segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

A música de vanguarda e a música brega nas escolas

Devido ao comentário fantástico que recebi semanas atrás do meu querido torto Roosevelt acerca do meu texto “Música de vanguarda e educação”, resolvi trazer mais ideias sobre a proposta dele referente à aplicação da música brega nas escolas. Por eu ter trazido textos falando sobre a música de vanguarda, decidi propor nesta semana uma abordagem em relação à música de vanguarda e à música brega, pensando esses dois universos dentro do cenário educacional.

Tanto a denominação vanguarda quanto brega foram construídas por meras intenções de poder. A vanguarda foi associada a uma música “além do tempo” e como uma música crítica pelo fato de seus consumidores estarem associados ao público universitário. Já o brega foi uma denominação associada a algo alienante e clichê, por seus artistas, diferente dos da vanguarda, serem pessoas que geralmente não possuem muita escolaridade.

Mesmo que eu veja na música de vanguarda um caminho para provocar curiosidade nos discentes, ela pode não gerar muitos efeitos positivos. Como eu já expus semana passada, se mesmo sendo consumida por universitários, essa estética se encontra pouco consumida por uma boa parte deles e pelos profissionais provenientes desses meios como os próprios docentes, como podemos esperar em uma sala de aula, estimulo e interesse de um aluno de ensino médio por esse tipo de música?

Portanto, como observei em textos anteriores, a música de vanguarda é válida para ser aplicada nas escolas por questionar os modelos legitimados, mas também não surte efeito pelo fato dessa música se encontrar distante do cotidiano dos discentes e de muitos docentes, sem contar que muitas vezes o seu público-consumidor, como forma de manter seu prestigio, faz dela uma construção incompreensível e inatingível. Outro ponto se refere à educação: nosso sistema educacional, caracterizado pelo controle social, não comunga com a natureza liberta dessa música.

Já com a música brega a situação muda. Apesar de ainda ser na maioria das vezes consumida por setores mais periféricos, ela estabelece um canal de comunicação com a sociedade chegando a extrapolar as barreiras sociais. É por isso que acredito no ganho das escolas ao utilizarem essa música, afinal, uma educação de qualidade se dá através do diálogo que o docente termina por estabelecer com o seu aluno buscando entender o cotidiano desse aluno.

No entanto, apesar de eu visualizar um ponto frutífero em trazer a música brega para a sala de aula por ver nela a possibilidade de dialogar com a realidade dos alunos, eu penso que a nossa educação é reflexo também dos interesses simbólicos dos setores prestigiados da sociedade. Ou seja, os grupos sociais, para se afirmarem em seus espaços, demarcam fronteiras entre eles e os demais grupos como forma de se distinguirem e de preservarem seu poder na hierarquia estética e social.

Por exemplo: se eu sou considerado intelectual para a sociedade, para demarcar meu espaço, nego a utilização da música brega em minha aula por ela ser vista como algo simplório e de mau gosto e por se encontrar com maior freqüência em um público sem muita instrução escolar e sem prestigio social. Infelizmente é isso que muitas vezes acontece: os docentes reafirmam seus valores estéticos em salas de aula de acordo com o que é legitimado e imposto pelo seu grupo.

Percebemos essa imposição estética nos livros também. Nos livros de história, por exemplo, lemos sobre a MPB na ditadura militar, mas não encontramos nada acerca da música brega. Em literatura, podemos observar que os artistas e estéticas citadas, são as que interessam a uma elite intelectual. Se olharmos a gramática, o discurso legitimo é apenas aquele oficializado pelos que detêm de um saber formalizado. Assim acontece com a geografia, a matemática, a sociologia, etc.

Portanto, com relação à música brega, também visualizo uma importância dela nas salas de aula por ela se encontrar ligada ao cotidiano dos alunos, no entanto, muitas vezes ela não surte efeitos pelo fato dos docentes necessitarem reafirmar seu lugar de prestigio, esquecendo da importância da vivência cultural do seu discente para uma boa aprendizagem, preferindo as velhas classificações do que é uma música “mais” importante e “menos” importante para serem discutidas nos ambientes escolares.

9 comentários:

  1. apesar de eu ter repulsa pela palavra vanguarda como e utilizada atualmente .
    vou colocar uma opiniao minha
    david bowie pra mim e um cara de vanguarda , na dec 70 ele ja era essa epoca atual
    como se o cara fosse de dec 80 , dec 90, dec 20 a 2011
    alan

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  2. Alan

    Sinceramente eu acredito que exista uma música de vanguarda, mesmo com toda a falta de precisão que encontramos ao tentarmos classificar determinados gêneros musicais, no entanto, não concebo muito a ideia de aceitar olhar um artista como alguem vanguardista.

    Pra falar a verdade, eu acho que ninguém é de fato vanguarda. Ninguém se encontra além de determinado contexto histórico. Veja bem: os indivíduos introjetam os valores morais e comportamentais de uma sociedade do contexto presente de seu tempo.

    Para mim, o termo vanguarda é algo construido muito mais com o intuito de conferir legitimidade e glorificação a determinados setores da sociedade.

    Na minha opinião, nem o artista de vanguarda escreve e reflete fora de sua temporalidade, assim como o dito brega não se encontra aquém de um tempo, afinal, encontra-se no mesmo momento histórico que qualquer um artista de vanguarda. A diferença entre as duas é a forma como cada uma se ve recepcionada em seu público e a forma como seus artistas e publico as constróem e as consomem.

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  3. veio mas david bowie se consome de+ .ele toca temas atuais e como se ele tivesse nessa sociedade , msm a 30 atras .
    lembrando que david bowie foi quem rompeu com estilo hippie trazendo temas androginos , tecnologicos e gays para o rock influenciando e contribuindo para o surgimento de nvos movimentos no rock , ambientados e retratando determinada epoca . pos punk msm tem muita musica influencia de david bowie, tem bandas black metal que baseiam no pos punk , engraçado e que muitas bandas alternativas se baseiam e pos punk se n fosse o pos punk essas bandas nem existiriam
    alan

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  4. Alan

    Veja: romper determinados padrões é algo inevitável a qualquer prática cultural. Se assim não fosse, os valores de hoje seriam iguais aos valores de outrora. Sidney Magal, por exemplo, rompeu com as musicas levadas pela influência da Jovem Guarda e dos boleros e incrementou a discoteche. Beto Barbosa incluiu foi a lambada. Todos esses dois foram considerados bregas. Nessa sua lógica, por que não vanguardistas? Para mim, pensar em posturas vanguardistas é se apegar a classificações classistas, afinal, como eu ja disse, ninguem escapa de seu tempo.

    O fato de se tocar até hoje, antes de significar ser vanguardista, representa uma memória auditiva de seu público. Por exemplo: Waldick Soriano desde os anos 60 até hoje é ouvido e foi classificada como um artista brega e anti-vanguarda pelo brega ser considerado algo clichê. Paulo Sérgio a mesma coisa. Só para se ter uma ideia, até hoje lota de pessoas em frente ao tumulo dele no cemitério do Caju. Enfim, como eu disse, mesmo sendo adorado e ouvido até hoje, eles não se encontram na classificação de vanguardistas.

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  5. Perfeito meu caro Vina,
    Seu texto nos remete a postura do docente de transmissor do discurso oficial. Acredito que a teoria freireana que diz que urge libertar o docente se deve a essas razões. Ele também está alienado no processo. Um texto muito instigante.

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  6. Roosevelt,

    É meu caro, apesar de muito instigante essa perspectiva freiriana, infelizmente, como um profissional que anda vivendo o cotidiano das instituições publicas de ensino brasileiro, posso dizer que não guardo essa fé depositada por ele. Qual a alternativa possivel para libertar esse educador das estruturas oficiais? Seria do interesse dele se livras dessas estruturas oficiais? Não seriam essas estruturas as responsáveis pela manutenção de seu prestigio na sociedade? Quem quer perder a admiração do outro e quem quer perder o poder? Uma saida para isso seria a conscientização do docente em compreender que a horizontalidade também gera ganhos no aprendizado, porém, admito que mesmo se conseguissemos contruir esse olhar no docente, ele não negaria a sua condição de romper com a posição de prestigio construida em cima dele na sociedade.

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  7. Isso meu caro Vina,
    O poder é inevitável. Considero a teoria de Freire um tanto utópica por que ele acredita que poderíamos fazer uma mudança na estrutura por meu da educação. Ele acredita que educando os dois lados a tensão seria menor ou totalmente resolvida.
    Não acredito nisso em se tratando de Brasil. o que eu chamo de fluido linguístido possui marcas discursivas que perpetuam o poder onde está. a própria fala do povo presente no discurso brega aponta para isso. a domestificação do nativo continua na malha hibricada de discursos colonias nos discursos pós coloniais do brega por exemplo. Quando ouvinos na música brega que arranjei uma nega por exemplo estamos expressão o discurso colonial, onde a condição do negro é submissa a do branco, está aí o genes da dominação numa marca discursiva brega.

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  8. O que coloco é que a educação informal no que diz respeito a perpetuar determinados paradígmas é mais forte que a educação formal. em se tratando de Brasil a coisa se agrava ainda mais por que os investimentos no setor ainda são muito limitados. A educação formal de qualidade não eliminaria estas marcas a curto prazo, quanto mais uma eneficaz como a nossa.

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  9. Roosevelt

    Achei muito pertinente sua observação acerca das marcas de dominação nos discursos da músic brega. No entanto, ao longo do repertório dessa estética musical nós também podemos encontrar elementos que implicam resistências a ordem estabelecida como letras que abordam sobre as categorias marginalizadas da sociedade como os meninos de rua, as prostitutas, etc.

    Acredito que seja importante tambem a gente virar a questão da dominação e pensarmos na transferência da sede de poder deixada também para as linhagens de prestigios sociais. Acredito que não só o brega reforça aspectos da dominação. Os setores privilegiados também reforçam como forma de perpetuarem seus poderes diante dos outros segmentos sociais.

    Gostei de sua observação acerca dos paradigmas reforçados com muito mais força na educação informal do que na formal. É isso, só que eu as vezes fico a pensar até que limite podemos encarar a preservação de paradigmas como negativos ou espontâneos devido a própria formação histórica do povo. Por isso que as vezes eu nego a condição que o docente quer que o discente assuma, sem ao menos parar para questionar esse discente e saber a importância que ele enxerga na educação, para que a educação é importante para ele, por que ele frequenta o ambiente escolar, etc.

    Não que você tenha tomado essa posição,mas essa necessidade de romper paradigmas, mesmo que venha com ares de mudanças e de compromissos com a realidade, muitas vezes termina se tornando um discurso intransigente e etnocêntrico, pois não necessariamente a nocividade que eu vejo em certos paradigmas, outros universos sociais vêem. Acho que isso estaria muito mais ligado à uma conscientização, uma revisão de toda uma complexa formação histórica e social construida pelos setores sociais no brasil, do que necessariamente devido ao fato de ver os investimentos limitados.

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