sábado, 20 de outubro de 2012

A leitura nas aulas de sociologia: uma estratégia

Enquanto professor de sociologia da educação básica eu sinto uma enorme dificuldade em fazer com que os alunos tenham um hábito mais corriqueiro com a leitura. Ensinando em Piranhas, município localizado no alto sertão alagoano, o que eu detecto é que esse fenômeno se agrava. Não digo todos, mas eu percebo claramente que em uma boa parte da realidade do discente não se existe o hábito cotidiano com a prática da leitura pela própria família e pelo seu meio social.

É de grande importância se acompanhar a disciplina da sociologia mantendo uma constante atualização com a leitura. Passando por esse problema ainda pensei em escolher textos menos densos, o que se é muito difícil em se tratando da sociologia por ela ser uma disciplina de tradição acadêmica. Além disso, eu pensei em abrir um momento da aula para que fossem feitas essas leituras, mas no meu caso ocorre um agravante, visto que a sociologia só possui cinqüenta minutos de aula por semana.

Outro ponto diz respeito à necessidade de constantes debates. Contudo, além de eu me esbarrar com a falta de hábito com a leitura, com o tempo restrito de aula, existe uma enorme carência com a prática do exercício da reflexão. Esses alunos, por serem reflexos de um sistema produtivista que tem como objetivo atingir resultados imediatos, não demonstram muito interesse em desmembrar certas verdades naturalizadas por eles. Estão acostumados com respostas prontas.

Com essa carência do exercício contínuo da leitura e de reflexões, eu achava que as aulas estavam se tornando entediantes para os alunos por que eles não liam os textos. Porém, eu me perguntei: e quando eles se divertem em seus grupos sociais, será que não existem debates recorrentes entre eles? Por um acaso eles precisam necessariamente buscar o acesso a uma leitura para debaterem acerca dos temas discutidos? Portanto, por que minhas aulas parecem estar entediantes?

A partir dessas questões, eu passei a rever as minhas posturas. Muitas dúvidas me atormentaram, e dentre as mais recorrentes estava à questão da importância dos conceitos trazidos em sala de aula. Eu fiquei a me questionar: se eu deixasse a preocupação com os conceitos de lado e me propusesse a priorizar as provocações vinculadas a realidade deles não seria mais importante? Por outro lado eu me perguntava: mas será que os conceitos também não são importantes?

Com essas questões, eu cheguei a perceber que os conceitos, mesmo tentando ser mostrados com a realidade cotidiana do alunado, não eram lidos por eles pelo fato desses alunos também se encontrarem situados em uma realidade etária que os estimula a buscar novas descobertas. Geralmente nessa idade os alunos estão no início da desvinculação com a dependência dos seus tutores e estão experimentando o gosto por novas aventuras que não os leva a priorizar o tempo com a leitura.

As angustias se acentuavam quando eu comecei a vislumbrar os pontos positivos e negativos acerca da importância dos conceitos e das provocações. Com relação aos conceitos, eu via um ponto muito construtivo, afinal, acredito que apesar de tudo, a educação tem o papel fundamental de transmitir aos alunos os conhecimentos acumulados ao longo da história da humanidade e cabe ao educador mostrar ao aluno esse conhecimento em seu aspecto teórico, sistematizado, formalizado.

Por outro lado, eu via que os conceitos quando eram trazidos, muitas vezes não interessavam a esse perfil de estudante adolescente. Se eles já demonstravam pouca motivação em construir reflexões acerca dos conteúdos, se eles não realizavam as minhas expectativas no que diz respeito à constante atualização com a leitura para a sala de aula devido a sua formação; como adolescentes, eu percebi que eles estavam estimulados em desvendar outras realidades, outras descobertas.

Com relação às provocações, eu sentia que só insistir nelas não seria um bom caminho, afinal, mesmo sabendo que a educação para ser estimulante ao aluno deva se encontrar diretamente conciliada com a realidade dele, mas estimular unicamente a provocação significava apenas reproduzir os modelos corriqueiros que eles vivenciavam em suas experiências sociais. Eu tinha que trazer também a teorização do conteúdo para que eles compreendessem-no a partir de uma perspectiva sociológica.

Mas por outro lado, se eu deixasse um pouco a teorização em sala de aula e me enveredasse no caminho da provocação em sala de aula, eu também poderia promover uma aula mais dinâmica na qual os alunos poderiam reivindicar, problematizar e entrar em conflito com outros diversos discursos que terminam por ocorrer em meio a debates. Isso faria com que eu pudesse inclusive abrir um espaço para que eles colocassem essa instabilidade bastante típica para a idade deles.

Em meio a essas duvidas e a essas tentativas em conciliar uma aula interativa sem deixar de lado um espaço para a leitura, eu cheguei a uma espécie de terceira via que para mim seria o caminho mais promissor diante daquela realidade cotidiana nas aulas. Enfim, terminei por optar com a provocação no início da aula, para que depois de toda a discussão e “algazarra” estimulada por ela, eu entrasse com os conceitos e pudesse mostrar toda a relação daquele debate com os conceitos.

Para isso, eu fiz o seguinte: antes de passar um conteúdo, eu não pedia a nenhum aluno o cumprimento com a leitura do conteúdo. Eu lia o conteúdo que eu selecionava para ser discutido em sala de aula e dentro da minha leitura eu criava uma questão para ser respondida que eu achava que estaria diretamente associada aos seus interesses. Ia para a aula, anotava os tópicos do que eu tinha organizado para ser trazido enquanto conceito, mas primeiramente fomentava a discussão.

Com a problemática sendo exposta no início da aula, a aula começava com um clima de leveza e de muita instigação. Não havia aquela sensação de que os alunos estavam ali simplesmente para mais uma aula. Ao contrário, Os alunos passaram a fazer das aulas uma espécie de divã ao descarregarem suas angústias, suas opiniões, e eu, assim como um analista, passei a pegar os atos falhos, as contradições que eu encontrava nos discursos deles e jogar de volta fomentando novas reflexões.

Depois que o clima de leveza havia sido conquistado, eu passava a articular todas aquelas opiniões com os conceitos trazidos por mim para serem compreendidos na disciplina. Comecei a sentir que a situação começava a se tornar mais estimulante, mesmo sentindo ainda uma grande dificuldade dos alunos em compreenderem conceitualmente o conteúdo exposto. Foi devido à insistência dessa dificuldade que eu encontrei o caminho para que eles passassem a ler o conteúdo.

Além de ganharem notas pelas participações no debate, eu passei a propor atividades escritas. Essas atividades passaram a ter notas acumulativas que no final de cada unidade, seriam somadas junto com as do debate. As atividades passaram a ser propostas da seguinte forma: os alunos produziam um texto acerca da problemática trazida no início da aula, junto com as opiniões trazidas no debate e articulavam esse texto com o texto que eles teriam que ler acerca do conteúdo.

Com essa estratégia, terminei por conquistar um resultado esplêndido em sala de aula, uma vez que a aula, ao invés de se caracterizar por aquela condição entediante ao ser iniciada com a explanação dos conceitos, passou a ser estimulada com a liberdade de expressão do alunado acerca de uma temática articulada com o conteúdo que eu trazia para a sala. Esse contágio inicial da aula terminou deixando as questões conceituais com um caráter mais leve e menos sisudo para os alunos.

Mesmo estimulando uma onda de opiniões sobre questões diretamente voltadas para o cotidiano deles, eu não deixei de trazer também o que eu acho ser de profunda importância na educação que é a relação com os conceitos. Como eu disse, acredito que articular os conceitos teóricos da disciplina é de fundamental importância para que eles enxerguem a realidade de forma sistematizada, teorizada, além de compreenderem o enfoque da disciplina acerca desses conceitos.

Além dessa estratégia não pecar em buscar trazer apenas os conceitos ou apenas gerar o estímulo para as provocações em sala de aula, ela também abriu espaço para uma atualização dos alunos acerca da leitura. Como eu citei mais acima, as atividades propostas eram produzidas de forma a responder de forma escrita a questão provocada no início da aula, articulando o debate com um fichamento acerca do texto proposto para ser estudado na disciplina.

Essas articulações fizeram com que as atividades se tornassem críticas, pois o aluno se via na responsabilidade de praticar o exercício constante do que foi debatido em aula, preocupando-se em compreender o que se estava sendo discutido e promovendo a ele uma capacidade crítica de arquitetar as respostas da pergunta feita em sala, com os debates e com o texto. Isso permitiu com que o conhecimento não tivesse o ar de apenas responder para saber se aprendeu o conceito.

A partir do momento em que eu passei a enxergar como o conhecimento estava sendo produzido, percebi que a sociologia conseguia firmar uma relação entre a teoria com a experiência dos alunos. Ao darem suas opiniões, perceberem a articulação que eu fazia dos conceitos com o debate e depois fazerem o texto articulado com o texto proposto, os alunos passaram a reconhecer que a teoria sociológica estava diretamente vinculada às suas angústias e, portanto, às suas vidas.

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