terça-feira, 4 de maio de 2010
Das Periferias.
Ando escutando muito Jazz esses dias, e vejo que para o torto o jazz trás muita colaboração. Percebo que o jazz possui uma liberdade, que ás vezes me parece que todos os instrumentos estão tocando individualmente independente de qualquer outro instrumento da banda, a guitarra com seus acordes infinitos que não param de vibrar, o sax como um ataque fulminante a atmosfera de qualquer lugar, parecendo que vai cortando o ar, livre e rasgante. Seria uma liberdade centralizada, pois enfim, respiram os instrumentos a mesma harmonia. O torto, a meu ver, é como o jazz, que se dilui no ambiente e vai cortando as certezas construindo-as, reconstruindo-as e demolindo todas elas se for preciso. Mas a ordem e a coesão, no entanto, fica circunscrita nas palavras dos tortos, esse voyeur jazzístico.
Não acredito que o torto seja um movimento periférico como o jazz no seu inicio, musica de bêbados e drogados negros das periferias estadunidenses. Para mim o torto é esse voyeur aí que transita entre a periferia e a elite da intelectualidade,ou seja, é legitimado/deslegitimado. Legitimado porque fatalmente o conteúdo do torto tem maior acesso ás casas dessa elite intelectual letrada (não encarando o termo de forma totêmica é claro) e deslegitimado, muitas vezes por não apresentar um conjunto de idéias salvívicas para o mundo, e nem uma idéia categórica das coisas, pois ele está em transito. Também não saberia afirmar se o torto nasce da periferia dessa elite, contudo vejo que ele conjuga com os totens dessa elite a sua afirmação e a sua negação. Não por prepotência, mas mesmo se for Nietzche ou Karl Marx, temos o gostoso prazer de contradizê-los, porque eles são seres humanos animais bípedes como eu. Só porque não falam nos seus textos: Falou velho! Não quer dizer que não sejam passiveis a erros, e creio que nenhum deles desejou que suas idéias ficassem inertes inquestionáveis, sobretudo Marx que me lembro bem que a minha professora de Sociologia falou na ultima aula que o próprio Marx não se alegava marxista, uma vez que ele não queria criar dogmas ou verdades irrefutáveis. Se toda filosofia ou ciência é uma tentativa o torto também o é.
O jazz na sua pluralidade traz para o torto a seguinte idéia: que nem sempre o acidente é um erro, nem sempre um erro é sair da ordem, e nem sempre a ordem é coerente, e também nem sempre sentimento é só paixão ou livre pulsar de coisas (afinal por detrás do filling dos jazzistas havia muita técnica). Nem tão pouco por ser livre é estritamente efêmero, mas digo que as idéias e os sons as imagens que levantamos são intensas carregadas de incertas verdades, que são verdadeiras na sua intensidade e no seu sentido para o universo humano que criamos. Por isso creio que ser torto é se diluir, é uma catarse (para mim) para que eu me dilua nas minhas certezas, que crie assim como no jazz centelhas intensas de idéias que são pulverizadas no ar. É esse se perder....se encontrando no pulsar.
Obs.: Autor do quadro desconhecido, foto encontrada na web.
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Bom texto! Recuso-me a cometer nesse comentário a idiossincrasia por já ter exposto no texto do Vina minha posição em relação ao “objeto perdido”, e que muitos em outras tempos e espaços já fofocaram, e também fofoco uma vez ou outra essas questões, que mudam apenas nas diferentes linguagens e contextos. Mas sempre é importante estar tocando nesses pontos, sendo que vc Reuel, foi ORIGINAL em seu pensamento. Isso o torna válido e muito bom...Gostei da analogia do jazz, e essa liberdade nas diversas dimensões harmônicas, melódicas e rítmicas no Jazz transcendem essa idéia de ordenamento até na musica, que para o músico e o bom ouvinte do do genero, transitam "ricamente" sobre suas questões perceptivas e construindo seu próprio (dês)ordenamento subjetivo não necessitando ser refutado na música...
ResponderExcluirTortissimo Astronauta,
ResponderExcluirQue texto mais fodástico man!
Fazendo uma analogia ao jazz, você conseguiu desmembrar muitas abordagens trazidas pelo torto.
Realmente, é isso mesmo: andamos individualmente, cada qual com sua opinião sobre as coisas, aceitamos a inevitabilidade da natureza contingencial do nosso dia a dia, improvisamos o tempo inteiro em nossos atos, mas em nenhum momento deixamos de renunciar as técnicas, ou sociologicamente falando, as estruturas que nos proporcionam códigos capazes de nos orientar, de provocar entendimentos, referências, sentidos. No entanto, dentro dessa técnica, sentimo-nos livres em criarmos, reconstruirmos, destruirmos as construções que fazemos dos simbolos, e inclusive as nossas próprias convicções. Talvez seja isso: admitimos que somos tortos, justamente por não sabermos o que somos, afinal, com toda tablatura, partituras e uras e uras, existe uma necessidade constante em nos desviarmos e improvisarmos.
Muito bom!!!!! Sinceramente eu achei um dos melhores textos seus.
Grande associação!! Belo texto com uma sensibilidade profunda.
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