Texto dedicado a Alessandro Santana
Esta semana ao ler o texto “Não boto fé no cinema brasileiro” de Alessandro Santana no blog “Faz o que pode”, vieram-me muitas questões. Resumindo de forma muito rasa devido a grandeza de problemáticas trazidas pelo texto, mas em geral o que notei é que ele se propõe discutir até que ponto a produção cinematográfica brasileira busca tornar o cinema apenas mais um produto a serviço da lucratividade gananciosa das indústrias cinematográficas e até que ponto a nossa produção cinematográfica pretende propor ao consumidor desse produto, a possibilidade de revelar novos sentidos, novas condições discursivas,textuais e estéticas. As problemáticas trazidas por Alessandro Santana são bastante pertinentes, mas como o objetivo de meu texto não está em fazer uma resenha acerca do texto dele, pretendo propor novas indagações e tentar contribuir com mais opiniões acerca do texto.
Pois bem: acredito que as produções cinematográficas vão ter suas perspectivas alteradas em tempos futuros. Afinal, como Alessandro atentou o cinema não se transmutaria ao longo do tempo se ele não absorvesse outras linguagens na sua história.
Compreendo bastante a sua pessoa quando observa a questão da mesmice atolada na comodidade medíocre dos consumidores e dos produtores, entretanto, eu acho que a gente deveria repensar o mercado diante dessas situações. Acredito que isso não é uma questão que remeta meramente ao mercado. É óbvio que a intenção mercadológica tem como objetivo para se sustentar, objetivar o lucro, mas será que haveria esse lucro se do outro lado houvesse consumidores e produtores que estivessem dispostos a se utilizar da arte cinematográfica como uma ferramenta capaz de provocar uma re-significação nas linguagens e nos valores sociais? Tenho certeza de que se um dia o consumidor cinematográfico abdicasse dessa mesmice e recorresse a modelos menos patéticos e repetitivos, rapidamente as indústrias cinematográficas iriam aderir a esse novo formato.
Acho que devemos também pensar na conjuntura social de forma mais ampla para compreendermos essa mesmice no cinema nacional de hoje em dia. As pessoas também se negam a exercitar o caminho da consciência, da emancipação, do questionamento. A praticidade reina em todos os grupos sociais, inclusive nos grupinhos de merdinhas que se dizem cinéfilos, engajados e cults. Vivemos em uma sociedade submetida a padrões de todas as espécies e o que prevalece em nosso cotidiano são as etiquetas, são as atitudes forçosas e artificiais, ou seja, são as vitrines. O fato de nos adaptarmos aos valores sociais, não implica dizer que não possamos nos deslizar por variáveis, assim como romper com o óbvio.
Mesmo que uma pessoa entre na internet e se depare com uma infinidade de produções, infelizmente elas são tão modistas e produzidas em série que elas só vão recorrer para o óbvio, ou seja, para aquilo que se encontrar legitimado pelo seu grupo social. Com isso nós podemos ver que mesmo com essa infinidade de produções trazidas pela internet, os usuários não possuem curiosidades. Seja os indivíduos pertencentes ao grupo dos ditos “não-massivos” ou massivos, ambos são manuseados pelo discurso legitimado. A diferença é que os primeiros se alienam através dos discursos trazidos pelos críticos de arte e os outros pela mídia massiva.
A Globo Filmes não investe em uma linguagem renovada e questionadora, não é por que ela quer abafar uma realidade, afinal, para o capital não existe ética. O que interessa ao capital é o lucro. Portanto, o fato de não investir, nem estimular esse tipo de manifestação, é pelo fato de que ela também sabe que a própria sociedade em geral é apática e indisposta a encarar coisas novas. São “sementes mal plantadas que já nascem com caras de abortadas”. Não estou querendo partir para um olhar ingênuo de que a mídia não possua intenções políticas, mas acredito que ela se nega a se apropriar dessas manifestações muito mais por questões econômicas, ou seja, por visar o resultado lucrativo, do que necessariamente devido a questões de amansamento social. Se assim fosse, o movimento crítico do hip hop jamais seria agregado ao projeto massivo das mídias.
Acho que nós também temos que ter bastante cuidado ao associarmos a vanguarda como algo diferencial. Nesse sentido eu compactuo com meu amigo torto Josué Maia quando observa para a possível repetição velada no discurso inovador da vanguarda. Tenho sentido que o discurso dos ditos vanguardistas anda bastante saturado. Acredito que o tentar ser diferente a todo custo implica nessa possibilidade de fazer diferente de forma igual. É engraçado, mas tudo que hoje em dia implique um discurso que remeta ao fragmento, cai na classificação de vanguarda. Pra ser sincero, o que percebo é que esses artistas muitas vezes fazem a “doideira” pela “doideira” e dizem expressar coisas que não respondem sequer a eles mesmos. O ser diferente também implica em ser comum basta que alguns elementos venham a classificar de forma estereotipada determinada manifestação estética.
No mais, compactuo com tamanha indignação muitas de suas palavras. Acredito que existe um mercado excludente e preconceituoso que só abre espaço para aquilo que convém aos seus valores elitistas. Obviamente que eu também acredito que essa tirania mercadológica é fruto também de uma tirania que se reflete no cotidiano dos consumidores independente de qual grupo social ou manifestação estética pertençam. Veja o exemplo dos próprios ditos vanguardistas: criticam a natureza repetitiva das artes massivas, o que não tiro a razão, mas também não enxergam que se apropriando dessa arte massiva, eles podem claramente buscar estratégias e novas possibilidades para leituras mais criticas desse público massivo em relação a essa arte, mas o que vemos é declaradamente uma postura excludente dos próprios críticos que reprovam a exclusão do mercado.
São tão excludentes que sequer são capazes de buscar se adentrar no universo daqueles a quem eles classificam de “inferiores”. Como eu já discuti em textos anteriores no torto sobre a música de vanguarda, acredito que antes de ficarmos perpetuando o exercício segregador de qual seria a verdadeira arte, a pior ou melhor arte, deveríamos estar conscientes de que os universos artísticos e estéticos podem se intercruzar o tempo inteiro e cabe a nós revelamos possibilidades de novas leituras, novos discursos, novas textualidades, transitando entre a diversidade expressiva ao invés de ficarmos insistindo em uma essência que não condiz com os projetos oscilantes e híbridos de qualquer relação que possa ser estabelecida em qualquer lugar por qualquer indivíduo.
O link para quem tiver interesse em ler o texto de Alessandro Santana
http://fazoquepodeprodutora.blogspot.com/
Vina,
ResponderExcluirAssim como Alessandro, vc foi genial. Algumas vezes, inclusive quando postei no Torto sobre a questao cinematografica, pensei sobre tal ponto que vcs discutem. Para mim, esse e o ponto nevralgico do cinema: trasmutacao de uma nova ordem na linguagem. Sabemos que o publico tem uma imensa capacidade critica para requestionar os valores, e mais ainda, os produtores, ou melhor, os diretores tem o poder imenso sobre o publico ao trazer um novo discurso critico na imagem. Por que nao adota- las? Por que continuar tratando os espectadores como manada bovina bestializada, como se os seus cerebros fossem incapazes de processar, apenas de absorver?Para um todo, existe aqueles que nao se ajustam as regras, como o memoravel Glauber Rocha o qual era dono do incrivel lema camera na mao e uma ideia na cabeca. Cinema e isso,e pensar, trazer ideias para que o publico pense e repense sobre o conteudo e nao fiquem aprisonados pelos rotulos estereotipados. Outro cineasta que merecem esses votos e o Silvio Tendler, diretor de `Utopia e Barbarie`, pois ele ressalta que o cinema ja esta acoplado numa ideia de consumo. Vamos ao cinema para relaxar, ter assimilacoes rapidas e prontas. Essa ideia esta na sua propria estrategia geografica, cinema inserido no shopping center. Tendler, ressalta que o cinema politico brasileiro esta cada vez mais escasso, ou seja, novas ideias estao perdendo o rumo, o que vemos nessas ultimas decadas, sao meras copias dos modelos estandartizados internacional.
Sinceramente, eu vejo que o Brasil tem muito potencial, inclusive por ser uma nacao de muitas coleras do terceiro mundo. Coloco essa questao, pois contemplo algumas ideias do cinema marginal e do cinema novo. Para que seguir um padrao o qual o pais nao tem estrutura? Por que nao aproveitar as suas proprias condicoes para abordarem questoes mais autenticas? O publico rejeitaria? Acredito que nao. Como vc bem ressaltou, muitas manifestacoes culturais foram aceitas por um grande publico por ser facilmente identificados com tais identidades. Acho que a cara do Brasil esta longe de ser `E se eu fosse voce`, o calor que nos cerca, esta mais para ` o Sertao vai virar mar`- trecho exaustivamente dito por um dos personagens de `Deus e o Diabo na Terra do Sol` de Glauber Rocha.
bjos