sexta-feira, 11 de junho de 2010

DIALOGOS JUNINOS OU O QUARTO SANTO JUNINO

Os festejos juninos já chegaram e isso significa que os costumes, hábitos, alimentação, lazer canalizam seus esforços cognitivos e contemplativos (parafraseando Tom Zé) para os festejos juninos. Comer os alimentos derivados do milho, festejando a colheita abençoada pela chuva enviada por São José lá nos idos do 19 de março. A mistura de tradição e modernidade começa a se encontrar... na modernidade. Isso mesmo acreditem! Foi uma ação dos conservadores defensores dos antigos costumes e tradições contra a ação avassaladora do iluminismo que ia de encontro aos antigos costumes. Um colega, Renato Ortiz, que me passou essa informação. Sim, voltando aos alimentos feitos de milho que abundam ao longo das festas juninas. É canjica, pamonha, bolo de milho, milho verde, milho assado, além de amendoim, pipoca, bolo de puba e de macaxeira e por aí vai.
Essa época também apresenta o lado sagrado, com os santos da igreja católica. Santo Antonio, São João e São Pedro. Cada um com sua função a desempenhar para glória, misericórdia e satisfação de deus e por que não dos seres humanos. Afinal de contas os santos são uma parte da hierarquia do céu que se assemelha ao assistente social, pois eles têm que interceder junto a Deus para que as vontades de seus devotos sejam concedidas e ele, o devoto, possa permanecer como bom cristão, seguindo ou... buscando aos trancos e barrancos obedecer aos preceitos do ser um católico cristão nesse mundo hedonista e individualizado.
O que penso é que é muito difícil ou quase impossível de seguir a risca, mas isso fica para outra crucificação. E, claro, o santo vai buscar satisfazer essa necessidade para que a relação não seja abalada. Outra semelhança é que eles, os santos, é que servem aos menos favorecidos, concedem o direito de continuar ou ser fiel ao devoto.
Por exemplo, Santo Antonio é responsável por conceder um enlace matrimonial a pessoas que desejam esse amancebamento oficial, mas que não conseguem sozinhas ou talvez por que precisem de uma ajudinha. Aí o povo faz diversas simpatias para chantagear o santo. É isso aí que você tá lendo! também acontece. É uma relação de intrigas. É novelesco. Antonio pode ser posto de cabeça pra baixo até que realize o tão sonhado desencalhamento. Simbolicamente, só pra gente soprar na Antropologia, as mulheres tocam num pau de sebo carregado por vários homens, assim reza a tradição. O toque nessa forma fálica daria sorte para o tão sonhado encontro. Podemos ver que Antonio é acionado mesmo na data dos outros santos.
Agora vamos a João. Reza a lenda cristã que a origem das fogueiras vem de uma comunicação entre Maria, mãe de Jesus, e Isabel, mãe de São João Batista, que mais tarde batizou o primo famoso. A intenção era a de Isabel deixar Maria ciente do nascimento de seu filho e, além disso, contar com a sua ajuda no pós-parto. Caros leitores essa fogueira pode vir a estar ligada ao nascimento. E eu que pensei que fosse paixão, fogo, sabe... fogo de putaria, mesmo.
Pedro era o apostolo mais fiel de cristo e que quase foi o primeiro a traí-lo (Judas chegou primeiro), quando o negou por três vezes. O dia dele fica no final do mês. Que inclusive me faz lembrar da festa do mastro em capela, onde, principalmente as mulheres que não satisfeitas em buscar a ajuda de Antonio apelam para o mastro de Pedro para arrumar casamento.
Temos também um quarto santo nesse mês. Pois é, temos um quarto santo. Quem é ele? Luiz Gonzaga. Esse homem é ovacionado pelo povo, pela critica e pelos músicos. Experimente buscar nas estações de rádio, principalmente nas estações AM, logo estará vocês encontrarão as músicas dele sendo tocadas ou alguém tecendo altos elogios. Outro locais que se pode encontrar o som dele é nos diversos forrós que acontecem em toda parte no Nordeste, que se não me engano começam no mês de abril e só vão parar em julho. Toda banda pé-de-serra toca Luiz Gonzaga, todos falam em Luiz Gonzaga. Confraternização de firma, forró dos idosos, a festa junina da rua, nos mega shows, também. Ele é homenageado de todos os lados. Não sei por que o Vaticano ainda não canonizou esse homem. E o melhor de tudo é que a devoção é regada a muito forró. Ah, esqueci de dizer que nesse período ainda sobra espaço para compromissos religiosos desses santos. - Mas será que alguém lembra?

11 comentários:

  1. Meu caro AlyssonR,
    Você é um ótimo escritor. Mas peca um pouco no que concerne à História das religiões. Contudo isso não tira a validade de seu texto e sua pertinência. A lacuna que eu vi foi a falta de referência aos arquétipos presentes nos mitos religiosos que são muito mais antigos que nossa cultura religiosa ou civil. O que encontramos em alguns elementos citados é que eles devem transceder e serem bem mais complexos do que parecem ser. Explicar esse inconsciente de forma rápida é uma precipitação rumo ao precipício das idéias instatâneas-uma tend~encia nossa ante a correria das horas. O arquétipo São João nos remete a antiga Suméria onde segundo a História da magia, tudo começou. Mas essa é apenas uma biliscada torta. Valeu o texto.

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  2. Olá, meu caro Roosevelt. Realmente, o meu pecado histórico foi consciente. Sabia das lacunas que deixei no texto. Porém, o meu foco foi o de mostrar de forma lúdica e com pequenas doses de sarcasmo o que eu chamo de sacralização do profano. Nessa abordagem, Luiz Gonzaga é candidato a santo devido a ter como principal feito a difusão e afirmação do forró como estilo musical. E esse é o meio pelo qual as pessoas, embebecidas pelo mela cueca ou chamego, pelo desejo de conseguir um companheiro, pela diversão, nos nossos tempos interagem com essa época. festividades religiosas existem, porém não ficam em segundo plano.

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  3. Gostei muito deste texto. A prosa que perpassa a trilogia dos santos + 1 (o Luiz), contada por Alysson, independe da história religisosa no que concerne a sua gênese - embora seja importante lembrar. Mas credito a importância dos "usos tortos" que os fiéis fazem destes bens e signos culturais religiosos, como a peripécia de tocar no pau sebo pra depois segurar o pau-santo de cada dia... Botar o santo de cabeça pra baixo, pra depois revirar a própria... mas desta vez a ajudinha não é do santo não! Enfim "n" coisas ocorrem na santidade cotidiana das pessoas. Mas o mais bacana é que o 4º santo, esse sim, além de realizar o desejos dos ouvidos, o faz sugerindo um rala coxas... ui! No São João as fogueiras acendem...

    Belo texto, meu velho!

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  4. A idéia é essa mesma, Eder. Os festejos juninos, mesmo tendo uma carga religiosa no seu ciclo, carrega um companheiro subversivo e malemolente, que contempla a vida e suga dela as sensações que emergem dos cinco sentidos.Nesse jogo conflituoso de valores estão os santos que são festejados pelo profano. A sacralização do profano é justamente a predominância do profano sobre o sagrado. Sei que essa afirmaçao é complexa de fazer.

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  5. Do Sagrado para o Profano.

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  6. Na verdade é um misto dos dois. Não chega a ser dois campos em que o individuo respeite em suas práticas. É uma prática consciente do que se está fazendo, mas é que é tão naturalizada que fortalece a sacralização do profano, ou seja, a diversão necessita de devoção. E os símbolos sagrados ganham uma conotação "mundana" respondendo ao espirito de contemplação da vida. Por isso, que proponho Gonzaga para a canonização, pois é o ritmo que ele ajudou a difundir que potencializa esse espirito.

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  7. Concordo Alysson, há uma devoção da diversão. Resultado das astúscias do fazer com diferentes usos e práticas sobre cada signo cultural, seja ele religioso ou musical (isso foi pra rimar)!

    abraços!

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  8. Querido Alysson

    Acredito que este texto foi de fundamental importância para brincarmos com o trânsito entre o profano e o sagrado, e deixarmos de lado essa classificação rigida entre o não comer e o comer.

    O sexo é sagrado, pois basta pensarmos nas relações afetivas que ele implica, e o sagrado é profano, pois basta compreendermos que os santos já foram sujeitos historicos de carne e de osso.

    É isso ai: entortando os aparentes opostos, veremos que não há como definirmos de forma linerarizada uma coisa da outra. Se o bem é o sagrado, e o mal é o profano, entortando-os, veremos que o bem e o mal se encontram unidos, então como determinarmos com precisão, o que deve ser bom ou mal?

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  9. Valeu por comentar, meu caro Vina.

    O raciocinio vai nesse sentido, mesmo. A alusão com a época de fogueiras e muita comida a base de milho se junta a nossa insistente concepção maniqueísta das coisas, sagrado/profano; bem/mal; belo/feio. Na verdade, o que se apresenta não são fronteiras rígidas, mas sim hibridas e que os discursos, seja de um lado ou de outro, ficam num plano idealizado demais para a realidade. Vez ou outra sofremos todos disso.

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  10. Alysson,

    É verdade, todos nós em algum momento sofremos um pouco com essa necessidade de classificações. Mas eu acredito que as classificações são necessárias para as nossas vidas. É a partir delas que damos sentidos as coisas, orientamos nossas escolhas, etc.

    O ruim da classificação é usarmos hierarquias universas para as coisas, interpretando a realidade de forma dicotômica como sagrado X profano, por exemplo. Ao usarmos a hierarquia universal, nós estabelecemos o que é melhor e o que e pior, sem nos darmos conta de que o que é melhor ou pior, e melhor ou pior para NÓS, e não para todos.

    Aproveitando, é por isso que eu insisto em dizer que o movimento torto não é um vazio. Como você sempre chama atenção, o movimento tem suas conecções. Ai entra as classificações, ou seja, o ato de classificar como o ato de organizar as idéias; e as classificações também como a inevitabilidade de nossos valores que assim como aceitam a diversidade, também sabem recusar aspectos existentes nessa diversidade, afinal, inevitavelmente classificamos.

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  11. Acredito que mesmo com a pluralidade do torto, somos uma classificação, devido a "bricolagem" que nos compõe. Entenda essa expressão como a forma de dizer que somos uma composição complexa constituída e reconstituida pela relação subjetividade e estrutura, que parecem,mas não são tão separadas assim.

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