A arte está em crise? Na verdade, sou da opinião de que a arte, por ser um dos infindáveis fenômenos que implicam formas de expressões da sociedade, anda passando por um momento de perda de apreciação. As pessoas andam em plena correria em seus cotidianos e têm perdido o hábito de entrar em devaneio com a arte. O elemento artístico parece que ficou reservado a um aspecto utilitário. Não me utilizo da arte para transcender. Eu me utilizo da arte para preencher um tempo de descanso.
Basta observarmos no cotidiano social para vermos que as pessoas quando se utilizam da música, por exemplo, têm tido um hábito muito freqüente de ligar o som no mais alto dos decibéis e buscado consumir de forma excessiva ritmos e canções preocupadas apenas com o movimento. Se pensarmos isso nas artes plásticas, uma tela, antes de ser permeada por significações aos olhos do sujeito, serve ou apenas para um enfeite ou para uma autoafirmação de poder, isto é para mostrar que tem um “bom” gosto.
Vivemos em um tempo tão marcado pela correria, pela busca de resultados, que viramos seres praticamente robóticos. Produzimos, mas não refletimos. Esse excessivo ritmo de produção faz com que a gente se mantenha em um estado frenético sonhando com muitas coisas e seguros pelo alicerce do vazio. Com isso passamos temer o silêncio e a brincadeira de nos aventurarmos pelo nosso espírito. Diante de um mundo marcado pelos cronômetros, as contradições devem ser expurgadas de nós.
O hábito de se deitar em uma rede ou de se aconchegar em qualquer outro lugar para sentir a melodia, os acordes, os arranjos, as letras de uma canção, por exemplo, são negados por uma sociedade calada pelo excesso de barulho e pelas intensas ansiedades devoradoras do amanhã e negadoras do presente. Sentir é uma palavra assustadora para uma humanidade que apenas tem cumprido de forma robótica os seus projetos em seu dia a dia. Sentir é pensar e pensar é se confrontar com os nossos emaranhados.
A arte é justamente esse se aventurar no emaranhado de fraquezas que compõem os seres humanos. A arte implora para que seu apreciador encontre seus próprios sentidos a partir do instante em que ele vasculha, se perde e se descobre em seus próprios labirintos. Dialogar com a arte significa se adentrar nos vulcões aparentemente adormecidos de nossa alma, significa transitar em novas experiências, se abster do óbvio e deixar fluir nossas dores e nossas incertezas.
Aceitar a arte significa se deparar com o exercício do diálogo, mas como se dialogar em uma sociedade que não nos dá o tempo suficiente para o diálogo com os outros e com nós mesmos? Estamos inseridos em um contexto marcado pelo excesso de informações, porém, estamos pouco dados ao convívio com o outro. Estamos recheados de conhecimento, mas solitários. Ninguém mais tem tempo para dialogar com o outro e muito menos em se confrontar com suas próprias fraquezas.
Se é para se ouvir uma música, que se ouça de forma alta, afinal, não precisamos conversar, uma vez que conversar é perigoso, pois cai em questões da existência. Em uma sociedade onde o relógio comanda cada passo, existência é uma coisa que não se reconhece, e se reconhece, dói pra caramba. Se é para se ter uma tela em nossa casa, que seja para combinar com a cor do sofá. Se é para se ouvir música em casa, que seja enquanto fazemos outra coisa, pois não queremos sentir a força do que nos maltrata.
Agora eu repito a pergunta que fiz no início do texto: a arte está em crise? Enquanto apreciação, sim. Entretanto devemos sempre lembrar que a arte expressa a sociedade de seu tempo e a sociedade atual, apesar dos grandes avanços tecnológicos, também tem se mostrado em crise com relação ao exercício da apreciação. A arte não tem sido utilizada de forma a estimular a sensibilização e o diálogo, assim como a família tem passado pela mesma situação, a política, etc.
Como recuperar o exercício com a apreciação? Essa é uma pergunta que deve ser repetida e pensada. No entanto eu também me questiono se o parâmetro que eu estou fazendo da apreciação pode se encontrar atualizado com o contexto. Será que não existe apreciação da arte ou essa apreciação mudou sua forma? Será que a sensibilidade com a expressividade do objeto artístico morreu ou a sociedade anda reinventando uma nova forma de convívio e de sentimentos? Perguntas e perguntas...
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