos. “Antes mesmo de ler Marx já fazia minhas as palavras: já fundava a minha radicalidade na defesa dos legítimos interesses humanos. Nenhuma teoria da transformação político-social do mundo me comove, sequer, se não parte de uma compreensão do homem e da mulher enquanto seres fazedores da história e por ela feitos, seres da decisão, da ruptura, da opção. Seres éticos, mesmo capazes de transgredir a ética indispensável, algo de que tenho insistentemente "falado" neste texto. Tenho afirmado e reafirmado o quanto realmente me alegra saber-me um ser condicionado, mas, capaz de ultrapassar o próprio condicionamento”. (Freire, 1996, p. 55) Freire entende que nossa condição inicial no mundo é de condicionamento, um ser inconsciente, um indivíduo alienado de sua realidade, e de certa forma, sem a educação, impossibilitado de uma ação por não ter a visão ou o julgamento de seu mundo. Mas para Feire é possível autonomizar o sujeito, ou pelo menos torna-lo consciente de sua condição – esse é um compromisso ético do educador. Referências: http://www.dicio.com.br/autonomia/controla. Freire, Paulo. Pedagogia da autonomia: Saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996.

terça-feira, 27 de novembro de 2012

O POVO ME QUER

“Há três espécies de cérebros: uns entendem por si próprios; os outros discernem o que os primeiros entendem; e os terceiros não entendem nem por si próprios nem pelos outros; os primeiros são excelentíssimos; os segundos excelentes; e os terceiros totalmente inúteis”. (Nicolau Maquiavel). Leonardo sempre foi carismático. Desde menino que ele se deu bem no trato social e nas relações interpessoais. Leonardo era magrinho, branquinho, e bonitinho. As moças de sua idade diziam dele: “Leonardo só tem um defeito, a bunda um pouco batida, o resto a gente aproveita”. Leonardo estudou no Comendador Saturnino, aqui, na cidade de Pampas. Fez o fundamental, se formando com muito sucesso, depois foi fazer o ensino científico em Aracaju, pois, em Pampas, não havia escolas para isso naquela época. Leonardo fez o ensino científico, e depois fez vestibular para direito. Não passou na primeira vez, fez novamente o vestibular, não passando na segunda vez. Então, Leonardo decidiu voltar a sua terra para seguir a carreira de seus antepassados. Na verdade, sua família tinha muito prestígio por essas bandas. Seu tataravô conheceu o Barão de Jeremoabo, seu avô, foi político forte na época de Getúlio Vargas, e seu pai, o famoso Zé das Galinhas, prefeito da cidade por dois mandatos. A câmara Municipal de Pampas muito se alegrou com a candidatura de Leonardo a Prefeito da cidade. Os vereadores mais antigos se emocionaram quando viram o rapaz entrar com o terno que pertenceu a seu finado pai. - Leonardo tá com o terno de Zé. É meu filho, quem tem nome vai longe, e você o tem. - Mas, eu num quero que o povo vote em mim por causa de meu pai. Eu o admiro muito, mas, eu sou eu! - Assim é que se diz macho véio! O pessoal do “Partido dos Vencedores” se reuniu para estudar a candidatura de Leonardo. O nome “vencedores” era um tanto estranho, mas, em Pampas tem até escola com esse nome. Aqui o povo só pensa em vencer; o povo de Pampas é muito trabalhador. - Acho que Leonardo deve esperar um pouco mais. O pessoal do brejo num vai gostar. - Rapaz, quem tem fidelidade com o grupo acompanha o grupo. Ele num quer ver o futuro da família dele, então, obedeça à direção do partido! - Isso mesmo Cegonha! Interrompeu Toinho do tabaco, “o vereador que sempre leva você em paz”. Todo mundo tem que se unir e formar a base para Leonardo seguir seu destino que seus pais traçaram. - Num é bem assim, Toinho. Eu quero representar meu povo e administrar essa cidade. Ademais, para não discordar de você totalmente; acho que a política está no meu sangue. Cegonha coçou o invólucro escrotal, levou o dedo indicador às narinas e fungou um pouquinho antes de continuar: - Vejam que muitos interesses existem nos Pampas, mas, aqui, a decisão final sempre foi de gente honesta. E o Partido dos Vencedores é um partido de gente honesta. Leonardo deve ser apoiado por todos porque ele representa a geração futura que emerge de um passado glorioso. Todos os presentes se levantaram e aplaudiram o vereador Cegonha – Aquele que não te deixa na estrada. A cidade de Pampas tinha 15 povoados e 10 vereadores. O prefeito anterior havia se envolvido com algumas coisas erradas e estava entregando o mandato sem força para uma reeleição. Ele já havia sido vereador por dois mandatos em épocas anteriores, seu finado pai também foi vereador. Sua família tinha um latifúndio que comportava 60% de todas as terras do município; ele ainda foi presidente da Câmara e do Rotary Clube, e dizem que o mesmo tinha uma rapariga em Olindina. Em Pampas, a moralidade é muito elevada, contudo, as contradições aparecem aqui e ali. - Meus filhos, a igreja é santa e profana. Disse o pároco Norberto. O velho repetia isso em todos os seus sermões. Em sua mente, esse paradoxo era legítimo, e legitimador da conduta geral. - O padre disse novamente aquilo, Solange! - Foi? Nem percebi, meu celular tinha mensagem, me desconcentrei para lê-la. Mas, a gente se criou ouvindo nosso padre dizendo isso. O que é que ele estava falando mesmo? - Mulher, ele estava se referindo ao que o povo faz depois da devoção quando é festa na cidade. Mas, num é verdade mesmo, o povo vem falar com Deus, e depois vai para os braços do capeta e tome cerveja! - Se fosse só cerveja! Minha filha, Pampas tá perigoso! As duas mulheres conversavam dentro do santuário no final do culto. Quando Solange levanta o olhar, Leonardo estava saindo sendo acompanhado por uma senhora idosa. - Mulher, aquela é Dona Francisca? - É! - Mas, espie comadre, como está velhinha! Meu Deus! Será que ela vai ver Leonardo ser eleito? - Num vai o que rapaz! O homem tá eleito! As forças políticas de direita do município praticamente não tinham oposição, no entanto, o partido da oposição ganhava certa credibilidade porque o povo reclamou muito do São João do atual prefeito. - Rapaz, o cara trabalha que só uma besta, ganha mal, come mal, vive mal, e depois, o prefeito faz um São João desses! É um cabrunco esse cara, rapaz! - Cabrunco é pouco Cosminho! Essa porra tinha era que tomar... - Num é Damião? Ah, se eu tivesse uma escopeta! - Tu é de nada fio da peste! Vamos tomar umas que é melhor! Naquele tempo, em Pampas não tinha radio. O debate político era feito no centro social, e transmitido pelo carro de som. Vinha gente de todos os lugares para espiar, ouvir e dizer alguma coisa. Nunca teve morte por isso, o povo de Pampas é da paz. Embora o povo fosse dócil, o debate foi um pouco quente. Os candidatos, como é costume do lugar, se prenderam às denúncias e, às vezes, levantavam assuntos pessoais, e quando o pessoal aparecia, as pessoas Pampenses arregalavam os olhos e abriam bem os ouvidos. - Posso ser um homem de família humilde, meu pai ter morrido por causa de uma hemorroida estrangulada, como alegou o candidato da mesmice, Leonardo, mas, sou honesto, nem empregarei parentes na prefeitura. Disse o candidato da oposição professor Adelson Nunes do sindicado, ou como o povo costumava chamar “Delsinho do sindicato”. - Delsinho tá dizendo que nosso partido tem pessoas na máquina pública. Vejam que barbaridade! É como o povo diz, com uma calúnia dessas, só Deus para repetir a história triste do pai – Hemorroidas nele meu Pai! Quando o populacho ouviu o “Hemorroidas nele meu Pai”, o povo entrou em delírio, a gritaria foi grande, uns atiravam os chapéus para o alto, outros cuspiam e coçavam o saco repetidamente, outros davam cavalo de pau com suas bicicletas. A galera gritava uníssona “É de Leonardo!” Leonardo ganhou e arrastou consigo os vereadores do prefeito anterior. Agora era esperar assumir e compor seu secretariado, o primeiro, o segundo, e o terceiro escalão, sobrando vagas, entram os acordados. São os cargos da raspa do tacho. Leonardo reuniu seu pessoal, agradeceu o apoio e passou para o que interessava. - Olha gente tive que criar duas subsecretarias para caber todo mundo. O que prometi vou cumprir. Agora vamos mostrar trabalho! Sim, Cegonha, sua filha vai ter que esperar um pouquinho porque esse negócio aí depende do pessoal de Aracaju. - Leonardo, palavra é palavra! Você prometeu que ela ia para a secretaria de agricultura em Aracaju. Rapaz, eu preciso muito dela nesse cargo! - Companheiro! Tenha fé, a gente vai ajeitar! A reunião terminou; todos já sabiam como seria o governo. O transporte escolar seria divido com três vereadores da base. A prefeitura faria as licitações e essas empresas ganhariam o serviço de transporte dos alunos. Em cada secretaria estavam empregados sob o regime de confiança os parentes dos vereadores e dos secretários de governo. Algumas vezes, Leonardo teve que aumentar a folha devido a mais um inimigo que virou a casaca para o lado dele. O pobre ficou tão triste que desabafou com dona Francisca, sua tia e confidente. - Tia, num sobra dinheiro não! Tenho que empregar os aliados todos, já pensou que tradição! - Meu filho, hoje tá melhor. Pior foi no tempo de teu pai e de teu avô. Veja, não mudou muito, mas, naquele tempo era pior. - Tia Francisca; vou precisar de um coisa de você! - O que meu filho? Você parece muito com sua mãe. É tão gentil. - Os vales dos caminhões pipas é você quem vai administrar como era no tempo de pai. - Pode deixar meu filho. Faço com muito gosto! A seca chegou. Em Pampas de Sergipe, às vezes, a estiagem dura sete meses e os políticos sendo sabedores disso não preparam a população para enfrentar racionalmente e com dignidade a falta do líquido precioso. A solução era pedir a Francisca um caminhão d’água, dessa forma, o povo estava sempre devendo favor. A água e a saúde eram as forças que formavam o curral de Pampas. Durante os períodos de estiagem, mais pessoas dos povoados se filiavam ao partido de dona Francisca. A mulher, de muita sabedoria, virou uma santa, e seu carisma maior do que o de seu sobrinho, os dois eram imbatíveis. A seca continuou castigando o sertão de Pampas. Uma menina foi picada por uma cobra e faleceu no posto de saúde por falta de um carro para leva-la a Aracaju. A emissora de radio da cidade vizinha noticiou o fato e cobrou de Leonardo medidas para sanar a situação do hospital. - A situação nos Pampas é de urgência. Os cofres públicos devido à estiagem não têm muitos recursos. Vocês sabem a seca castiga, o gado fica fraco, e os negócios também. Disse o prefeito. - Mas, todo ano não há estiagem nessa região? Por que vocês não fazem um planejamento para tanta gente não sofrer assim, afinal, quem vive em total dependência da natureza são os animais, os seres humanos pensam, fazem. Leonardo não gostou do repórter da radio. - Moço, falar é fácil, difícil é fazer! E o amigo pensa que é o dono do mundo, é? Que tem o rei na barriga? Só porque tá falando aí? Leonardo tinha a Câmara toda nas mãos. A estiagem uniu os políticos, eles diziam que era “um pacto pela vida”. Quando a seca foi embora, um rapaz que sofria alucinações devido a uma pancada que levara na cabeça viu Pampas cheia de carros e gente comprando e gastando muito. Mas, é fato; o povo de Pampas, depois da seca, pareceu mais rico. Os comerciantes e políticos se queixavam sempre, mas, a prosperidade era grande. Na grande maioria foram pessoas da classe média para cima que ganharam com a seca: O dono do carro para transporte, o fazendeiro rico que cedeu pasto e ficou com o monopólio do gado; e aí e a coisa vai. Outra coisa que se podia ver era a quantidade de pessoas que venderam suas roças a preço de banana e vieram para Pampas, com isso a assistência social foi dobrada. Dona Francisca, também, tomava conta das cestas básicas. - Solange, Graças a Deus que Leonardo convidou Francisca para trabalhar com ele, mulher! Ela atende a gente com tanto carinho! Dizem até que ela chorou com a morte da menina. Ela visitou a família e prometeu seis carros pipas para o povoado. - É mulher, Francisca nasceu para servir ao pobre. Um rapaz alto, de cabelos loiros e de olhos muito castanhos, que trajava um terno de linho marrom claro, que combinava com seu sinto e seu sapado de mesma cor, entrou no fórum da comarca de Pampas. O rapaz procurava o Promotor; em suas mãos havia documentos que seriam entregues ao Ministério Público. - Boa tarde vossa Excelência, meu nome é Derneval, professor Derneval! Derneval nas horas vagas criava passarinhos, mas, a maior parte de seu tempo era dedicada à educação. O professor fez uma investigação e depois decidiu trazer o resultado ao Ministério Público. - Boa tarde! Respondeu o Senhor Promotor de Justiça, Dr. Matias Fontes. Matias não era natural de Pampas. O homem veio de Aracaju fazer justiça no sertão. Ele era um homem íntegro, praticamente incorruptível. Sempre usava um terno verde abacate ou alternava com um velho terno cinza; ele gostava de cinto e sapato preto. O homem também gostava de sua arma próxima a seu peito esquerdo. Ele a guardava numa cartucheira de peito, tipo 007. - Bem, acompanhei as ações políticas durante toda a estiagem e acompanhei o desenvolvimento econômico de algumas pessoas que estavam ligadas a máquina, e percebi que essas pessoas têm renda incompatível com o padrão de vida que ostentam. Derneval terminou sua fala e entregou os documentos ao agente da lei. O promotor ficou admirado com a denúncia respaldada e tratou de investigar. Sete foram os meses de sigilo de justiça. Dr. Matias tinha provas para caçar o prefeito e 7 vereadores de sua bancada como também prender parentes e agregados de vossa excelência, contudo, nada escapa ao olhar de um bom político, o próprio povo o defende, ou o avisa. Todos querem ficar perto do poder. - Leonardo, Clementina do fórum disse que tão investigando você? E parece que a coisa é séria! - Calma Sisleide! Eu já sei o que é! Isso num dá em nada! Que ver? Espere! Leonardo ligou para Brasília. O rapaz queria falar com um senhor muito amigo de seu finado pai. O homem era Senador. Depois ele ligou para seus amigos em Aracaju e externou sua preocupação com a base aliada que serviria para a reeleição do Governador. “Precisamos garantir a reeleição do homem porque nós não podemos ficar sem o apoio do Presidente”. Os políticos de Brasília e de Aracaju quando souberam ficaram preocupados e agradeceram a Leonardo e a dona Francisca por pensarem rápido. Pouco tempo depois a mídia noticia o desfalque em Pampas. “Prefeito faz farra em Pampas”. Manchete do Jornal 9 horas. “Prefeito emprega até a rapariga do vereador”. Manchete do jornal Domingo Santo da Igreja Internacional do Bem de Cristo. A zoada durou uma semana, depois se acalmou. O promotor Matias foi transferido para outra Comarca deixando a bomba para um colega que nem tinha conhecimento do processo que foi misteriosamente para o fim da fila formada por centenas de processos. Leonardo foi reeleito a prefeito de Pampas. A seca continuou castigando o município, os carros pipas passeavam para lá e para cá. Dona Francisca sempre na calçada quando o sol esfriava. O povo que passava lhe agradecia as bênçãos. Matias nunca soube o motivo de sua remoção – tinha desconfianças, afinal, ele conhecia bem a história do Brasil. - Sinhô! Sim Sinhô! Fale que nego escuta! - Meu véio, e vai continuar assim? O velho ajeitou o cachimbo no canto da boca e disse soltando fumaça: - Num libertaram os nego? Num foi? Tonce vão libertar vosmercês. - Quando meu véio? - Sinhôzinho pergunta muitxo. Mas, nego véio gosta de vosmercê. Tudo nesse mundo um dia muda. Nesse causo, a mudança é só quando a gente pobe entender o que lê e o que vê; aí o povo vai sabê quem é o dono dessa terra mermo. Se num é de quem trabaia nela! Num foi assim que Zambi deixô? ...

quinta-feira, 22 de novembro de 2012

A ESCOLA NÃO É UM ESPAÇO NEUTRO PENSA ALTHUSSER.

O presente ensaio foi inspirado no artigo “Althusser: A escola como aparelho ideológico de estado” de Luciano Lempek Linhares (Mestrando pela PUC-PR), Peri Mesquita (Mestrado pela PUC-PR), e Laertes L. de Souza (Sem referências de títulos). Esse trabalho faz parte de nossas pesquisas sobre Educação. Temos tomado o procedimento de fazer pesquisas bibliográficas sobre diversos olhares para a Educação. O texto dos referidos autores encontra-se a disposição dos leitores no seguinte endereço eletrônico: www.pucpr.br/eventos/educere/educere2007/.../CI-204-05.pdf. Para entendermos melhor o que Althusser pensa da Escola é necessário primeiro entender as duas teses fundamentais de seu trabalho: A ideologia e o Estado. Pois, sabendo o que ele pensa sobre esses dois temas, o nosso olhar sobre a escola e a educação pode se tornar mais nítido. Para Althusser, a ideologia presta um serviço de fundamental importância para a burguesia dentro do sistema capitalista; é por meio dela que a burguesia consegue manter o seu status de classe dominante. Ela está presente na formação das classes sociais, na perpetuação das condições de reprodução, nos aparelhos ideológicos estatais e privados, e com muito mais força, nas escolas. Para o pensador francês, a ideologia é o sistema das ideias e das representações que domina o espírito de um homem ou de um grupo social. São ideias falsas a respeito de si e da realidade. A ideologia promove a organização das relações objetivas em função de suas representações. Esses produtos do cérebro humano crescem ao ponto de dominar o homem completamente, assim, nos tornamos criações de nossas próprias criações ou falsas representações da realidade. Althusser nos apresenta o conceito de ideologia usando duas teses: a imaginária e a material. A primeira refere-se à ideologia enquanto representação imaginária dos indivíduos com as suas condições reais de existência. São ideias de mundo, na maioria das vezes, fictícias, sejam religiosas, morais, jurídicas ou políticas, pois, não correspondem à realidade, à verdade. Assim toda ideologia representa, na sua deformação imaginária necessária, não as relações de produção existentes e as que dela se originam, mas, a relação imaginária, onírica como diria Freud, dos indivíduos com as relações de produção e com as relações que delas derivam. Na ideologia, não é a realidade das relações que é apresentada, mas, as relações imaginárias dos indivíduos com as relações reais em que vivem. É por essa razão que um indivíduo é capaz de dar sua vida em uma guerra para defender a ‘nação’ sem antes ponderar sobre os reais motivos do conflito, ou outro indivíduo entrar em depressão porque quebrou algum preceito moral de sua religião. Alguns são tão presos e fanatizados por suas ideias que são capazes de morrer ou matar por elas. A segunda tese de Althusser diz respeito à materialidade da ideologia. Segundo ele, a ideologia tem também existência material. Ela existe em diferentes formas, todas enraizadas, em última instância, na matéria, pois, ela está inculcada; faz parte da mente social do sujeito. Assim, a ideologia não é somente um sistema de falsas ideias que atuam somente na imaginação, na compreensão da realidade, ou na representação do mundo. Ela tem existência material, e é nessa existência material que Althusser enfoca seu estudo. Essas ideias são, portanto, um conjunto de práticas materiais importantes para à reprodução das relações de produção, pois, elas representam os interesses materiais de uma determinada classe – a burguesia capitalista. Para o pensador Louis Althusser, as ideologias falam de atos. Atos inseridos em práticas. Essas práticas são reguladas por rituais a que elas se relacionam no seio da realidade material de um aparelho ideológico, mesmo que se trate de algo aparentemente pequeno e insignificante como uma missa em uma capela pouco frequentada, uma partida de futebol, um jogo de xadrez, um dia de aula na escola, ou um encontro de membros de um partido político. Assim, meu amigo Souza, digo sem medo de errar, as ideologias inspiram comportamento - a ação concreta, portanto, a ideologia tem uma expressão material no mundo. Como muito bem colocam os autores do artigo em apreço no momento: “Althusser demonstra que a ideologia não se reduz a simples imposição de ideias, ela se efetiva em práticas sociais inscritas em instituições concretas, reguladas por rituais no seio dos aparelhos ideológicos do Estado”. O sujeito da ação e do discurso para Althusser é constituído de ideologia. Segundo ele, é a ideologia que forma a mente social do indivíduo. Por isso, ela está presente tanto na mente como no comportamento das pessoas. As praticas sociais, portanto, só existem por meio da ideologia, e a ideologia só existe para o sujeito e por meio dele. Deste modo, toda ideologia tem por função constituir os indivíduos em sujeitos concretos. Segundo Althusser, a transformação da besta humana em sujeito via ideologia é para que este aceite livremente a sua condição de sujeição, e os atos da mesma diante do grande e soberano Sujeito (O Estado). Assim, nossa educação, formadora de nossa mente social, visa servir, em primeiro lugar, aos interesses do Estado, como diria Lacan, “O grande Pai”. Por essa causa, são considerados bons sujeitos, os sujeitos que pela mediação da ideologia da classe dominante presente nos AIEs (Aparelhos Ideológicos de Estado), seguem os modelos propostos pelo sistema capitalista, pela burguesia, sem contestar tais padrões e concepções de mundo. Como Freire diria – “Sujeitos passivos, sem fala[1], unidos visceralmente à natureza”. A força da ideologia é tão grande que não nos revoltamos quando um ‘colarinho branco’ desvia milhões e não é punido por isso, ao mesmo tempo, achamos legítima a prisão de um reles batedor de carteiras, ou ladrão de celular cujo valor não se compara ao montante de desvio de verba pública feita pelo moço de terno. Achamos que a Canabis Sativa é droga censurável, por isso, criminalizar o usuário é correto, e que é dever do Estado puni-lo, mas, não conseguimos enxergar na imensa multidão de bêbados e alcoólatras, que carregam consigo as sequelas funestas desse vício, a pessoa do drogado e nem a letalidade dessa droga abençoada pelo Estado – como a mídia já veiculou até o ex- presidente a consome sem remorsos – e como sabemos desde criança - a igreja a usa em seus cultos, com moderação é claro! É muito difícil se lidar com ideias inculcadas! Para mim, ambas fazem mal e não devem ser consumidas. A inculcação da ideologia dominante é aprendida, reforçada e perpetuada na escola, contudo, ela não se origina nela. A inculcação das ideias dominantes tem, antes, origem na formação das classes sociais, no seio do próprio Estado e de seus aparelhos. O Estado é visto por Althusser como uma máquina de repressão que assegura a dominação da classe burguesa e dos proprietários de terra sobre a classe operária para submetê-la ao processo que ele chama de extorsão da mais-valia – a exploração capitalista. O Estado, segundo Althusser, funciona como um aparelho ideológico e como um poder de força coerciva. Organiza-se como um instrumento que serve para garantir os interesses da classe dominante - a burguesia, sobre a classe dominada – proletariado, ou a classe trabalhadora. Sendo assim, o Estado tem por objetivo assegurar, por meio das ideologias sobre os valores, as concepções de mundo, etc., e/ou da força física, a permanência da burguesia no poder. Como cita os autores a Althusser: “É o aparelho de Estado que define o Estado como força de execução e de intervenção repressiva”. (Linhares, Mesquita e Souza, apud Althusser,1970, p.32). Para Althusser é o Estado, representante da classe dominadora, quem dita as regras do jogo social. O Estado é normativo; é repressivo das possíveis contestações e revoltas populares; é modelador da sociedade. O discurso considerado legítimo é o dele. Ele dita as regas de convivência, o comportamento padrão, o dito normal e o transgressor por meio de seus AIEs, e caso seja necessário, ele usa seu aparato militar, e/ou policial para manter o que ele considera ser a ordem. A visão marxista de Althusser entende que a existência do Estado só tem sentido em função do poder de Estado. Por isso, Althusser diz que toda a luta política de classes gira em torno do Estado e da detenção e conservação do seu poder. Manter o poder de Estado é o propósito da classe dominante para poder manipular os seus aparelhos ideológicos de Estado, os AIEs. Os autores do artigo em apreço entendem que Althusser põe o Estado com duas faces distintas, mas, que se complementam. O que usa a repressão pela força e o que usa seu aparelho ideológico. O primeiro é o que se expressa sob o princípio que o Estado deve punir e ou até matar em nome da ordem social, essa é a sua força coercitiva e direta sobre os sujeitos (polícias, exército, tribunais, etc.). O segundo, é o que se expressa pela instauração dos Aparelhos Ideológicos de Estado, é o Estado em que a ideologia é realizada e se torna dominante. Ela tem por objetivo último a reprodução das relações de produção. Althusser designa por aparelhos ideológicos algumas realidades que podem ser vistas pelos observadores atentos e imediatos sob a forma de instituições distintas e especializadas. Como diz Weber – ‘burocratizadas e racionalizadas’: Os sistemas das diferentes igrejas; os sistemas das diferentes escolas públicas e particulares; a família; o sistema jurídico; o sistema político de que fazem parte os diferentes partidos; os sindicatos; os sistemas de informação: Radio, televisão - a mídia em geral. Todos esses AIEs tem como função servir ao estado, segundo Althusser. Assim, meus caros, parece que existe um determinismo do estado sobre o sujeito, e uma seleção. Esta última ocorre na escola que não é neutra. O presente ensaio tem como título “A Escola não é um espaço neutro segundo Althusser”. Depois de mostrar as ideias de Althusser sobre ideologia e Estado, os autores do artigo em apreço, tecem suas colocações sobre a escola usando a expressão: “Estado Escolar” em virtude das relações de funcionalidade do aparelho escolar em relação ao Estado. Para eles, a instituição escolar atua sob as orientações e normas do Estado. Ela é constituída como um AIE por ser porta-voz dos interesses da classe burguesa, e por estar, assim, a serviço da classe dominante que detém o poder do Estado e que influencia seus aparelhos ideológicos a seu serviço e em benefício dos seus interesses de classe. Os autores trabalhados nesse ensaio colocam que a escola atua no interesse da estrutura de dominação estatal tendo por finalidade a dominação da classe operária. Para tanto, a escola trabalha promovendo a inculcação das ideias burguesas. Essa dominação, por sua vez, não se dá de maneira direta, através da aplicação explícita da violência como no Aparelho Repressivo de Estado (ARE), mas de maneira disfarçada, indireta, ideológica, por meio de uma “ação pedagógica”. Althusser acredita que após uma violenta luta de classe política e ideológica como nas revoluções, o aparelho ideológico escolar será o responsável juntamente com o aparelho ideológico político por reproduzir as relações de produção capitalista e de classe. A escola capitalista, nos dias atuais, para Althusser, faz o serviço que era feito pela igreja. O aparelho ideológico moderno, nos nossos dias, a escola, substitui o aparelho ideológico religioso do século XVI. A escola, então, é a responsável para formar sujeitos nos moldes capitalistas desde a infância. A escola trabalha junto com o aparelho estatal repressivo na formação dos cidadãos e na inculcação das ideologias dominantes, e estas estão presentes em todos os discursos escolares, seja na visão de mundo, seja no conteúdo dos livros, na estética e valores morais. Para Althusser o desenho da educação é inspirado na necessidade do estado enquanto instancia normativa, reguladora e repressiva da sociedade, e do poder de estado no qual a classe dominante se apoia – o poder de manipular as ideologias para a reprodução do modelo e perpetuação do status quo. As colocações de Althusser citadas pelos autores do artigo resenhado que nos inspirou este ensaio são muito sérias. No início dissemos que veríamos a realidade de forma mais nítida. Com certeza, temos agora, meu caro Souza, um olhar mais maduro para o entendimento do pensamento de nosso ilustre pedagogo Paulo Reglus Neves Freire. Em “Pedagogia do Oprimido” Freire enxerga a realidade dicotomizada pelo par dominador/dominado. Isto faz alusão ao pensamento de Althusser. O interessante é que a condição do homem em Althusser é de alienado, pois, o sujeito é cria da ideologia e da necessidade de sua sujeição ao sistema. Assim, o não conhecimento de sua condição é necessário para a ordem geral. O desvelamento pode suscitar a possibilidade de revoltas ou rupturas. Portanto, o discurso do estado dever ser monológico fazendo alusão a Bakhtin, pois, esse discurso tem o interesse que todos sejam uníssonos no pensar e no agir. A contestação demanda explicações – diálogo, e isso o estado não deseja. Por outro lado, acredito que o olhar de Althusser para o Estado e sua função no mundo não abarca toda a realidade desse objeto. Contudo, devo admitir que o estado, seja capitalista ou socialista, ou apresentado sob outra forma, será castrador de qualquer jeito. No rebanho dos homens sempre alguém dará as ordens e o inteligente obedece. A sociedade harmônica, fraterna e solidária tem existência no mundo ideal. No mundo objetivo, as relações entre os animais chamados humanos são de conflito – cada bicho estará disposto a matar, roubar, ou a fazer de tudo pela carniça – o alimento, seja esse do mundo concreto, ou simbólico. Todavia, ao contrário de Freire, Althusser não contempla a utopia de uma escola que ensine contra a ordem vigente. Embora, em Pedagogia do Oprimido, Freire não cite a revolução armada e a apropriação das ideologias estatais, ele acredita na revolução cultural e vê nela a chance de construção de uma nova realidade para os países capitalistas subdesenvolvidos. No entanto, Freire esbarra na solidez da realidade: “Qualquer estado, seja ele qual for, constituirá uma escola política, jamais neutra, segundo seus interesses”. Se a educação ocorre dentro dos muros da escola, então, toda educação formal será ideológica – trará um germe hospedado para se hospedar no sujeito aprendente e esse germe será potência para o comportamento social. Freire diz que o dominador está hospedado no dominado. Meu caro Souza, este ensaio teve como intuito mostrar ao ilustre mestre em sociologia que é necessário o estudo de outras variáveis explicativas do fenômeno educação para que possamos amadurecer a importância do pensamento dialogista sobre educação. A teoria dialogista de Freire, implícita em seus postulados, desperta o nosso olhar para um diálogo urgente com outras teorias e outros olhares como a Teoria do Capital Humano, e o determinismo hereditário – social de Bourdie. Paz e Luz! Referencias: Linhares, Luciano Lempek; Mesquita, Peri; Souza, Laertes L. de: Althusser: A escola como aparelho ideológico do estado. www.pucpr.br/eventos/educere/educere2007/.../CI-204-05.pdf. Freire, Paulo. Pedagogia do Oprimido, 17a. ed. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1987. [1] A expressão sem fala segundo Freire nos remete aos alunos da escola bancária que para ela, não tinham história; eram meros depositários dos discursos do professor. Por Roosevelt Vieira Leite