terça-feira, 31 de janeiro de 2012

Plenamente sendo

Ele chegou bêbado em sua casa, e como se já tivesse carregado ao longo de seu dia o mundo inteiro em suas costas, deixou seu corpo cansado cair em direção à porta. Ao se colidir decadentemente, largou a cabeça naquele pedaço de madeira. Voltou sua cabeça para trás e só enxergou o vulto de algo girando desordenadamente em frente aos seus olhos. Com toda a dificuldade do mundo, conseguiu encontrar o chão para se sentar.

O que ele queria mesmo era luz. A luz não se acendia e parecia não haver ninguém naquela casa. Continuou sentado, e como que embrulhado de toneladas de fantasias frustradas no peito, escarrou restos do fumo ainda resistentes nos poros de seu corpo. Tentou tirar sua camisa azeda de grudes deixados pela noite ao se enroscar em ombros alheios e vacilantes, mas foi tudo em vão. Tentou novamente tirar a camisa, mas antes de conseguir tal intuito, vomitou em cima de seus pés.

Medo. Ele começou a sentir culpa. Sentia que necessitava pedir desculpas a alguém. Ele havia feito mal a alguém. Que nada! Era nada daquilo não. Ele sabia que o assunto não acabava ali, e o que ele passava naquele momento em frente a sua casa era apenas um dos tantos momentos que ele sentia que ainda iria passar novamente. Ele já havia prometido a si mesmo nunca mais passar por aquilo outra vez, mas ele sabia que suas certezas não eram sempre verdades. Talvez um dia fossem.

Mas não eram apenas verdades ou a falta delas que o atormentava. Existiam naquele peito exausto muitos medos. Sim, isso ele poderia ao menos sentir. Pensar naquela casa exposta, pensar que não havia colocado alarmes e pensar que sua felicidade dissimulada um dia iria sofrer um enorme golpe ao ver um de sua espécie invadindo seu lar tentando usurpar toda a sua ambição serviente aos seus caprichos inúteis por ostentação o atormentava bastante. Certo, para ele aquilo tudo fazia sentido, mas não era apenas aquilo.

Esqueceu-se do medo, olhou novamente a poça de vomito em seus pés imundos da noitada. Lembrou que aquela porcaria lembrava vitamina de banana que tomava todas às vezes antes de ir para a sua escola. Voltou o medo, voltou a culpa, voltou a certeza da impossibilidade de parar algum dia a sua fuga nas mesas de bares e nos momentos de solidão vividos por ele dentro de sua casa. Sim, momentos de solidão. Teria alguém em casa? Ninguém abriu a porta.

Ele dormiu fora de sua casa mesmo tendo acesso aos compartimentos dela. Teria acesso mesmo? Onde estaria a chave? Ele sorriu e se lembrou que com aquele seu espírito oscilante marcado pelas aventuras noturnas, a chave estaria provavelmente largada em qualquer lugar da rua.

Sempre havia morado ali...

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