sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

PROCURANDO UM ETHOS II

A busca por uma identidade nacional foi instrumento político utilizado por vários estados-nação. O objetivo era o de unificar territórios fragmentados em torno de uma entidade abstrata que reunia práticas, comportamentos, costumes, língua e normas comuns exercidas num determinado território e povo.

No Brasil, na década de 30, alguns elementos da nossa cultura foram elevados a símbolos nacionais, como o carnaval, a mulata, a capoeira e o samba. Exemplos como esse fizeram Benedict Anderson lançar uma obra intitulada de “Comunidade Imaginada” em que é discutida a construção abstrata do sentido da cultura nacional. Hobsbawm, em “Invenção das Tradições”, em que reconhece que as identidades são inventadas.

Sob a batuta desses dois autores continuemos exercitando o argumento sobre a sergipanidade. Essa condição que nomeia o ser sergipano e lhe atribui o caráter de existência num contexto sócio cultural e econômico nacional e mundial. O fenômeno da globalização consiste em trocas das complexas possíveis nos vários setores da vida social. Essa onda de intensos contatos cobra que apresentemos um diferencial e para isso torna-se necessário elencar aspectos das culturas locais que sejam peculiares para servirem como moeda de troca no mercado de bens culturais. Por outro lado, fora do discurso determinista econômico, está a condição processual de pertencimento e de auto-reconhecimento de etnias e nações. Na Espanha, vários grupos étnicos como bascos, catalães e curdos não se reconhecem como espanhóis. O Estado promove a unificação por meio do uso da burocracia estatal e pelo poder de polícia.

Quanto a sergipanidade. O que vem a ser de Sergipe torna-se uma questão complicada de se definir, tendo em vista que sofremos influências de muitos lugares desde muito tempo, seja da Bahia com seus carnavais fora de época e pelo cultivo da cultura negra, de Pernambuco por sua música, do Rio e de São Paulo por meio dos comportamentos reproduzidos pelas novelas, dos Estados Unidos através dos filmes e da música. Outro dia ouvi um produtor cultural de Aracaju dizer que contestava quando as pessoas que a banda de rock sergipana Snooze não fazia música sergipana. Ele afirmou que independente de a banda ter composições em inglês se tratava de música de Sergipe pelo fato de estarem imersos na sociedade sergipana e que esse meio de alguma forma influenciava na sua música.

Particularmente não discordo dessa perspectiva, já que essa banda, assim como outras de estilo semelhante constituem um grupo com preferências por esse tipo de música e estilo comportamental influenciados pelo rock, mas, que, por outro lado, residem e tocam no estado e contribuem para reproduzir essa prática em parte da população. Com isso, essas práticas já estão incorporadas a cultura sergipana.

Outro argumento é o de que a sergipanidade é fluída ela está constantemente em transformação e o que nos é apresentado como nossos símbolos culturais, como papagaio, Cacumbi, São Gonçalo, Caceteira, entre ouros são “invenções inventadas” (no sentido de Hobsbawm) elevadas a símbolo. São edições de uma pluralidade, afinal de contas, além da música “meu papagaio” ser veiculada como canção que representa o estado, a cultura do litoral é a que possui maior destaque nos meios de comunicação. Além do que, o sergipano, ao que me parece, está mesmo preocupado com o que vem de fora e estranha o que está ao seu redor. Isso reforça cada vez mais a nossa característica provinciana.

3 comentários:

  1. Aly Soul,

    Olhe, eu acredito que apesar das fusões intensas provocadas pela globalização, querendo ou não, as formações especificas a cada localidade não deixam de existir devido as suas formações históricas. Apesar de recebermos influências de todas as partes, não há como negarmos traços carateristicos que são resultados de toda uma história de valor, de ética, de educação, de religiosidade, de habitos construidos em determinada localidade. Contudo veja bem: como eu disse em seu texto anterior, essas características não são fixas e absolutas.

    É por isso que ao mesmo tempo em que penso poder haver uma cultura local, penso não haver uma cultura especificamente local. Para mim, nós temos a cultura produzida em Sergipe, mas não temos a cultura DE Sergipe, o que temos é a cultura EM sergipe. O DE Sergipe me passa uma idéia muito absoluta e determinista. Já o EM possibilita não só aceitar as influências das localidades, como também abre esparo para uma elasticidade maior que não nega as influências externas e nem insiste em discursos bobos esteriotipados como o nosso papagaio que não tem asa nem tem bico.

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  2. Aly Soul,

    Continuando:

    " o sergipano, ao que me parece, está mesmo preocupado com o que vem de fora e estranha o que está ao seu redor."

    Concordo, mas temos tambem que pensar nas midias que impõem modelos de comportamentos ditos "nacionais", mas que se resumem aos grande polos, não deixando praticamente quase nenhuma brecha para os artistas e pensadores que não se encontram dentro do eixo dos grandes pólos exporem seus trabalhos. Resultado: se ficamos sabendo de algum evento, é através das bocas de amigos que é amigo de um amigo do amigo de um artista ou em blogs alternativos que não são divulgados para a maior parte da população.

    Claro que não podemos deixar de visualizar o provincianismo do Estado que pelo menos em teoria teria o papel de fortalecer o contato maior com produções ditas locais. No entanto, devemos saber que o Estado se tornou uma máquina predisposta a atender aos interesses do mercado, e assim como uma empresa, ele se enconra preocupado em obter lucros, e se a nossa formação histórica nao permite que a gente conheça as produções internas, qual o ganho que o estado teria em fazer um projeto com artistas daqui ao invés de apenas um show milionário de uma Ivete Sangalo se nós não fechariamos talvez sequer 50% de uma bilheteria para assistirmos o show sem ser o da Ivete?

    Também acho que o perfil da sociedade de massa ajuda a perpetuar esse quadro. Veja: hoje em dia temos uma variedade enorme de bandas, autores independentes e anonimos pela rede virtual, mas as pessoas mesmo tendo essa diversidade, mantêm-se estagnadas e acomodadas a querer o obvio e aquilo que a maioria ja sabe e conhece. É muito raro vermos pessoas abertas para conhecer a história, o trabalho daqueles que não são inseridos nas grades de programação da grande midia. Como a cultura dita local já sofre por não ter espaço nos meios midiaticos, a massa ainda contribui com o anonimato. Não estou querendo dizer que a massa seja acefala, estou dizendo que a massa tende a ser mais acomodada e disposta a aceitar apenas aquilo que já é legitimado na sociedade em geral.

    Concluindo: soma-se nesse bolo envenenado a intolerância das midias de massa com as especificidades fazendo com que os cidadãos de uma dada localidade deixem de ter acesso às suas produções, assim como o próprio provincianismo fruto de nossa formação histórica e a natureza conservadora e acomodada da massa.

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  3. Meu caro, Vina. Creio que a o seu discurso sobre a indústria cultural é legitimo quando afirma que a mídia manipula e conduz os discursos para aquilo que é convencional. No entanto, não pdoemos deixar de destacar que as redes sociais, blogs, coletivos de artistas estão acontecendo e criando um circuito de trocas que abala essa mesma mídia. Afinal de contas, as grandes gavadoras não estariam tão preocupadas em fazer campanhas contra a pirataria e downloads gratuítos se não estivessem se sentindo ameaçadas. O mercado convencional, vamos assim dizer, possui seu poder de articulação e barganha, mas não possui a força de inovar e por esse motivo eles vão buscar nos meios "alternativos" o que está rolando. É certo que a concorrência é grande, mas, por outro lado, a disposição para parcerias ou formas alternativas é um caminho crescente.

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