segunda-feira, 4 de julho de 2011

Efeitos da Ditadura

Chovia granizo. Demorei uns 15 minutos para me levantar, pois a temperatura do meu quarto continuava fria. Assim que tomei coragem, levantei o meu corpo pesado e pus meus pes envelhecidos no assoalho de madeira. Caminhei com dificuldade, dei dois passos e fui ao encontro da janela. O sol nascia timidamente, depois de um pequeno temporal. Os seus raios invadiam o meu rosto, proporcionando um engilhamento descontinuo na minha face.
Olhei para os lados e percebi que havia um retrato embaixo do meu velho radinho de pilha. Nao quis me recordar de nenhuma lembranca, desde o ano de 1964. Nao sei por que tive medo de nao saber quem estava ocupando todo o espaco da fotografia. Sei que eram duas pessoas, pois percebi que um pedaco da foto me mostravam 4 pes que pareciam bastante descontraidos.
Sentindo um pouco de dificuldade, fui ate a pia do meu banheiro, abri a torneira, ainda gotejante e preenchi o copo de agua o qual custumo usar para lavar os dentes. Retornei a ir na janela para regar os dois girassois murchos, apaticos quanto os energizantes raios solares. Sem notar, empurrei o copo de vidro e ele caiu da janela se despedacando em mil na terra molhada. Penso que os caquinhos de vidro demorarao para se degenerar e diferentemente das sementes, eles nao brotaram nem sequer um botao.
Sentei na cama, depois que liguei a televisao. Passava o jornal das 7, discutindo sobre o resgate da memoria brasileira sobre os efeitos escabrosos da ditadura.
Ainda nao me recordo muito bem o que aconteceu nessa epoca.
De repente, a televisao perdeu sua nitidez e as imagens tornaram a ficar um pouco discontinua. Naquela TV velha, era sorte minha em ter que assitir um programa por inteiro.
Apesar do tempo ensolarado, um vento frio invadiu as cortinas e derrubou o meu radio, levando a antiga foto para algum canto. E eu continuei sentado, quando ouvi alguem batendo suavemente na minha porta. Para me levantar, preferi ter comigo a minha bengala a qual estava ao lado da cama.
Abri a porta e vi um rosto nao tao envelhecido, sorrindo simpaticamente para mim. Continuei calado, mesmo depois daquele "Bom Dia".

3 comentários:

  1. Maíra,

    Enfim, muda-se a cronologia do tempo, as coisas aparentemente mudam de contextos, lutamos para vivermos esse novo tempo e deixarmos o passado cheio de escombros, mas de nada vale a gentileza e a revitalização sorridente do contexto atual que nos bate a porta, afinal, o tempo, apesar de outro, é resultado dos emaranhados do ontem que se faz tão presente em nossas vidas, em nossas culpas. Podem aparecer sorrisos, podemos criar situações de deixar as fotos que nos remetem a um tempo irem com o vento, mas a memória... essa se mantém fincada em nossa alma.

    Formidável


    bjs

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  2. formidavel sua interpretacao. Uma percepcao muito sensivel quanto as intencoes que quis expressar. Quando tentamos produzir um texto de teor literario, deixamos nas entrelinhas algumas intencoes, mas sempre aberta as diversas interpretacoes, mas a sua fui muito proxima as minhas palavras.

    um bjao

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  3. Mai

    De fato, seu texto foi de uma poética fantástica! Foi de uma inspiração absurda. Parabéns!

    bjs

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