quinta-feira, 30 de agosto de 2012

SENTADA

Ela esteve sentada por todo o percurso. A paisagem fazia belo o vazio de meu peito. O desejo de dizer foi menor que o de sentir. Sentir a presença de uma alma desconhecida. - Uma viajante aparentemente sem destino! Ela estava ali quase indiferente a minha existência. Parecia invisível, insensível, intangível. O carro com dificuldade seguia a viagem. E eu, o curso da estrada. Terra dura, sem asfalto; a poeira voa alto. No verão, o ar rarefeito, nos faz pensar na volta, quando a tardinha chega mais fria. As garças dançavam bem organizadas sob olhar suspeito da lua. O sol, ao longe, despia o resto do dia de suas vestes coloridas. - Uma mortalha preta estava lá aguardando a serra sumir na escuridão. No escuro, todos são iguais! Os morcegos podem nos dizer sobre isso! O preconceito é doença, é ferida! É distância de criança, é brincadeira, é herança mal dividida. É uma senda esburacada; Uma mente atrapalhada. Uma faca de dois gumes! - Só, não diz de si, um vagalume! Ela se levantou e eu passei. Ela se ajeitou, e eu pelo corredor apertado daquele veículo mal encarado, deslizei com dificuldade. Desci, desci, desci... Tomei outro caminho. Nele vi uma figura amiga. Despida! Nua! A pele estava crua! Andava na rua e dizia somente a verdade...

segunda-feira, 27 de agosto de 2012

Pesames

Caro Roosevelt,

As lagrimas sao ineficientes para acalmar nossos animos,
a perda e castradora.
Vivemos iludidos pela ideia de eternidade,
mas sabemos que ela e finita,
pois tudo que tem um comeco,
tera um fim.
Finito que seja,
intenso que seja
a vivencia, a experiencia
nao menos a dor.

Minhas palavras sao minimas nesse momento,
a falta e continua, destruidora e vazia.

sexta-feira, 24 de agosto de 2012

Lágrimas do exílio

Permitam-me os colegas publicar dois textos na semana. Gostaria de chorar o faleceminto de meu pai que se deu dia 19 de agosto. Dizer dele agora é sentir um entalo na garganta. É fazer falar a alma que pranteia. É esticar as palavras para ver se alguma delas consegue fugir das vias; Mas enganar esse nó, Ou essa laringe, Ou romper a traqueia ou faringe para, quem sabe, um som ser ouvido, parece uma tarefa impossível. Era tarde de sol calmo, de nuvens andarilhas no céu azul de minha terra. Era um dia qualquer da semana. Meu olhar se volta para o canto da parede onde em pé estava, com um ciscador nas mãos, a figura dele. Sem camisa e de bermuda estavam ali minhas entranhas. Uma voz ecoa pelo ar aquecido do calor da pedra surrada pelo sol da manhã. “Meu filho!” Como era suave e agradável ao peito saber que ele estava comigo! Como foram importantes aqueles momentos, uma verdadeira conspiração de amantes! As eternas criaturas que se amam eternamente não deviam se separar! Com ele caminhei em seus sonhos e ele nos meus. Os dele me viam um ser que partia para longe. E os meus sempre o levaram comigo. Ah! Meu ser se curva a tua força, oh, morte! Esse é o dogma irrefutável da fé! Ah! Como é dura a tua pancada! Como é afiada a tua espada! Como és cruel por roubar de mim a quimera minha de sempre vê-lo no mundo! Eu vi uma pomba branca que do telhado de uma casa alçou voo. Uma senhora idosa me perguntou se eu sabia de seu destino. Ah! Minha senhora eu não leio essa sorte! De tudo entendo um pouquinho, menos da morte. A mulher insistiu sem se importar com meu tormento: Para onde foi a pombinha? As lágrimas caíram de meus olhos; deles fizeram bolsas cheias de dor. Minha senhora, eu estudei muito; me chamam até de doutor. Isso é coisa que não sou; eu garanto. A pomba se foi deixando comigo uma peninha. Ela, é certo, eu guardarei até que um dia eu possa dizer o que havia na minha garganta. Tentei dizer, mas, a boca não falou. Calo-me, então me curvo ao Soberano Senhor! Há momentos que as palavras não consolam. Seus afagos não aquecem e do peito a saudade não afugenta. Saudades Pai! Talvez fosse isso...

quinta-feira, 23 de agosto de 2012

O MAU POLÍTICO

O mau político se candidata pensando nos lucros que pode obter pelo cargo que ocupará. Ele jamais pensará no povo, pois, este, para ele é apenas objeto de seus interesses escusos. Para se eleger, o mau político é capaz de tudo: Mentir, acusar os adversários, inventar provas, e, sobretudo iludir o povo porque ele pensa que o povo é tolo - é um curral de bois. Antigamente usavam essa expressão Curra l Eleitoral. Hoje a coisa é diferente, contudo o mau político insiste em fazer festas para o convencimento das pessoas, ele se esquece de que o povo vai à festa e vota em quem quer. Os tempos são outros, mas, o mau político está sempre desinformado porque ele não se preparou para sua suposta missão. Tudo que ele quer é o poder por que em sua mente o poder é igual a lucro. O mau político não tem projetos coerentes; tudo que ele apresenta, ele sabe que não pode cumprir, é apenas retórica de palanque, são palavras que não voltam mais, pensa ele. No entanto, o povo não tem mais memória curta, estamos na época da informação. O mau político insiste em fazer campanha suja sem argumentos edificantes e sem bases racionais para dizer por que quer ser o que diz querer ser. Ele tem uma crise de identidade e por isso não olha na cara do povo, pois, teme ser descoberto e com isso seu sonho desmoronar. O mau político não espera sua vez, ele quer passar na frente do outro; o coitado não entende que Deus está no céu e o poder não é de quem quer, mas, de quem Ele escolhe pela mão do voto. Com isso, o mau político não espera a benção do Senhor como fez Saul e com certeza sendo eleito sofrerá as consequências de seus atos no fundo de sua consciência. O mau político odeia o pobre, este incomoda sua alma, pois, sua riqueza foi tirada de lá - da pobreza, na maioria das vezes por meios duvidosos. O mau político não teme a justiça, ele acredita que tudo termina em pizza. Mas, será mesmo? Às vezes, a regra vira exceção.

segunda-feira, 20 de agosto de 2012

Vazio II

Se vazio verbalizasse algum significado,
ficariamos ensurdecidos pelas reticencias...,
 indiginados pelas virgulas e
mudos pelas exclamacoes.

segunda-feira, 13 de agosto de 2012

Aviso

Caros Tortos,

Peco- lhes desculpas por antemao, pois nao poderei postar no blog essa semana. Uma boa semana para voces. Ate proxima segunda.

Abracos, Maira

quarta-feira, 8 de agosto de 2012

Reis e Peões no Jardins


O Jardins foi lançado como terra prometida, onde se poderia encontrar, finalmente, um shopping numa região mais centralizada na cidade. Sim, a construção do Shopping que leva o nome do bairro impulsionou seu desenvolvimento predominantemente vertical. Nada melhor no coração de um bairro nobre que um colosso do consumo, em que a força das luzes fariam pouco importar se lá fora se tratava de dia ou noite, em que a força dos ares-condicionados fariam pouco importar se lá fora fazia calor ou frio – more e consuma, nós garantimos a luz de um sol e um clima ameno para a efetivação de qualquer uma de suas compras!
Os peões que ali trabalham não podem, em sua esmagadora maioria, morar por perto. O dinheiro concentrado através das compras é volumoso, mas o distribuído é rarefeito.
Em frente ao shopping há um terreno infestado de outdoors. Estes são os preferidos de algumas escolas particulares que movimentam a tão inescrupulosa quanto bem-sucedida indústria do vestibular. São anúncios que estimulam o ingresso nas profissões legitimadas, as que permitirão ao indivíduo morar por ali. As rentáveis, e por isso até moralmente mais admiráveis. Nas fotos, os primeiros colocados nestes cursos abrem um sorriso amarelo, muito embora o conhecimento adquirido a fim de conseguir tamanho êxito no vestibular algumas vezes não lhes permita enxergar o quão instrumentalizados são, enquanto “alunos de ponta”.
É preciso tornar o desejo cada vez mais mimético. Sabe-se, de fato, que o individualismo é cada vez mais estimulado. Mas há padrões que devem nortear as particularidades. Para ser um indivíduo bem-sucedido, por exemplo, você deve escolher alguma das profissões socialmente bem consideradas. A partir daí você pode exercer fortemente seu individualismo comprando um carro socialmente cobiçado e um apartamento no bairro Jardins, coisas que todo mundo quer. Depois é só cuidar de reproduzir, tanto os seus genes quanto as estruturas sociais (e o ponto deve ser final).
Quando se encerra o expediente, às vinte e duas horas, os Severinos lotam os caducos ônibus em direção aos outros lados da cidade, onde moram, enquanto os reis saem em seus veículos particulares em direção a aglomerados de diversão não tão remotos. 

segunda-feira, 6 de agosto de 2012

Apatia Intelectual

O torto esta morrendo, e os tortos tambem.
Todo ciclo tem sua fase de altos e baixos, de efervescencia e calmaria indiferente. Avisos, silencios, refletem essa fase. Pontuacoes e reticencias... Afirmam mais que um texto cheio de palavras que refletem a existencia do universo. O  torto pode ter pecado pelo excesso de eus. Se escrevo, quero comentario, se nao, nao comento, ando muito ocupado (a) para isso. Cada um tem sua vida privada. A demanda do dia a dia e muito alta, desumanamente humana. Faltou tempo para se pensar no Torto. Torto nao como apenas um blog, que eu ou qualquer deva comentar cada texto, mas um Torto que pode se abranger para diversos lugares e publicos. Confesso que e dificil, nao pela apatia dos autores, mas da falta de um publico assiduo ou ate um investimento privado. Ideias, somente pertence para poucos. Para muitos, ela so cabe a intelectualidade pretensa de ismos. Torto e pretenso, torto e vazio, torto e integro, torto e deslizante. O pior que o torto pode adquirir e a falta de fluidez, a falta de comunicacao entre os espacos. Ele atigiu o vazio ensurdecedor. Isso pode ser um ciclo, fase ou ate um termino. Checarei  o proximo dia.

quinta-feira, 2 de agosto de 2012

A ESCOLA DE MANDALA

Quando fui trabalhar na Escola Freitas de Matos, todos chamavam Maria de “a divina”. Segundo os funcionários do turno da manhã, Maria era Deus na terra. Para os copeiros, zeladores, vigias, e outros; Maria Mandala foi a melhor diretora que a Escola Freitas de Matos tivera. Maria Mandala foi criada na melhor educação da Vila de Campos. Fez o catecismo, se confessou, e fez a primeira comunhão. Desse dia em diante, aos domingos Mandala comungava religiosamente. Seus pais, ainda vivos, exerciam uma influencia marcante em sua vida. A menina cresceu sem causar terrores para a família. Seu Adalberto dizia com muito orgulho: “Ainda vou ver Mandala como diretora do Freitas de Matos”. Mandala se tornou mulher com esse sonho na cabeça. Mandala nunca casou. Sua mãe, dona Rosinha da Lagoa da Porta, educou a menina para ser mãe de família. “Minha filha guarde o que você tem para seu marido!” Maria Mandala gostou de um moço que, de quinze em quinze, vinha a Tobias, contudo, a suspeita dele ter família em Ilhéus foi maior que o calor de seu sentimento: “Eu dou para qualquer um, mas homem casado jamais!” O tempo passou e Mandala nunca conheceu o amor. Agora Mandala era a diretora do Freitas de Matos – A escola que dialoga com o diverso. Quando bati à porta do Freitas de Matos com o termo de posse nas mãos, vi a figura de uma mulher branca, cabelo um pouco crespo, pele pintada de sarnas, e estatura quase a minha, um metro e setenta, eu acho. Ela usava calça jeans, uma camisa Pool cinza e sandálias de couro compradas na feira. Ela me viu no portão e veio abri-lo para minha humilde pessoa. - Bom dia! Disse Mandala com a boca entre aberta esboçando aquele sorriso profissional. - Bom dia! Disse eu. Ao olhar em seus olhos pela primeira vez senti a dor de uma faca afiada varando meu peito. - Eu sou Plínio, o novo oficial. Estendi minha mão com a carta nela. Mandala olhou o documento e perguntou. - O que você sabe fazer? Eu respondi que não sabia e que só vendo no trabalho é que poderia ver o que eu iria fazer na escola. - Tudo bem; venha na segunda feira. Sai da Escola com o coração cheio de ansiedade e restrições. Eu havia sentido que minha ida ao Freitas seria o começo de uma triste história. Por algum tempo fiquei sem entender o porquê que minha opinião sobre Mandala era diferente do resto da escola. Enquanto Josefa da cozinha elogiava a Maria Mandala, eu via a condição de trabalho dela e a forma como a famosa diretora geria as coisas por ali. Josefa um dia disse para mim: “Plínio, meu filho, você sabe né; ela tem esse jeito rude, ignorante, mas, é boa pessoa”. Percebi, então que a primeira motivação que inspirava as pessoas era o medo. Os funcionários temiam a Mandala porque ela havia prejudicado alguns colegas no passado, assim, eles tinham certeza que ela podia fazer novamente. Já a segunda motivação era o benefício que Mandala dava a uns em detrimento dos outros. “Mandala num gosta que a gente coma a merenda”. No entanto, alguns colegas eu via com a boca cheia de pão e outras merendas. “É, parece que nossa diretora trabalha com dois pesos e duas medidas!” Foi o que Jerônimo disse montado em uma moto velha. Jerônimo era o funcionário de máxima confiança de Maria Mandala, porém, ele não perdia a chance de dizer suas coisas sobre a diretora. - Maria Mandala vai acabar com essa folia nos fundos da escola. Vocês vão ver! - Jerônimo, onde estão as garrafas de água que você deixou nos freezers semana passada? Jerônimo ligou a moto enchendo a área inteira de monóxido de carbono. - A jararaca mandou tirar tudo! Jerônimo falou mais com os olhos de que a boca. Sua expressão facial foi a de alguém muito decepcionado com Mandala. A Escola Freitas de Matos passou quase vinte e cinco anos nas mãos de Maria Mandala. Quando eu cheguei, ela estava saindo, contudo, o povo dizia, Mandala vive saindo. Mas, o pouco tempo que eu fiquei, eu aprendi que tudo que precisava era ser eu mesmo. De nada precisei de Mandala e se precisasse ela não me ajudaria. Cinco meses passaram e eu via que tudo que fosse para me atrapalhar Mandala fazia. Não sei o porquê, mas, Mandala se tornou em meu inimigo número um. Na minha presença, uma máscara cobria o seu rosto, contudo, seus planos para mim eram maus. A mulher via na minha pessoa a imagem do diabo. - Josefa, num gosto desse novato! Você viu que ele defende gays, maconheiros, macumbeiros e todo tipo de desgraçado social? Meu pai sempre me ensinou, “quem se junta com porcos farelos come”. - Num é mulher! E eu estou sabendo por boca de terceiros que ele já foi casado e é separado da mulher. - Bem que eu sentia um pressentimento; minha intuição não falha. Esse homem é um tarado, eu vejo como ele me olha! Mandala se ajeita no vestido um tanto folgado na cintura. Agora para Maria Mandala o novo funcionário era a encarnação de toda maldade, e um péssimo exemplo para a escola. Mandala e seu grupo resolveram tornar minha humilde estada naquele estabelecimento em um verdadeiro inferno e assim foi... Com o passar do tempo fui me acostumando com toda sorte de ofensa. Um dia, ela me pôs para digitar umas coisas no computador faltando alguns minutos para encerrar a aula. Isso me fez passar por um constrangimento muito grande perante os professores que queriam ir embora. Outra vez, ela me chamou para ficar encarregado do portão. - Sabe, estamos precisando muito de gente na porta. Vou lhe colocar na porta então. - Mas, meu trabalho é na secretaria cuidando dos documentos. - Mas, aqui quem manda é eu; você vai para a porta! Minha humilde pessoa foi para o portão até que a diretora foi abordada por um ex-aluno de uma escola onde dei umas aulas. - É verdade que o professor agora é porteiro? Foi você que desviou sua função? Parece que isso a fez lembrar-se de um passado não muito fácil. As pessoas que trabalhavam em outras escolas da mesma rede estavam acostumadas com um pequeno recesso em julho, mas, ela não deu nada no Freitas. Somente algumas pessoas tinha acesso ao descanso nessa época. As pessoas da cozinha achavam isso muito ruim, no entanto, não ousavam abrir a boca contra a diretora. Para todos os efeitos tudo que Mandala quisesse seria acolhido pelo grupo, assim, minha situação se tornava ainda pior – todo o staff ficou contra a mina humilde pessoa. - Esse cara é louco, você não percebe que ele tem problemas mentais? - A coordenadora Zelma Hercules me disse que ele devia tirar licença para se tratar. - Mas, se tratar de que? - Num sei! Apesar das dúvidas e opiniões diversas, as pessoas que andavam na escola não entendiam o jeito do rapaz e o julgavam pelo que viam. Faziam isso por pura maldade, ou habito social. Parece que o povo de Campos se compraz em destruir a imagem dos outros. Como sofri por causa disso! A escola Freitas de Matos era uma escola que abria o dia letivo fazendo três preces: Uma para o Pai (Pai Nosso), outra para a Mãe (Virgem Maria), e depois fazia uma média com o anjo da guarda. As crianças oravam mecanicamente; a maioria delas nem se quer sabem o que é isso “Pai Nosso que está nos céus”. Na verdade eles veem o inferno terrestre com seus pais desempregados, e uma sociedade com a renda concentrada que torna suas pequenas vidas, pequenos grandes hades aqui na terra – a terra de Campos do Rio Real. Enquanto Mandala me torturava diariamente, minha humilde pessoa se dedicava ao trabalho da escola e ao estudo. Fiz cursos, me formei, andei para frente. Mas, mesmo assim, para o povo do Freitas, minha pessoa não era digna de nada, uma vez que eu olhava o mundo com alteridade. - Professor, meu pai me dizia: “Quem usa tatuagem é bandido”. A colega de trabalho disse isso por causa de minha pequena tatuagem no braço esquerdo. Sempre gostei de karatê, por isso mandei desenhar na minha pele o dragão do filme de Bruce Lee. - Não é bem assim não. Veja, tem tanta gente importante no mundo que usa tatuagem e são pessoas honestas, direitas. Isso é muito relativo. Não é o gosto estético que diz das pessoas, mas, seus verdadeiros valores morais. Ao ouvir minha última frase, a mulher frangiu as sobrancelhas e se retirou com pretexto de ir atender um aluno que chegara. Perto do dia da consciência negra, a coordenadora, dona Zelma Hercules me abordou para saber se minha humilde pessoa tinha material sobre a cultura afro. “Nós somos uma escola aberta para o mundo”. Eu, educadamente, a respondi dizendo: “Falar do afro sem ler Nina Rodrigues, ou, o famoso Reginaldo Prandi é dizer besteira”. Parece que ela não gostou muito da ultima parte, ‘dizer besteira’. A festa da consciência negra foi totalmente sem consciência, e reforçou ainda mais a imagem do negro como um ser submisso ao branco, um ser orbitante de uma raça superior. Havia dois Pais de Santos convidados especialmente para o evento – Parece que o povo pensa que o negro só produziu religião, capoeira e acarajé, parece até que o negro quando morava na África não tinha vida, passou a viver, então, no Brasil. Os Pais de Santos foram apresentados, depois, eles fizeram uma exibição de músicas sacras do Candomblé, o que foi muito bonito por sinal. Os professores não se interessaram, e nem se quer eles se aproximaram dos sacerdotes religiosos para lhes fazer algumas perguntas, o que seria perfeitamente normal. Minha humilde pessoa foi fazer as venhas aos irmãos, filhos de nosso Pai Oxalá. - Muito bonita sua apresentação. - Ah, eu adoro o Candomblé. Fui feito na casa de mãe menininha aqui na Bahia. - Eu sou Calvinista, mas, admiro muito a luta de vocês. - Que luta? - Essa por espaço social, por identidade? - Ah, professor, Nós somos periféricos desde os tempos da senzala. - O amigo fala da senzala como se ela não existisse mais. Disse isso para ele um tanto surpreso com sua alienação. E aí continuei... - Quem vai ao seu Ilê Axé de quatro em quatro anos, não são aqueles que podem mudar essa realidade? - Sim, sabemos, mas, eles só querem voto e pronto, ou, uma ajudinha do santo. Finalmente percebi que nosso babá não tinha ferramentas para cavar as camadas ideológicas que escondem a verdade do homem comum. Contudo tive uma curiosidade e perguntei: - O Babá estudou onde? Onde fez o fundamental? - No Freitas de Matos. Aqui mesmo, por isso fui convidado. Eu amo essa escola, ela dá chance para todos. Adoro a nossa diretora Maria Mandala, nunca me esqueci de sua dedicação a moral e aos valores maiores da Vila de Campos. O sintagma, ‘dedicação a moral’, me levou a Nietzsche e sua filosofia corrosiva: “A moral é a obediência cega aos costumes”. Pensei, é claro, que o filósofo não estava negando a necessidade de um código, ele estava nos chamando atenção para a relação cultura - moral, e que esta última devia ser resultado de uma abordagem a posteriore da realidade, ou seja, a moral deveria ser inspirada pela razão e não pelos mitos culturais. Despedi-me do irmão sacerdote e fui para minha sala pensar minha humilde vida. Enquanto isso, os grupos se formavam pelos apertados corredores do Freitas de Matos. As pessoas queriam saber o que o professor tinha conversado com os macumbeiros. O tempo passou, e passou muito rápido. Pensei que Mandala se aposentaria em dez anos. Quinze longos anos se passaram, e a mulher estava sentada naquela cadeira vermelha de rodinhas pretas. Um dia pensei: “Muda a política e ela fica no mesmo lugar”. “Essa mulher deve ter parte com o cão”. Pensei novamente. Encomendei um ebó para Exu na intenção dela; eu não acreditava muito nessas coisas, mas, no sufoco tudo é válido. O ebó foi arriado, e nada da coisa ruim sair da frente. Um dia de sábado, pela manhã, eu estava na escola pagando um dia que precisei faltar. Eu estava sozinho digitando umas coisas quando o portão abre e Mandala aparece na sua sala que ficava a uns vinte metros da minha. Ela usava uma camisa branca de algodão, sem nada por baixo. Um short jeans azul claro, muito apertado por sinal, pois, me chamavam a atenção para suas pernas e cintura, que eram bem interessantes. O perfume que Mandala usava encheu minha sala e me fez ver quem havia chegado. - Ah, é você? Bom dia! Dei bom dia por educação. - Bom dia Plínio! Pouca foram as vezes que ela me chamou pelo nome. Então fiquei com as antenas em pé. - Eu quero que você passe as notas da quinta série para o mapa. Disse ela com um tom calmo. Aquele tom calmo sempre me irritava porque depois dele viria alguma ironia. - Certo vou providenciar. Quando saia da sala ouvi novamente sua voz dirigida a mim. Ela estava calma, e continuava assim. - Tome a caderneta! Aproximei-me novamente e peguei a caderneta de sua mão. Isso me fez olhar em seus olhos e ver que ela estava sem sutiã. A forma arredondada de seus seis rosados me deram água na boca. Eu nunca havia visto aquilo – Mandala era uma mulher muito apetitosa. A imagem da tirana, por um instante, saiu de minha humilde mente dando lugar à imagem da mulher sensual, pronta a copular. Tirei esses pensamentos da cabeça e retornei a minha sala e nela fiquei quieto pedindo a Deus que fizesse aquela mulher ir embora. Ouvi a porta de sua sala bater. Pensei – “Ela já foi. Graças a Deus!” Depois ouvi o portão trincar o cadeado. Isso me foi um alívio. Finalmente, estou só novamente. Folgo o cinto das calças e retomo as minhas atividades. Alguns segundos depois; vejo que a fragrância do perfume da moça continuava no local, agora, estava mais forte até. Deixei meu computador sobre o birô e fui em busca da fonte daquele cheiro – o que ela fazia ali? Ao chegar à porta de minha sala fui interrompido bruscamente. Mandala estava a me esperar. Seus olhos fitos em mim irradiavam uma vibração que ora parecia tesão, ora parecia ódio. Ela me empurrou para dentro de minha sala e trancou a porta. Nós dois estávamos completamente sós na Escola Estadual Freitas de Matos. - Venha safado, venha devorar a mamãe! Enquanto sua boca se ocupava com as palavras, suas mãos despiam seu corpo rosado com pintas de sarna espalhadas por toda a epiderme. Pensei eu comigo mesmo no silencio de minha máscara social: “Que diretora gostosa!” A fera continuou seu ritual copular, minhas calças estavam no chão. Eu estava alterado e a mulher olhava o falo com muito gosto; as gotículas de água caíam naturalmente de sua boca enfeitada com uma dentadura de primeira que deve custado uns quatrocentos reais. - Venha seu pervertido, venha me devorar! Nessa altura, a mulher estava despida sobre meu birô com minhas nádegas presas por suas unhas bem cuidadas e pintadas de vinho. - Estou queimando por sua causa. O diabo anda com você, desde o primeiro dia, eu sabia que você era uma tentação para escola, seu safado! Venha me comer pervertido! Devo confessar que não resistir a pulsação forte na minha glande que parecia que meu membro ia derramar seu néctar de forma muito prematura. O mesmo penetrou no seu canal sentido suas entranhas e causando-lhe indizíveis prazeres. A mulher gemia e suava, dizia palavras obscenas o tempo inteiro; isso me fazia ainda mais rijo e sedento. Nossos corpos se fundiram por muitos minutos num movimento copular que nem o vento podia atravessar. Parecia que estávamos um dentro do outro. - Coma-me safado! Quando ela dizia isso a pulsação fálica aumentava ainda mais, e eu me renovava para mais uma aventura. Deixei a mulher sonolenta sobre o birô e fui ao banheiro me lavar. Quando voltei, ela havia saído. O barulho do cadeado a denunciou para mim. Voltei ao meu serviço e vi que o computador havia gravado tudo. “Mandala estava em minhas mãos!” O tempo passou. Percebi que mandaram trocar o computador de minha sala. Pensei novamente: “Povo maldoso, acha que vou usar o filme contra a mulher”. Realmente, seria o fim de sua carreira, mas, esse jovem filho de Tobias não tinha esse coração. Ficou em minha mente todo aquele momento mágico; eu estava só, precisava daquilo, por alguns instantes senti minha vida de volta; agora, Mandala podia continuar em paz. A confraternização de fim de ano veio logo. O ano tem passado muito rápido. Estamos perdendo a noção de tempo. Eu adoro enroladinhos. Lembro-me que havia muitos deles na Escola naquela festa de fim de ano. Comi, bebi, e depois fui para a minha vida solitária. Em casa senti calafrios a noite toda. Uma vontade forte de vômito me acompanhou o dia seguinte todo. Decidi ir ao hospital, mas, era tarde demais... - Mulher, sabe quem morreu? - Num foi Plínio, aquele doido que trabalhava no Freitas. - Rapaz, dizem que ele se matou! Foi chumbinho que ele tomou. Como foi uma dose muito pequena, morreu aos poucos. - Desde o começo eu sabia que ele era doido. Só podia dar nisso. O pior uma pessoa como essa passou pela nossa escola. É o que dá concurso público! Antigamente, os políticos colocavam gente de bem para trabalhar na coisa pública! Era muito melhor! - É verdade mulher. Mas, coitado, num é? - É sim; era um “siscero umano!” - Isso mermo...

quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Reis e Peões na Praia Formosa


O atual metro quadrado mais caro da cidade quadrada é encontrado na Avenida Beira-Mar, cara-a-cara com a antiga Praia Formosa. Se esta praia ainda hodiernamente fosse assim nomeada, estaríamos, com efeito, diante de uma das mais colossais ironias linguístico-urbanas.

Havia lá, quando ainda Formosa, uma pobre comunidade de pescadores.  A expulsão de tais peões ocorreu na medida em que os reis precisavam de exclusividade na tomada daqueles ares praieiros. Seus meninos casarões hoje são senhores prédios, de postura tesa, quase militar, a despeito de seus adornos - de uma sensibilidade arquitetônica quase lúdica.

Os reis foram, no entanto - e é bom que se registre - compassivos com a situação dos desapropriados, e por isto hoje qualquer peão pode caminhar por um belíssimo calçadão que se estira preguiçosamente por toda a extensão da avenida. Está tudo ali, para ser apreciado com a única moderação de que se volte docilmente à zona norte após o passeio.

É quase como sentir a doce e colorida violência das vitrines – observar do outro lado da avenida os edifícios que roubam a colarinho branco a livre ventilação de boa parte da cidade. Mas eles são belos – é verdade! São joias na coroa dos homens que fizeram por merecer – este é um slogan recorrente nos panfletos que propagandeiam os novos grandes investimentos: para morar ou investir – sobretudo este último -, visite o novo Eldorado da especulação imobiliária!

O calçadão foi tão exatamente criado para os que ali não se instalam com ânimo definitivo, que com algum mínimo grau de inquisição se percebe que sua utilidade publicitária – praticar exercícios, buscar os ideais de bem-estar do novo século – pode ser alcançada nos limites dos próprios prédios em que vivem seus habitantes. São dotados de academias e piscinas particulares, espaços coletivos e congêneres.

E na verdade, o mangue que agora verdeja o passeio pelo calçadão esconde o despejo forte e organicamente aromatizado do esgoto. Sua fauna é composta sobretudo por animais de  alta estatura simbólica, como os ratos. Todos saindo em saques noturnos ao sono dos donos do poder.  Poder-se-iam tecer os mais fortes escândalos alegóricos, se se tivesse em vista o fato de que a cidade enriquece em direção a este calçadão. Não demoraria muito até que algum aventureiro voltairiano desferisse: em Aracaju, o caminho da riqueza é no sentido do esgoto.