Em uma terça nublada de outubro, Davi volta da escola para sua casa. Cansado, ele almoça com sua mãe. Ela estava preocupada com o marido alcoólatra que estava muito doente e prestes a perder o emprego, pois, o chefe da repartição pública havia ameaçado de despedi-lo caso ele não largasse o vício. Há poucos dias havia terminado o contrato do Davi com uma empresa de comunicações e ele estava à procura de um trabalho que desse para segurar a barra. A mãe do Adolescente preocupada com sua feição pergunta:
-Você está com algum problema meu filho?
-Sim mãe, eu não estou muito bem no colégio, quero me concentrar nos estudos como deveria e conseguir um emprego que dê para segurar os problemas financeiros de casa. Esses problemas e mais um pouco andam tirando a minha atenção das coisas que estão ao meu alcance.
-Está certo meu filho, espero muito que você consiga.
Depois de tomar seu banho, o rapaz passa alguns minutos em frente ao computador. Abre o email e pergunta ao seu amigo Rafael o que ele estava fazendo naquele instante, o mesmo não responde. Então, Davi decide abrir sua gramática e durante a segunda pagina de análise sintática um sono cai instantaneamente sobre ele. Resolve dormir alguns minutos, são 3 da tarde. O sono e o medo simultâneos não deixam ele conseguir dormir nem levantar-se para continuar seus afazeres, o café não resolveu o problema. Exatamente às 16hs ele dorme profundamente e poucos minutos depois, acorda em um lugar estranho:
-Que lugar é esse? Porque eu vim parar aqui?
Seu amigo Rafael aparece e lhe responde a pergunta
-Te achei próximo à escola, você estava andando de pijama com sua guitarra nas costas. Te trouxe até aqui para descansar um tempo, não sei como conseguiu andar dormindo da sua casa para cá, mas está tudo bem, você pode pegar uma roupa minha emprestada caso queira.
Davi confuso e sonolento levanta-se e observa que a casa estava cheia de visitas. Avista na sala, um amigo do antigo colégio onde estudava, o amigo se chama Alex, que tinha lhe ensinado os primeiros acordes, estava também Lucia, ex-namorada do Rafael e alguns colegas de sua sala. Eles passavam alguns dias por lá. Após Davi falar com todo o pessoal, distraiu-se um tempinho tocando algumas musicas com o Alex, já que não o tinha visto há tanto tempo.
Três pessoas saíram da casa por alguns instantes, Alex, o Rafael e a Lucia saíram minutos antes. Davi não havia percebido a saída, pois estava concentrado no novo equipamento que o amigo tinha mostrado. Então olha para o seu relógio e são exatamente 17h, o apetite já soara em seu estômago.
Dani, colega de sala do Rafael havia preparado um banquete, Davi não sabia nem por onde começar. Após o término da refeição ele encontra o Rafael em frente a casa com Lucia.
- Jantou Davi?
- Sim Lucia, aproveite enquanto está quente na mesa. Dani é fantástica, prepara pratos deliciosos mesmo.
- Está certo, vou lá conferir então.
Lucia sorri e entra. Rafael convida Davi para ir a venda que ficava algumas quadras dali, para comprar alguns alimentos e materiais de limpeza. Já que ele estava com visitas, teria que repor os utensílios necessários. Davi olha para o relógio e percebe que já são quase 18 horas. Enquanto isso, Rafael fala durante o caminho.
-Velho, fiz uma loucura quando saí com a Lucia. Transei com ela na escada do prédio em construção da escola. Jurei que não ficaria mais com ela, mas acabou acontecendo. Está tudo bem, não vai ocorrer nenhum problema por causa disso.
-Pois é meu caro amigo, nem tudo acontece da forma que planejamos.
Enquanto isso, eles andam por uma rua meio calçada com muita terra, existe um fábrica de móveis. Em poucos instantes, essa fábrica lança uma água sobre a rua deixando-a encharcada de lama, obrigando os dois garotos a andarem pela calçada. Através do portão aberto, eles enxergam vários funcionários lavando o galpão. Davi sente um incômodo após a água ter molhado seus pés. Olhando para o relógio, vê que são exatamente 18h e 30. É noite, de repente viu tudo escurecer. Assim, o garoto encontra-se na cama, enxergando uma luz fraca vinda da sala através da porta do seu quarto escuro. Levanta-se ainda um pouco embriagado do sono e pensa o que teria acontecido possivelmente nas ultimas horas.
-Merda! Foi um sonho? Como posso ter certeza que é o meu quarto realmente? Dormir pelo dia e acordar à noite não é nada comum.
Indo ao computador, Davi lê o Email respondido pelo Rafael, enviado às 18h e 30:
-Amigo, dormi durante à tarde. Acabei de me levantar e li a sua mensagem agora.
http://serousoulivre.blogspot.com/
Para uma pessoa que está se iniciando no exercício do contar, ficou acima da média. Parabéns, Miguel! Não pare de escrever. abraço
ResponderExcluirJoão Paulo dos Santos
Miguel,
ResponderExcluirCaraaaaaaalho!!! Este texto foi fodíssimo man!! Lendo-o, apareceram-me algumas questões: será que de fato, o que eu sou, reflete-se na realidade? Mas no final das contas, o que é realidade? O fato de Davi e Rafael terem dormido a tarde, significa dizer alguma coisa? Terá sido uma coincidência o sonho de Davi? Existem lógicas claras para as coisas? Até que limite eu posso definir as fronteiras que estabelecem os territórios para isso que eu chamo de real e de sonho?
Agora, ja que você me perturbou com meio mundo de questões rsrs, eu deixo uma pergunta para você e para os demais leitores:levando-se em conta que o sonho de Davi implicou uma série de relações sociais, assim como vários contextos, eu posso considerar essa ação surreal importante para um dado histórico da humanidade? Pergunto isso pois se considerarmos a história como apenas algo que retrata uma "realidade" assim como insiste a historiografia tradicional, será que essa coincidência não foi tão real e tão contextual quanto qualquer outra ocasião?
Enfim, parece uma pergunta deslocada do texto, mas é por que eu acredito que a produção do conhecimento implica uma ramificação de associações livres as quais terminam por trazer outras novas problemáticas.
Abraços
Perguntas defíceis meu caro Vina...
ResponderExcluirRealidade, concreto e abstração se misturam na forma de ver mundo. Tentamos mapear, como a ciencia, um mundo de idéias que entram em constante choque e mudanças. Acredito que o sonho faz parte da realidade, assim como fatos surreais como esse, são passiveis de acontecer como qualquer outro fato mais "legível" por ser "concreto", lembrando que o concreto pode ser "arbitrário" ao se tornar liguagem tbm.
Acredito que sim Vina, poderia ser um documento individual, social como qualquer outro que contribuisse para o conhecimento...