terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

Carência torta

Ele andava cabisbaixo no que se referia a sua vida conjugal. Andava dizendo aos quatro cantos do mundo que estava vivendo uma maré baixa. Dizia em todas as rodas de amigos e em mesa de bar que não conseguia encontrar ninguém. Queixava-se da má sorte e dizia sofrer com a situação. Reclamava que não era compreendido pelas garotas, reclamava sobre os estilos de vida delas. Fazia questão de todo instante lembrar que o que ele mais queria era viver um relacionamento sério com alguém.

Segundo ele, era emergencial encontrar uma gata que estivesse predisposta a levar uma vida mais responsável, mais focada em seus objetivos profissionais, menos dada a porra-loquices. Por outro lado, dizia que, apesar de não mais se encontrar instigado com as fortes doses de boemias, ele também gostava de compartilhar idéias, gostava de participar de alguns ciclos sociais, e que por isso mesmo, queria alguém que também quisesse vez ou outra participar de eventos públicos e que gostasse de conhecer novas pessoas e de vez em quando abrir um espaço para algumas aloprações.

Certo dia quando estava se entretendo com os bate-papos virtuais, recebeu um “oi” de uma garota. Sempre ele a achou um pedaço de carne imperdível. No transcorrer da conversa, ele começou a sentir que o clima pairava para uma finalização esplêndida. De início achou que estava enganado, afinal, não seria a primeira vez que achava que um lance poderia rolar e que terminava saindo frustrado com suas expectativas. Porém, a conversa saiu do nível da ambigüidade do flerte para afirmações descaradas. A garota partiu para uma confissão clara e objetiva. Começou dizendo que tinha enormes interesses na pessoa dele, que bastava ele possibilitar uma brecha para que as coisas rolassem entre os dois.

Ao finalizar o papo, ele se levantou, andou por todos os compartimentos da casa refletindo sobre a confissão que havia ocorrido na internet. Como andava em um momento muito carente de sua vida, pensou na possibilidade de rolar uma história mais séria entre eles. Começou a selecionar certos pré-requisitos sobre ela. Lembrou que ela era uma pessoa que valeria a pena tentar algo mais firme, afinal, ele a achava muito inteligente, justa, responsável com seus projetos profissionais e trazia um ponto muito semelhante com a pessoa dele naquele momento que era uma predisposição em viver uma rotina mais ponderada, mais caseira, mais intima.

No outro dia ele resolveu tomar umas cervejas com uma amiga que nunca mais tinha visto. No transcorrer da conversa, por incrível que pareça ele começou a sentir que o papo também estava desembocando para um possível flerte. Pensou que seria algo quase impossível para quem andava solitário por tanto tempo. Porém, novamente sua intuição não estava equivocada. Logo se deu conta de que a garota passava uns olhares interessados, trazia seus discursos carregados de elogios sobre ele. A sua amiga terminou abrindo o jogo dizendo que ele era visto por ela como um homem ideal para os seus planos. Disse ainda que só não ficava com ele naquela noite pelo fato de estar envolvida com alguém, mas deixou claro que a intenção dela era terminar o seu relacionamento para viver uma história com ele.

Voltando para casa começou a pensar nas características daquela que, além de ser sua amiga, produzia nele intensos desejos sexuais. Começou a se lembrar das experiências vividas com ela e se deu conta de que, assim como a sua outra pretendente, a sua amiga trazia elementos valiosos, pois também era gatíssima, sem contar que era uma pessoa com um senso de comprometimento, de justiça e de fidelidade muito grande. Além de tudo isso, sempre soube reconhecer que a sua amiga possuía sentimentos muito valorizados por ele como graciosidades e outras meiguices a mais. O êxtase maior foi quando se recordou que ela, assim como ele, gostava de compartilhar experiências na vida pública.

Contudo, ao voltar seu pensamento para a garota que ele havia encontrado na internet, ele se lembrou que apesar de todas aquelas qualidades, ela possuía alguns pontos que mereciam ser reavaliados antes de buscar assumir uma postura mais séria. Relembrou que a garota, apesar de muito bonita e comprometida com seus projetos profissionais, era uma pessoa extremamente caseira e que não curtia vivenciar experiências socialmente. Começou a achar que seu relacionamento com ela no máximo se resumiria a tomar sorvete de morango e chocolate todo final de semana. Uma possibilidade horrível.

Ao pensar na sua amiga do bar, ele refletiu bastante acerca de uma relação mais séria, mas se recordou de alguns detalhes. Passou a se lembrar que a sua amiga, apesar de ser uma pessoa com a qual ele se identificava bastante em suas curtições noturnas, era uma garota que ainda se encontrava em um nível de intensidade bastante diferente do seu quando o assunto se tratava de foco profissional. Sabia o quanto valiosos eram os sentimentos dela, mas reconhecia que mesmo com todas essas qualidades, ela era uma porra-louca que gostava de entornar engradados e engradados de cervejas praticamente quase todos os dias. Outra possibilidade horrível.

Ao lembrar de todas as qualidades de ambas as garotas e de todos aqueles comportamentos que para ele não eram estimulantes para as suas motivações do momento, resolveu colocar todas as características em uma balança. Olhando prós e contras de todos os lados, olhando até que limite cada pró e cada contra poderia atingir sua vida e sua relação com elas de forma positiva e negativa, chegou a uma conclusão: não quis envolvimento sério com nenhuma das duas.

Semana passada eu me encontrei com um conhecido e perguntei se ele tinha noticias desse cara. Segundo ele, o cara andava cabisbaixo no que se referia a sua vida conjugal. Andava dizendo aos quatro cantos do mundo que estava vivendo uma maré baixa. Dizia em todas as rodas de amigos e em mesa de bar que não conseguia encontrar ninguém. Queixava-se da má sorte e dizia sofrer com a situação. Reclamava que não era compreendido pelas garotas, reclamava sobre os estilos de vida delas. Fazia questão de todo instante lembrar que o que ele mais queria era viver um relacionamento sério com alguém.

10 comentários:

  1. Massa! Melhor do que uma pomba na mão a duas voando é aprender a voar pra pegar aviões.

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  2. Acho, na verdade, que esse cara não experimentou a força da paixão ou o zelo e o carinho do amor. talvez ele nem goste de uma boa vagina. O que aprendi, e posso ter aprendido errado, é que quando gostamos, nos arriscamos. Essa tecnologia toda, toda essa ciência, reflete mais uma alma homo, que não se identificou ainda, e nem descobriu seu canto no mundo. É isso cabeludo!

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    1. Roosevelt,

      Adorei o seu comentário, mas você há de convir que as vezes o se arriscar sem analisar previamente certos tipos de valores, não é sinônimo de amor, e sim, ou de carência extrema ou de irresponsabilidade para com o sentimento do outro.

      O que eu não me canso de ver é gente assumindo um compromisso, sabendo do estilo de vida dos conjuges, dos seus comportamentos, dos seus gostos, mas quando entra em uma relação mais séria, termina querendo impor seus valores ao outro, mesmo já conhecendo com antecedência algumas das caracterísiticas que ele se acha no direito de querer castrar.

      Talvez o erro desse cara para mim seja dificuldade em tomar decisões, ou de exigir demais.

      abraços

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  3. Esse pode ser um outro caminho. Contudo, o fogo da paixão quando pega, pega queimando.

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    1. Roosevelt,

      Aí sim! O que talvez não estivesse havendo no cara era paixão

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  4. Olá, meu caro Vinícius. Pois é, rapaz, o cara pesou na balança para comparar as moças ou estava em busca da perfeição em forma de mulher?

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    1. Mário

      Pois é. Eu acho o seguinte: ou esse cara na verdade não se via me cndições de se apaixonar, e, portanto, não andava disponível para se relacionar seriamente com ninguém; ou esse cara assumiu uma postura equivocada pelo seu excesso de exigência. Digo equivocada pois nunca vai haver alguém perfeito para ninguém.

      abraços

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  5. ótimo texto, Vina.
    Minha opinião:.....A paixão está intimamente ligada a riscos. Não falo apenas da paixão carnal, amorosa, mais pela vida. O arriscar-se é importante para uma somatória de experiência, assim como, a vida sem riscos, permeada apenas por prudência e escolhas embasadas em uma lista de atributos que vc valoriza torna-se previsível, marmorizada, aprisionada à expectativa de encontrar alguém sonhado e às vezes irreal. Ele com certeza deveria viver, aventurar-se. Carpe Dien, é o que digo.

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    1. Márcio,

      Seu comentário foi simplesmente excelente!

      Parece-me então que o cara anda sem paixão. Quando falo paixão, refiro-me a sua definição, ou seja, ele anda reprimido em suas ações. Talvez ele ande amedrontado com qualquer possibilidade de viver novas experiências. Talvez ele esteja reduzindo sua vida ao previsivel por medo de experimentar e por medo de que esse experimento venha a trazer resultados indesejados à sua expectativa.

      Talvez ele tenha medo de encarar a contingência da vida, até por que, mesmo sem buscar se apaixonar por suas escolhas, o risco é inevitável.

      Mas eu deixo uma pergunta: será que o fato dele se arriscar, mesmo sabendo que uma das duas garotas possuiam posturas que para ele não eram do seu agrado, não seria um fator negativo? Digo isto pois talvez o fato dele ponderar em suas decisões, apesar de limitá-lo, como você bem observou, pode torná-lo mais responsável em sua escolha.

      Talvez o se arriscar mesmo conhecendo valores que não nos convém, pode afetar a vida do outro, uma vez que é quase que inevitável a colisão entre os nossos valores e os valores do outro.

      abraços

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    2. Márcio,

      Continuando: não estou querendo com isso dizer que colisões são negativas. Conflitos são saudáveis em uma relação, pois se por um lado os conflitos geram irritações, por outro, eles nos faz crescer pois é a partir deles que passamos a aprender a lidar com novas experiências.

      Contudo, o que estou querendo dizer é que as vezes assumimos os riscos já estando cientes de que o outro possui posturas que não competem com os nossos valores. Aí eu acho um erro e um descuido com o outro, pois estamos conscientes de que ao vivermos com esse outro, nós não estaremos preparados para aceitar certas condutas.

      O que termina por acontecer? Infelizmente um entra em atrito com o outro nao por forma de diálogos, mas sim por tentativas de imposições, desrespeitando a visão de mundo do outro.

      Nesse sentido o arriscar é sinônimo de egoismo.

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