quinta-feira, 14 de novembro de 2013

O caos: a bagunça em ordem

Texto dedicado à Tainara Inocêncio


Não defendo a desordem. O que eu luto até o fim das minhas forças é pela aceitação da desconstrução para que sejamos capazes de encontrar outras maneiras de re-montar tudo o que foi desordenado. Falo sem nenhum medo de me arrepender que amo o caos, mas o caos não é o contrário da ordem. É no caos que encontramos toda a nossa criatividade e senso crítico, pois é lá que podemos reinventar o nosso mundo, assim como, construir novas paisagens e novos olhares acerca das coisas.

Quem disse que a ordem não é importante? Quem é que nesse mundo em nenhum instante parou para encontrar sentidos nas coisas, ou seja, organizá-las em classificações? Eu pertenço a esse grupo de pessoas. Porém, eu me nego em ter que admitir que a ordem pode ser reduzida a ordem por ela mesma! É importante também aprendermos a nos atrever e a nos perder nas traquinagens liberadas pela bagunça! A vida a todo instante nos surpreende com suas imprevisibilidades, e se eu não aprendo a amar o caos da mesma forma que eu amo a ordem, eu vou me frustrar e me perder de mim, mesmo evitando vivenciar o caos.

A ordem é importante, mas ela por ela apenas é cômoda. A ordem não transfere, nem explode novos afetos. A ordem torna as coisas estáticas como se essas coisas não tivessem as intervenções das danações humanas. Definitivamente não! A vida é feita de mudanças e é só aprendendo a saborear com o caos também que eu reconhecerei a tamanha alegria de poder me desencontrar para a partir disso, me reencontrar.

Eu vejo uma vida cheia de pessoas assustadas por saber aceitar apenas a ordem. Eu vejo uma vida permeada de bocas abismadas por justamente se enganarem por acreditar na possibilidade absoluta de que os fatos do dia a dia podem ser plenos e perfeitos. O que eu vejo são pessoas incapazes de suportar o choque de valores na convivência com as outras. A intolerância existe porque o caos é negado. Resultado: a tal da diversidade, da inclusão, da relatividade, do amor ao próximo vão rolando por esgotos podres e profundos.

Ninguém mais ama, pois a ordem é sempre a ordem do dia. Ninguém mais ama porque o ato de amar implora que a gente saiba naufragar e se arriscar no caos, pois só nele é que perceberemos o quanto os outros não são nós mesmos. É só com o caos que saberemos o quanto os outros por não serem nós mesmos, vivem experiências múltiplas, mostrando assim, que a vida, apesar da comunicação, dos códigos, das instituições, das regras, enfim, da ordem, sapateia em meio a um chão esburacado e movediço do caos.

Em outras palavras, o fato de não admitirmos o caos em nossas vidas faz com que a gente não aceite as frustrações. Estamos adoecendo demais por sabermos viver apenas com a ordem. Não suportamos sermos nós mesmos, pois queremos o todo igual (bem a cara da ordem), não suportamos admitir para nós mesmos que erramos, que fomos mal educados, estúpidos, pregos, malditos, arrogantes.

O caos vem nos ensinar que somos humanos por sermos cacos que querem se organizar. Mas veja: querem se organizar. Apenas isso. De fato nos organizamos, mas quando achamos que falta apenas mais uma pedra pra finalizarmos nossa casinha protetora de nós, ouvimos os roncos dos trovões, somos banhados por tempestades e voltamos a ter o horizonte infinito e imprevisto das possibilidades como nosso único teto.

Essa nossa escola ocidental tão preocupada com a ordem tem nos tornado medrosos. Não sabemos pensar por nós mesmos. Temos que sempre esperar a resposta de alguém que mitificamos como autoridade para encontrarmos sentidos nas coisas, quando na verdade esse sentido poderia vim de nós mesmos sem precisar do mestre das verdades trepado no topo máximo de uma hierarquia tão admirada pela ordem.

Eu digo: o caos sugere a aventura, e foi de aventuras que a história viveu até agora, pois sem riscos, não haveria alterações em nossos valores, e, portanto, não faríamos histórias. Temos que chutar o pau da barraca sim. Temos que cuspir nas ditas verdades que nos são impostas garganta a dentro mesmo quando não estamos com fome. Temos que sangrar as canelas, ferir nossos joelhos, arrombar os lábios com as quedas sim.

Sabe por que? Mesmo a gente sabendo que o melhor de tudo seria nos acalentar com a previsibilidade da ordem, a vida nos surpreende com suas experiências boas e ruins. Quem quiser aceitar o caos vai sofrer e sorrir do mesmo jeito de quem aceita apenas a ordem, mas há uma diferença: quem aceita o caos, sabe que é humano, e por isso mesmo, não é invencível. Sabe que busca a alegria, mas nem por isso pode ser plenamente feliz.

Enfim, sabe que pode desmontar, desfazer, remontar e reconstruir as coisas, e por isso mesmo, se hoje chora com a putaria imposta pela vida, tem consciência de que pode re-organizar todos os seus afetos, pois é isso que aprendemos com o caos, ou seja, de que nos perdemos para nos desmontar, nos quebrar, nos achar, nos refazer, mas também nos superar.

Um comentário:

  1. O termo caos no seu texto de forma implícita, acho eu, no remete, aos conflitos que existem em nossa realidade material. O que é bem interessante no seu texto amigo torto é a doutrina das estruturas que reconhecem o caos e são remodeladas. o sujeito participa de forma consciente ou não. Para nós educadores a participação consciente da sociedade é nosso desejo. O caos da educação deve servir para um requestionamento de paradigmas e para a proposição de teorias novas como a pedagogia dialógica. Vou ler seus textos, e peço o amigo que leia meu novo texto - ensaio que sairá em breve - a metafísica do eu. Ele está bem em linha com nossas pesquisas.

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