quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

Caetano não soube entortar

Em novembro deste ano, ao dar uma entrevista ao portal estadao.com.br, o artista baiano Caetano Veloso provocou um frenesi por entre afetos e desafetos, comunidades do Orkut (inclusive as que são em sua homenagem), blogs e etc. A tônica do tumulto foi um trecho em que Caetano dera algumas justificativas da sua predileção pela ex-ministra Marina (PV) na corrida pela presidência: “Marina é Lula e Obama ao mesmo tempo. Ela é meio preta, é uma cabocla, é inteligente como o Obama, não é analfabeta como o Lula que não sabe falar, é cafona falando, grosseiro”.

Não pretendo discutir o governo Lula, muito embora o próprio Veloso o tenha valorizado em trechos como:”Lula é um grande líder populista, mas é mais pragmático (...) Ter tido Fernando Henrique e Lula em seguida é um luxo. Saíram melhor que a encomenda” e até mesmo na sua posterior defesa às críticas: “Sua fala tem competência – e ele, como eu próprio disse na entrevista, é um governante importante”. Portanto, o propósito deste meu texto é discutir a complicação exegética (quase sem querer) que a falta de hipocrisia de Caetano gerou em seus críticos.

Faz-se imensamente importante suscitarmos o seguinte quesito: quem atribuiu a carga pejorativa às palavras analfabeto, cafona e grosseiro; o autor do adjetivo ou o próprio leitor?

Não se trata de cinismo. Apenas proponho a nós, seres que se supõem dotados de capacidade hermenêutica, aceitarmos que o músico baiano quis simplesmente apontar um fato fenomenologicamente constatável: o discurso de Lula é, via de regra, repleto de solecismos e seu recurso estilístico é limitado. O que embasa ainda mais esta constatação foi a comparação de Marina com Obama (famoso também por sua oratória, ou não?) e o fato de o artista não ter depreciado a competência do presidente do Brasil por simplesmente ter uma fala solecista por excelência. Aliás, quem o teria feito não teria sido a própria crítica, enfurecida com Caetano?

Veloso simplesmente não soube se utilizar da, talvez, mais torta das figuras de linguagem, o velho eufemismo. Torta no sentido de jogar com a hipocrisia benéfica, por não se tratar de deixar de dizer o que se quer dizer, mas por de fato dizer articulando-se com as convenções da etiqueta.

Afirmar que o discurso de Lula é estilisticamente fraco e rico em solecismos, mas que isto não necessariamente afeta a sua competência é afirmar o quase óbvio. Faltou ao grande compositor um quê eufemístico, faltou-lhe saber entortar.

7 comentários:

  1. Olha, não é por que o Caetano maculou os sentimentos puros da sociedade brasileira que falarei o que vem mais adiante, mas, pelo amor de deus, Caetano... Esse ser que aparece na TV com aquele olhar asqueroso de ativista de boteco, que é inovador, concupiscente, nacionalista e escreve letras com cupidez; e, como todos, para piorar, acredita, a cada eleição, na chegada do novo Messias, agora tomando cabo da Marina, a protetora da floresta... Parem de ouvir isso, e dediquem a contemplação musical de voces para o Prokofiev, esse genio que fora apago pelo tempo... E podem me chamar de pedante, meus queridos amigos racionais. João Maldito

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  2. Olha, o discurso do Lula, a meu ver, não é nada limitado. Diferente do que o populacho educado a mercê da globo acha, penso que o Lula, apesar de não se utilizar de preciosismos retóricos, consegue efervescer de tal modo o seu discurso que não obstando chegou onde se encontra. O discurso oral, meu caro Josua, é imediato e digressivo, e para quem já viu o Lula discursar, apesar de sempre percebermos esses solecismos dos quais voce fala, ele não deixa com que isso tampone o valor da mensagem que esteja a passar; portanto, creio, que voce foi infeliz ao dizer que o discurso do Lula é limitado. E, sinceramente, acho que voce levantou bandeira em defesa do Caetano nesse texto que, aliás, apesar de abordar que não defere, nele, nenhuma posição a respeito da política desenvolvida pelo Lula, indiretamente voce se mostra sequioso em tomar partido contra ela, ponto no qual também discordo, mas devo aceitar, afinal devemos nos ajoelhar diante dessa idéia frugal que é a democracia. João Maldito

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  3. "e seu recurso estilístico é limitado"
    "mas que isto não necessariamente afeta a sua competência"

    Caros leitores, essas são as MINHAS palavras.
    "Sua fala tem competência – e ele, como eu próprio disse na entrevista" - ESTAS são de Caetano.
    Estou as retomando e as deixando em evidência para que vocês não me interpretem por via de uma educação "a mercê da globo" e reproduzam uma intelecção do tipo: " portanto, creio, que voce foi infeliz ao dizer que o discurso do Lula é limitado" ou mesmo para que vocês não precisem REPETIR meu discurso sem se darem conta, por exemplo nesta passagem do tão infeliz comentário de João Maldito:"e sempre percebermos esses solecismos dos quais voce fala, ele não deixa com que isso tampone o valor da mensagem que esteja a passar;"
    Quanto ao "parem de ouvir isso", que aliás já seria um frase por si só tão irritante ao ponto de ser muita ousadia da minha parte eu me dar ao luxo de responder, mas lá vai: caro João, você exalta Bach por uma questão que eu acho por si só totalmente válida; ele corresponde às demandas da ordem estética em que você está mergulhado. Então, já que você só compreende a grandeza de tal compositor pelo sentimento, que tal compreender que todos os psiques, todas as histórias de vida, todos os gostos são peculiares? Ou você teria competência para me mostrar na partitura o porquê de Prokofiev ser superior a Caetano?
    Aliás, eu acho que seus comentários estão bem para como você mt bem descreve o discurso oral, imediatos. Acho que o seu partidarismo e seu classismo à força o impedem de fazer uma leitura mais responsável dos textos dos outros. E, aliás, tenha este como último comentário em resposta aos seus até que você aprenda a entortar. Josué Maia

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  4. Josua, seus dois últimos parágrafos justificam a minha resposta e evidenciam certo paradoxo em relação ao seu post e sua réplica ao meu comentário. Para que não caiamos na desdita de evitarmos a clareza e sejamos, como dizes, imediatos, servir-me-ei das tuas próprias palavras para mostrares que o que digo é o que afirmas:


    Veloso simplesmente não soube se utilizar da, talvez, mais torta das figuras de linguagem, o velho eufemismo. Torta no sentido de jogar com a hipocrisia benéfica, por não se tratar de deixar de dizer o que se quer dizer, mas por de fato dizer articulando-se com as convenções da etiqueta.

    Afirmar que o discurso de Lula é estilisticamente fraco e rico em solecismos, mas que isto não necessariamente afeta a sua competência é afirmar o quase óbvio. Faltou ao grande compositor um quê eufemístico, faltou-lhe saber entortar.

    Vejamos:

    Eufemismo é uma figura de linguagem que tende a tornar, digamos, o depreciável em aceitável, ou seja, em outras palavras o eufemismo reduz a carga simbólica que possa haver num termo que se estabelece dentro de uma convenção linguística tornando-o,assim, digesto a uma determinada ocasião.

    A partir do momento que voce nos profere que faltou ao Caetano, o nosso beat, o uso do eufemismo ao dizer que o Lula era analfabeto, recai sobre o seu discurso, por parte de quem ler, inevitavelmente, o pensamento de que, até como reafirmas ao utilizar o termo Hipocrisia Benéfica, que o primeiro, o Caetano, se descuidou e, contrariando os sentimentos dos partidaristas do Lula, afligiu de maneira sincera, com palavras precisas, o que na verdade o nosso presidente é, uma analfabeto, sendo que poderia muito bem chamá-lo de desinstruído, ou até mesmo, uma pessoa sem muitos estudos. No entanto, mesmo que se utilizasse de tais termos, a intensionalidade estaria explícita, até por ser ele, o Caetano, uma figura famosa, o que não nos obsta a pensar que, sob vigilancia da mídia, os seus comentários a respeito do mais paupérrimo assunto estarão sempre sendo acompanhados.

    Outra questão, por que o discurso do Lula é estilisticamente limitado? Voce acha o "Grande Sertão: veredas" um livro estilisticamente limitado, mesmo que não haja nele preciosismos retóricos, olhando essa questão, os preciosismos dos quais falo, como um artífice academico?

    Obs: Esqueci de colocar no post de mais acima que, quando me referi ao povão educado a merce da Globo, evidentemente que não me direcionei a voce, mas, como é claro, à própria massa que, fazendo jus ao propagandismo* dos ditos intelectuais que dizem que o discurso do Lula é limitado, acaba por acreditar nessa proposição mentirosa e olham, a priori, o discurso do Lula com desdém.

    Quanto ao Prokofiev, citei-o pra te irritar mesmo! rsrs

    João Maldito

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  5. Meu caro João Maldito, não só pela inconveniência de estar sem internet mas pela sua insistência em projetar seu partidarismo em mim, eu não discorrerei muito mais sobre a sua, mais uma vez, infeliz leitura do meu texto.
    Leia novamente a parte onde proponho de onde vem a carga pejorativa à palavra analfabeto, leia novamente o título do meu tópico em que já insinuo um vacilo de Caetano. Aliás, faça o seguinte, tente reler meu texto sem sua postura partidarista, porque, diga-se de passagem, quem está defendendo claramente alguém aqui é você.
    Quanto à comparação ao belíssimo livro, eu nem deveria responder, porque,de fato, você não só me irritou como me cansou com sua insistência irresponsável. Meu querido, o livro cumpre muito bem sua função de nos ilustrar o desenvolvimento seco e duro do cotidiano daquela região. Ele NOS RELATA UM FALAR SECO E DURO, numa fotografia belíssima, que por si só já se faz completa pelo ESTILO extremamente peculiar, do nosso brilhante e neologista poeta. Há analfabetos falando, há dureza, há seca na narrativa, mas NUNCA deixa de existir poética. Como MUITO BEM pode ser o discurso de Lula, seco, duro, solecita, mas COMPETENTE, EFICIENTE, e até POÉTICO. E se você ler com responsabilidade o meu texto não vai achar brechas que me contradigam neste paradoxal reconhecimento.
    Pode dar seus gritos ao vento, porque eu já lhe dei muita ousadia. Um comentário que já começou tão triste e PRECONCEITUOSO não deveria ter sequer duas linhas de resposta.
    Josué

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  6. O que esse menino tem de quieto nas rodas de conversa tem de agressivo no discurso. Eu poderia dizer que no comentário de mais acima voce foi coll. No entanto, as interpretações sobre esse ligeiro embate discursivo abordando o seu texto, fica a cargo de cada um.

    Devo dizer - voltando atrás no que disse nos dois posts de mais acima - que, reconhecendo a sua crítica a minha crítica, me precipitei em alguns momentos. Mas, no todo, conservo a minha opinião. Já chega.

    João Maldito

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  7. Bendito Maldito,
    colei um comentário seu que você me disse no MSN, para tentar esclarecer, obviamente ao meu modo, o que acho que nosso querido Torto Josué Maia tentou mostrar em seu texto.
    Assim você argumentou no bate papo:"cara, eu não vejo subversão na hipocrisia benéfica do josua"
    Primeiramente, tenho a dizer que não é intenção do Movimento Torto ser subversivo. Na verdade, o torto ele subverte por ele não admitir se submeter UNICAMENTE às convenções que lhe são impostas, no entanto, pelo menos na minha concepção do que seja torto, mesmo ele admitindo ter a necessidade de requestionar as estruturas, o torto admite que inevitavelmente é produto do meio, e que portanto, mesmo se dando ao luxo de criticar muitos valores impostos pelo social, ele tem infiltrado nele, as convenções que ele mesmo abomina. Portanto, ele não necessita querer dizer ao mundo que ele é subversivo.
    Outra coisa: o que eu percebo é que Josué, muito bem entortadamente, em nenhum momento tomou partido de Caetano ou de Lula. Se por um lado, nosso querido torto admitiu que Caetano foi de certa forma infeliz por não ter se usufruido bem do que ele chamou de recursos estilísticos em seu discurso, por outro, de acordo com ele, o exagero do discurso de Caetano não passou de um certo exagero de quem interpretou o seu discurso. Quanto a Lula, o próprio Josué logo no inicio de seu texto deixou claro que apesar do deslize de Caetano, nosso irreverente tropicalista elogiou o próprio Lula.
    Para finalizar, eu quero dizer que Josua assumiu, pelo menos como eu acredito, uma postura brilhantemente torta, visto que buscou avaliar de forma muito crítica os prós e os contras do discurso de Caetano, como também não necessitou levantar uma bandeira a favor ou contra a Lula. É essa forma pela qual ele se posicionou, que eu acredito que podemos compreender o que nosso torto quer nos mostrar o que ele concebe como Hipocrisia Benéfica. Enfim, um posicionamento que, se por um lado, possibilita com que ele assuma uma postura sobre suas opiniões, fazendo juz a sua inevitavel subjetividade, por outro, ele não necessita optar em ofender um lado ou o outro, visto que, ele como um torto, sabe que, apesar de ninguém está livre de seus deslizes, todos têm suas razões, suas virtudes e suas falhas.
    Para mim, se o torto subverte, é por que espontaneamente ele se torna subversivo aos olhos de quem o interpreta; porém, acredito que para o torto, buscar a subversão causa-lhe preguiça por saber que apesar de termos a necessidade de refutarmos determinadas verdades, essas verdades não passam de bilhões de ideais que se passam em bilhões de outras verdades em bilhões de outras pessoas que se modificam a todo instante em trilhões de outras delas,e que portanto, possuem infinitas verdades em cada um de seus inúmeraveis momentos. Enfim: se não há verdades plenas, não há mudanças definitivas, visto que as mudanças variam de acordo com cada concepção de verdade dita por cada um.
    bjs TorTOs

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