sábado, 1 de junho de 2013

O HOMEM QUE PAGOU O PREÇO

- Euzébio; disseram-me, ontem, na Avenida, que você quer ser um pregador. Você num tem vergonha, não? Quem que vai te dar ouvidos? - Olha, Raimundo, Deus abençoa quem paga o preço! E, eu me arrependi, agora é vida nova, tudo novo. - Mas, Euzébio, tu és quase analfabeto. Só num é porque aprendeu a assinar o nome. Como é que você quer ser um pregador? - A escritura diz que Ele ensina! Raimundo deu partida na moto e saiu sorrindo. Euzébio ficou pensando nas palavras de seu amigo. “É mesmo, o que tenho a dizer?” “E quando o povo se lembrar de meus feitos, vão tudo me acusar” A mente do irmão Euzébio ficou muito confusa. À noite ele foi à igreja, mas, infelizmente, nada lhe tocou o coração. Euzébio era um homem de idade já um tanto avançada, não muita, mas, o suficiente para lhe fazer meditar sobre os anos. Euzébio vendia água de coco defronte à rodoviária de Tobias. A cidade o conhecia e sabia muito bem da antiga fama de Euzébio. Os antigos dizem até hoje que a família de Euzébio havia feito pacto com o chifrudo. O finado Dr. Lucio, na boca do povo, foi o pior bruxo de Campos. No dia de sua morte, os urubus que descansavam no matadouro, foram todos para o telhado de sua casa. Durante a vigília, as corujas não paravam de chorar. O bastante curioso era a quantidade de gente vestida de Pedro. - E agora Gentil? Como vai ser o centro? - Certamente, o imbecil do filho dele vai tomar a frente. - Mas, Euzébio é um perfeito idiota. Olha o que ele inventou sendo rico: “Vender água de coco na frente da rodoviária”. - É porque ele acredita que passando o dia ali, ele pode evangelizar pessoas. - Mas, isso é babaquice. Com o dinheiro do pai, ele pode abrir uma igreja e ser o pastor. - Euzébio é assim. - Assim, como? Você é outro idiota Eduardo? Mas, Gentil, há dois anos Euzébio vivia na farra e nos prazeres. Eu não acredito nisso não. E como eu, existem muitos. - Rapaz, mas, se isso for verdade mesmo o preço a ser pago será grande. - É. - Num é não o que! Euzébio nutria no coração o desejo de pregar no púlpito. Seu maior sonho era ver as pessoas lá embaixo a olhar para ele, e ele a lhes ensinar a palavra de Deus. Em sua barraca de água de coco, caldo de cana e pastel estava um pregador que pregava para si mesmo. Todas as vezes que Euzébio tentou disser algo de Cristo, a pessoa cortava a conversa e se despedia dizendo-lhe: “Valeu Euzébio!” Euzébio nunca havia percebido isso até que sua mulher Vicentina lhe dissesse: “Euzébio cala a boca, pois, tu és todo atrapalhado!” Essas palavras deixaram o irmão Euzébio calado por dias. As pessoas que frequentavam sua barraca começaram perceber que Euzébio estava diferente: “Aquele crente enjoado parou de pregar”. Para muitos, isso foi um alívio, e lucro para Euzébio, pois, sua barraca passou a ter mais clientes – “Ai, eu adoro comer na barraca daquele rapaz crente”. Ver seu progresso no dinheiro não consolou muito o irmão em Cristo que vendia coco bem geladinho. O pastor de sua igreja passou a frequentar mais a casa de sua ovelha. “Euzébio está vendo que Deus tem vocação para tudo e para todos?” “Você não tem o dom da palavra, mas tem o dom de ganhar dinheiro”. O tempo passou; Euzébio comprou um carro novo, e um celular tijolão, o melhor da época; sua barraca virará uma lanchonete – “A lanchonete do pregador”. - Euzébio, você pode levar dois irmãos num ponto de pregação que nós temos logo depois do Vermelho? - Claro pastor. Quando é? - Amanhã às seis e meia vocês saem. O irmão aproveite e der uma palavra lá no povoado. - O xente se Deus quiser tá querido. - Então tá bom! Paz! - Paz, pastor! Euzébio não dormiu aquela noite. O homem passou a noite soletrando a bíblia. A noite seguinte foi a mesma coisa, a outra noite Euzébio dormiu mais sedo e sonhou que havia perdido uma ovelha. Ele dizia para as pessoas da feira o seguinte: “Perdi minha ovelha, alguém de vocês viram a bichinha?” Nogueira em seu sonho desce ao riacho que deságua no Jabiberi. O Rio Jabiberi recebe água de um riacho logo nas proximidades da cidade. Bem antes da entrada para Serra do Cavalo. Naquela época era uma estrada de piçarra. Dentro de um matagal que cresce pela força da umidade do rio estava a ovelha de Euzébio. Ele a leva para a água e lhe dá de beber. Esse sonho se repetiu até o sábado, dia da pregação no povoado. O carro, um corcel oitenta e cinco muito bem zelado, sai da casa de Euzébio às seis e meia. Nele, estava seu dono, e mais dois irmãos, o evangelista Josenaldo, e a missionária Vanderlucia. Euzébio não corria, contudo, nunca fizera um curso de condução de veículos; mas o povo tinha fé em Euzébio que tinha fé em Deus. Na altura do primeiro riacho após a ponte sobre o Rio Jabiberi um rapaz branco, baixinho, cabelos curtos como soldado e carregando uma mochila para o carro para pedir uma carona. Euzébio prontamente deu condução ao rapaz que pouco tempo depois interagia com o grupo na viagem. Os obreiros falavam sobre a volta de Cristo e o final dos tempos. O rapaz, sem nada entender das escrituras diz: “Eu num acredito nessa história de arrebatamento”. “Para mim o mundo acaba quando a gente morre”. Euzébio mordeu a língua para não se meter na conversa. Calado estava calado ficou. - Moço, a bíblia ensina que sem aceitar Jesus ninguém vai para o céu. - Amigo com todo respeito, mas, esse seu de vocês eu num quero ir não. - Por que? Perguntou surpreso o diácono Josenaldo. - Por que minha vó é crente e ela me diz sempre que vai ficar adorando a Cristo eternamente. Eu num consigo ficar falando sem parar uma hora quanto mais adorar a vida eterna toda. Ademais, Deus não é nenhum esquizofrênico. Na verdade, eu creio num Deus que vê a adoração como uma práxis de vida, como uma opção de viver fazendo o que Lhe agrada. Eu ainda não me tornei crente porque minha mãe diz que ser crente é coisa séria, tem que obedecer até o fim, ora, meus amigos não se ofendam quem é esse obediente até o fim? Uma luz de carro aponta lá no alto descendo a ladeira que desce do Saquinho. A conversa continua por um instante até que todos se calam para ver a ultrapassagem de outro carro que saiu de detrás do caminhão. A estrada sem acostamento forçou Euzébio a jogar o carro no pasto, mas, infelizmente não havia pasto, havia uma cerca que degolou o diácono e uma ribanceira que jogou Euzébio para fora do carro, quebrou o pescoço de Vanderlucia. Mas as ferragens perfuraram a barriga do rapaz misterioso. Euzébio acorda; percebe que seu rosto está cortado e inchado. Procura seus irmãos no carro, e os encontra mortos. Preso nas ferragens estava o jovem carona que tinha ideias estranhas sobre a fé. Euzébio ver que de seu lado esquerdo saía muito sangue. O rapaz morreria em pouco tempo. A estrada lá em cima não fazia barulho, certamente as pessoas envolvidas no acidente sumiram. Definitivamente, eles estavam sós. Euzébio entendeu que aquela alma precisa de algo mais para terminar sua viagem. Euzébio canta um hino muito antigo “Foi na cruz, foi na cruz que um dia eu vi meus castigados em Jesus”. A lua subia no céu de Campos; Euzébio recita o salmo vinte três. O rapaz dar um soluço e pede que ele fale: “Moço, eu sei que vou morrer, minhas pernas estão sem sensação”. “Diga-me sobre o seu Cristo!” Euzébio se sentiu encurralado. Imediatamente se lembrou das palavras “cala boca que você é todo atrapalhado!” Mas, a visão de um ser agonizando e ficando cada vez mais sem cor comoveu o pregador da barraca de coco: “Sabe moço, o povo me chama de atrapalhado porque eles num me entende não; Deus pra mim é uma pessoa que eu posso ver e sentir. É como se ele morasse dentro de mim. Olha, tem dia que depois da oração eu sinto uma paz tão grande e vejo em mim a presença Dele. Sim, e lá no céu num tem esse negócio do povo tá adorando o tempo todo não. A vida continua, é aí que a pessoa tem o que fazer e aprender com o Pai. Você quer entrega sua vida a Ele, que aceita-lo agora?” O rapaz quase sem forças disse: “Sim”. Soprou um vento forte, Euzébio olhou na direção da lua e viu um clarão subir e desaparecer entre as nuvens. “Será que foi ele?” Os crentes de Campos deram glória a Deus pelo livramento de Euzébio. O pastor de sua igreja o convidou para ele dar testemunho do ocorrido. Euzébio pregava sobre a ultima hora e a necessidade de se ter uma experiência pessoal com Deus. “Rapaz, Deus num é Deus de massa não; Ele é pessoal, a massa é soma de todas as individualidades, não existe um padrão fora do ‘amar a Deus e a seu próximo, seja inimigo ou não’”. Euzébio recebia convite para visitar muitas igrejas. O povo percebeu que ele não mais falava atrapalhado e que nele havia algo diferente. Um dia durante o culto, uma senhora teve um entalo e a língua da mesma queria passar para dentro da goela. Uma voz disse para Euzébio: “Imponha as mãos sobre ela!” Ele o fez e a mulher ficou boa. Coisas semelhantes a essa aconteciam diariamente. O povo passou a assediar Euzébio. Uma noite de terça feira, o senhor Euzébio tem um sonho; Seu pastor o convidava para ser conferencista. Ele ganharia 3 mil por palestra. O pastor seria o empresário, aquele que agendaria e criaria a estrutura. Euzébio muito se alegrou em pregar a palavra para tanta gente, mas, quando chegava a hora do dinheiro sua alma sentia tristeza. Seu pastor achou que três era pouco, então lhe ofereceu cinco e quinhentos. Entretanto, o problema de Euzébio não era esse: “Era se sentir pago por algo que teria que ser de graça”. Euzébio não suportou muito tempo a situação. “Olha, eu saiu da igreja; por favor, me entendam; eu quero viver em paz1” A mulher de Euzébio quando soube do fato lhe disse: “Eu sempre soube que você era um perfeito idiota”. A mulher e os filhos deixaram Euzébio porque ele estava tomado pelo demônio – “Se recusava a pregar a Palavra de Deus”. Euzébio voltou para sua barraca de vender coco e caldo de cana. Orava todas as manhãs: “Senhor, tu és o Deus que vi vivo na beira do riacho; ajuda-me dizer nem que seja uma palavra de fé!” As pessoas às nove da manha e três da tarde iam para a barraca de Euzébio ouvir o que ele tinha a dizer. Muitas foram as vidas tocadas pelo amor de Deus e pela Graça de Cristo. O tempo passou; o homem abandonado pelos seus faleceu vendendo coco e pregando o nome de Jesus. Ao chegar ao céu, lá, estavam o rapaz carona e os obreiros para recebe-lo. - Que felicidade meu irmão, sua pessoa não se deixou levar pela matéria. - Não foi eu não; foi a graça Dele. Um homem de branco o abraça e lhe diz: “Entra servo, na casa de meu Pai, há muitas moradas”.

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