quinta-feira, 29 de março de 2012

EDUCAÇÃO DA ALMA

EDUCAÇÃO DA ALMA

O discurso educacionista tenta passar para sociedade que a educação é meio de mudanças sociais. Parece que colocaram nela uma essência quase que messiânica – uma vez em contato com ela – o homem está transformado. A educação vista por alguns estudiosos está bem longe desse mito.

Ao contrário do pregado pela escola sofista, Sócrates entendia a educação como um processo de parto, algo comparado ao nascer de um infante – um ser que ainda está muito longe de ser perfeito. No entanto, entre contrações e dores, uma nova criatura vinha para um mundo pronto, acabado, socialmente construído pelos seus antepassados. Esse homem socrático está muito distante do sofista, pois, ele não se apega as imagens projetadas pelos discursos ideológicos de seu tempo. Ele é um homem Freireano, um homem maiêutico – dialogista por excelência.

O homem sofista acredita no poder das estruturas e a elas se consagrada de todo o coração. Ele consegue ver que o embaralhar dos semas é o poder que justifica o estar no poder. Tudo gira em torno desse poder. A educação sofista é bancada pelo estado que promove as políticas de exclusão social e engrossamento da renda dos mais privilegiados. O educador sofista trabalha para essas pessoas quer tenha ciência disso ou não. É ele quem reproduz o discurso de apatia e aceitação passiva da exploração do outro pelo outro. Em termos de Brasil, a exploração virou cultural, portanto normal, todos nós de uma forma ou de outra fazemos isso.

Na escola maiêutica a educação ocorre na relação sujeito/mundo e sujeito/sujeito. Ela surge num sujeito que leu o mundo por meio de várias leituras possíveis – ninguém deve tomar o ato de ler como um ato ingênuo – ler é um ato político – mas esse ler político só nos é possível se ele nasce de uma leitura minha, do encontro do sujeito com seu mundo – o seu microcosmos.

Em um segundo momento, esse sujeito que leu seu mundo, ler o macro mundo, onde estão os mais diversos tipos de discursos, e consegue inferir, por conta própria, que ele é o agente e o objeto da opressão. É uma descoberta sensacional! Sabermos que por meio da educação podemos descobrir que um dos nossos maiores inimigos é a educação.

O tempo que vivi em sala de aula e nos corredores das escolas brasileiras e até estrangeiras me deu uma pequena experiência que me habilita a dizer sem receio de estar errado: “A escola, esteja onde estiver, fale a língua que for, pouco compromisso tem com a educação dialógica”. O compromisso da escola é com a reprodução e repasse dos modelos sociais e dos paradigmas consagrados pelas ciências. Se isso fosse mentira, nossa razão já teria percebido que ela precisa urgentemente romper com conceitos epistemológicos que não mais se validam na humanidade pós-moderna. A fragmentação do objeto, o isolá-lo sobre o pretexto de facilitar o raciocínio torna nossa ciência uma metafísica sem Deus. A escola é o retrato vivo do que escrevo. As disciplinas são estudadas separadamente sem nenhum elo nodal entre elas, e sem a menor possibilidade de um diálogo entre as partes porque a escola é desenhada para isso. Cada cadeira um mundo cada mundo uma ilha cada ilha um coronel. A escola não pensa educação, o professor não pensa a educação e o aluno, na maioria dos casos, nunca saberá o que realmente aconteceu naquela escola.

A educação dialógica entende que não devem existir modelos, mas, possibilidades de diálogos entre os homens e suas ciências. A escola dialógica deseja interdisciplinarizar os conteúdos e ver que os pés têm cabeça, e que a cabeça tem mãos – tudo está em relação a tudo. Toda estrutura se estrutura em uma estrutura anterior que lhe é estruturante. A educação dialógica acredita que nada é simples, tudo é complexo, e necessita do amparo de uma racionalidade que não seja recortada em fatias para microscópios. A educação dialogista entende que o microscópio e a fatia existem, mas, coexistem com um sujeito histórico cultural e, sobretudo espiritual.

Um comentário:

  1. Roosevelt,

    Apesar da transdisciplinaridade ser o caminho mais interessante para a educação, enquanto um sobrevivente em meio as experiências dos ambientes educacionais, vejo que o caminho é mais árduo do que parece.

    Existem dois grandes obstáculos que merecem ser refletidos. O primeiro diz respeito à cultura do contexto industrializado; e a outra ao individualismo.

    Vejamos: como você bem observou em seu texto, o micro e o macro estão entrelaçados, portanto, a educação é uma das infinitas esferas que compõem a sociedade. Quero dizer com isso que a organização dentro das insituições educacionais se refletem na forma como a sociedade se organiza e vice e versa.

    A cultura do contexto industrial é marcada pelo seu excesso de burocratização e de especialidades. Tudo se organiza de forma compartimentalizada, pois a organização a base dos compartimentos sugerem o grande objetivo que visa a sociedade industrializada que é a praticidade e os resultados imediatos.

    Assim se organiza as instituições educacionais. A cada profissional é delegada uma função e estar funções, antes de agirem de forma interdependentes, agem de forma esquematizada, sem qualquer vinculo uma com a outra. A ordem das coisas se faz apenas de forma mecanizada, e não de forma holística.

    Qual o resultado disso? Ora, a construção dos conteúdos programáticos é feita de cima para baixo. Isso termina por fazer com que as disciplinas, antes de serem articuladas uma as outras, terminam por se desarticularem.

    É como eu disse: é a velha articulação compartimentalizada do contexto industrial no qual o trabalhador é tão limitado a enxergar o todo que ele mesmo não tem uma visao mais abrangente da sua produção. Isso acontece nos ambientes educacionais. A direção faz uma coisa, a coordenação faz outras, o setor pedagógico outra, os docentes outra e os alunos outra. Enfim, tudo se articula desordenadamente.

    O outro ponto é o individualismo. Em uma sociedade industrial marcada por fortes exigências de produtividade, os docentes das diversas áreas, sequer possuem tempo em dialogar suas disciplinas com os demais. O professor de sociologia não sabe o que o professor de filosofia está trabalhando, não sabe quais são os conteúdos que estao sendo expostos pelo professor de biologia e por ai vai.

    Depois disso tudo eu pergunto: como a educação conseguirá atingir essa abrangência entre as diversas áreas do conhecimento se temos professores em seu excesso de produção que sequer têm tempo de saber o que o outro colega anda trabalhando para com isso articular sua disciplina com a outra disciplina? Como a educação atingirá a transdisciplinaridade em uma sociedade marcada pela excessiva divisão de função que, antes de gerar uma conciliação com o todo, termina gerando partes desagregadas compondo esse todo?

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