domingo, 3 de janeiro de 2010

Um parágrafo sobre Deus

Sob os olhares de todos os santos, o texto é oferecido ao exímio Sr. Roosevelt. Se assim não fosse, ele não teria vindo à tona e, se viesse, eu mesmo o denegaria. Pois não seria, como agora, um texto, mas uma idéia fugidia, uma possibilidade futura de pensamento, ou ainda uma atrofia racional motivada por idéias mais elegíacas. Então aí segue o texto desse "doutor em nada e pensador radical":

O hoje é um retrato de ontem, e o que há de diferente entre os dias que se seguem é a variabilidade de posições das imagens que constantemente vimos. Ser estrangeiro, ao mesmo tempo que nos chafurda na idéia de que se haverá por isso o estranhamento, é um processo de recomposição dos signos que ao longo de nossas vidas acumulamos e de contextualização destes com aquilo que se há de supostamente novo. E isso, assim como a idéia da essência numérica levantada por Agostinho, atesta a existência de uma divindade, de uma força superior que, mesmo sem que boa parte da humanidade perceba, concatena a tudo aquilo que faz do mundo um lugar diversificado, onde todos possuem desejos diferentes por tanto desejarem a mesma coisa e, por terem um desejo essencial em comum, acabam se diversificando entre si. Ao mesmo tempo em que essa concatenação enxerta na realidade a possibilidade metafísica da existência de uma força motriz, que perpetua através de uma infinidade de processos a complexidade da vida, só sendo possível a sua concretização por meio do abstrato, ao mesmo tempo também tal idéia se verte numa idealização redutível e acaba, por força circunstancial, se anulando e se transformando em nada. Uma vez que por meio do abstrato se chega a Deus, a existência na qual somos inseridos por um processo de indução do acaso, tendo de escoar toda uma história para que nasçamos e tão logo morramos, é literalmente absurda. O abstrato nos reconforta por sabermos que um ente que mantém relações com outros e exerce funções biológicas não é fruto de um mero aglutinamento de reações e processos descritos pela ciência, mas a complexidade que é descrita pela ciência dentro de outra complexidade aquém da ciência, já que esta, com toda a sua empiria, esbarra em questões fundamentais sobre o nosso princípio vital. Sendo assim, podemos alegar que, dentro do plano metafísico, somos fruto de algo maior e que pode ser concretizado se conseguirmos, por meio da consciência, chegar até ele. Por outro lado, porém, e onde se encontra o âmago do problema, temos um emaranhado de costumes que promovem a padronização da linguagem. A linguagem, da qual falo, não diz respeito somente aos signos verbais que se firmam dentro de uma sintaxe, garantindo o fenômeno da comunicação, mas também ao que está embutido dentro dessa comunicação e que norteará a fomentação da nossa parole(exercício individual da linguagem ou conotação ou idiossincrasia lingüística ou estética individual de linguagem), que nada mais é senão a nossa conduta. Quando chegamos à questão da conduta é que encontramos o nada e, logo, a nulidade da própria existência de Deus através do método acima tratado, pois nos perderemos, por estarmos presos a falta de garantia do que vem depois da vida, tentando descobrir como se viver melhor, e esse é o ponto que temos em comum, além da própria certeza de que todos nós morreremos. Sabemos que vivemos numa realidade complexa, e que essa é a certeza mais palpável que temos sobre a existência de Deus, mas também sabemos que a morte está num plano que não nos é permitido, por sermos um corpo fisiológico e totalmente mensurável dentro de um mundo que possui fenômenos que estão além da nossa capacidade racional e que embaralha a nossa consciência. Portanto, se dentro do plano metafísico eu posso chegar à certeza de que o social são convenções que se ordenam complexamente através de processos internos e fantasmagóricos, a falta de garantia a respeito da seguridade de tudo que fazemos e construímos durante a vida reduz a complexidade da ordenação que Deus deu ao mundo a mero joguete vegetativo. Daí, creio, é de onde nasce a afirmativa de Heidegger “Somos seres para a morte”. Ou seja, mesmo que cheguemos a uma opinião polidamente fundamentada sobre Deus e a sua criação, essa fundamentação continuará limitada justamente por não termos a consciência voltada somente para o agora, e não sermos seres para a eternidade, ou melhor, para a vida, e sim seres que nascem com a certeza do fim. Visto isso, podemos alegar que Deus existe; mas o Deus que pode ser mensurado pela consciência e que não nos fala sobre a morte; que prolonga a complexidade dos processos vitais até os nossos últimos minutos e, com isso, põe em teste a nossa credulidade na essência dessa complexidade toda. E, por isso, alguns morrem fervorosos e outros frustrados. Pois alguns acreditam que o complexo é o que infinita as nossas vidas e outros, porém, o que as reduz a um apanhado de limitações.

2 comentários:

  1. Ao meu ver, seu texto mais claro, coeso e torto até aqui. Parabéns!

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  2. A partir desse texto, percebemos o quanto somos seres Macro-minúsculos de nós mesmos.
    Se por um lado, acreditamos ser capazes de irmos além do óbvio e de atingirmos a esfera mais infinita possivel, nos sentindo gigantes de nós mesmos; por outro lado percebemos o quanto essa nossa crença de que podemos ir além de qualquer coisa, não passa de uma mera ilusão. A partir disso nos sentimos tão pequenos quanto qualquer átomo.
    Dentro da nossa possibilidade grandiosa, somos limitados. Enfim: conquistamos o que nunca ganhamos, e perdemos o que sempre andamos a conquistar. Esse fluxo muito bem exposto por você, nos faz averiguar de forma clara, o nosso lado torto de ser.
    Muuuuito bom esse seu texto

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