Neste texto falarei sobre o assunto abordado no CD “José Dinossauro High Tech” do projeto de extensão do IFAL “Constelações Musicais” que tem como objetivo agregar os artistas locais em sua produção. O projeto tem como bolsistas o aluno Raí (Agroecologia) e Matheus (Agroindústria) do Campus Piranhas, tendo minha pessoa como coordenadora.
A razão possui o lado humano do contemplar, do admirar. O fato de se ter razão, de maneira alguma exclui o humano do direito de vivenciar suas alegrias e suas tristezas, até por que a razão é também a capacidade de simbolizar as coisas, e cada coisa que simbolizamos, construímos valores para elas.
A razão também possui a capacidade de gerar constantemente formas de conhecimento. O que seria do acúmulo da ciência, da arte e das demais formas de criação, se não houvesse esse extraordinário dom da razão em produzir novas ferramentas, novas idéias acerca do mundo?
No entanto, a razão, além de humana e capaz de gerar formas de conhecimento e produções constantes, não anula nossos instintos. Enquanto pensa, o humano caga, trepa, mija, dorme, perpetua e preserva a espécie, assim como morre. O abuso da razão tem adoecido esses bichos vestidos.
Por acreditarem demais na razão, os humanos, além de terem se separado da natureza, visto que deixaram de se reconhecer também como bichos, uma vez que distinguiram seres racionais dos irracionais, passaram a se cobrar demais por levarem demasiadamente a sério essa razão, forçando uma conduta além da sua capacidade humana.
O problema disso tudo é que os instintos não desapareceram. Apesar de sermos racionais, todos nós carregamos a natureza. Além disso, o problema é que, cobrando uma perfeição exagerada da razão, esquecemos de contemplar as coisas, de refletirmos sobre nossa condição humana.
Antes de atingir a chamada razão, o humano era apenas bicho. O bicho vivia sua condição natural. Sofria as intempéries da natureza, mas não guardava consigo nenhuma forma de expectativa responsável pela doentia ansiedade provocada pela desregulada ânsia de um futuro.
Por se ver obrigado a assumir uma razão além de suas capacidades, o humano não só largou a condição puramente natural, como passou a se desgastar pela sua excessiva cobrança consigo mesmo. O humano passa a ter uma imensa capacidade racional, mas peca pela sua falta de humanização.
Por ser cobrado pela excessiva produção racional, o humano se morre a cada instante em seu próprio tempo. Por se tornar quase um robô devido ao excesso de lógicas e resultados cobrados, passou a virar quase uma máquina, deixando assim de sentir as coisas e de se enxergar como humano.
Diferente dos animais, o humano altera o tempo, mas assim como os animais, não reconhece o tempo, já que por se tornar quase máquina, deixa de se ver como humano. O pior de tudo é que ele necessita dos instintos, mas nega constantemente a sua condição natural; torna-se um excelente produtor, mas por não se enxergar, aliena-se.
É no meio desse emaranhado todo que se encontra José Dinossauro High Tech. Ao mesmo tempo em que é humano (José), ele é também bicho (Dinossauro), mas também uma máquina (High Tech). Na verdade o que existe é uma interligação complexa entre o lado humano, o instinto e a produção racional.
Por outro lado, José não se reconhece como animal por achar que tem razão, e por isso mesmo, não aceita o Dinossauro de si mesmo. Ao mesmo tempo José não se pensa como humano por ter virado uma máquina que não o permite refletir sobre si e sentir a vida de forma contemplativa.
José é o retrato mais fiel do humano na contemporaneidade. Um animal doente por acreditar em uma razão doente a qual termina por torná-lo um humano doente. Um bicho que quer gritar, um humano que quer admirar, mas que não grita, nem admira, vivendo submetido às tarefas racionais e desumanizantes.
Um ser cheio de culpas por não aceitar os deslizes provocados pelos seus inevitáveis instintos; um ser cheio de ansiedades por exigir os resultados de forma demasiada; um ser que não se admira, nem se conforta em sua condição humana capaz de contemplar, de admirar, por viver na amarga ilusão de um futuro.
José Dinossauro High Tech é um ser que apedreja um cachorro na rua por acreditar que ele não sente por que não é gente e não tem razão, mas que por ser robótico, consegue reproduzir os discursos cobrados pela sociedade e exige da humanidade um maior cuidado com a natureza.
José Dinossauro High Tech é um ser angustiado, incapaz de pensar sobre si mesmo, apesar de produzir inúmeros artigos científicos nos congressos da vida. Um ser atormentado que procura o divã e sequer consegue chorar, pois a sua condição de máquina cobra dele uma força calculada e anti-humana.
Ele se acha bastante à frente da natureza por acreditar que é humano e por ter razão, mas não percebe que a sua racionalidade o torna um ser capaz de ficar muito atrás dos animais, ou seja, daqueles que ele afirma como inferiores por serem “irracionais”, afinal, é uma cabeça pensante perdida de si mesma.
O galo na casa do seu vizinho canta todos os dias às 04:30 da matina. José às vezes só consegue dormir às 05:00 por estar atormentado com tantas cobranças para o futuro e por ter acabado o seu remédio para a ansiedade. Já, já se acordará, saberá qual o dia, mas ao dormir, assim como todas as noites, não perceberá o tempo.
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